A polêmica envolvendo um ofício da promotora de Justiça da comarca, Marcela Christine Ferreira de Melo, enviado no dia 2 passado à prefeitura de Igarapé-Açu – leia-se secretária de Assistência Social, Rosilda Menezes de Souza -, cobrando explicações sobre usos de símbolos ideológicos “marxistas e comunistas” em publicidade de evento institucional do município referente ao Dia Internacional da Mulher, gerou repercussão nas redes sociais, com criticas de apoiadores de partidos de esquerda à promotora.
Em nota enviada ao Ver-o-Fato, a promotora se defende, afirmando que o uso de suas atribuições “visaram atender indistintamente aos preceitos constitucionais, e ainda resguardar recursos necessários à saúde neste momento crítico, requisitando informações, foram mal interpretados por algumas pessoas, desagradando parcela da sociedade, aos quais o símbolo representa”.
Marcela Ferreira de Melo explica que evento “veiculava em seu material de propaganda, o símbolo do braço levantado e punho cerrado, vinculado ao município de Igarapé-Açu – ao lado do símbolo do município e com o nome da cidade bem acima do punho cerrado. Além disso abrangia a entrega de “brindes e sorteios” de diversos produtos tais como camisas, máscaras, álcool em gel, e até premiação em dinheiro corrente”.
Segundo a fiscal da lei, “neste aspecto, com tranquilidade de consciência e atuação, afirmo que o exercício da atribuição ministerial não é agradar a grupos ou parcelas da sociedade, descumprindo a lei, mas está previsto de forma expressa no art. 127, caput, da Constituição Federal que é nosso papel, enquanto Ministério Público, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, garantindo os direitos da Sociedade, como um todo”.
Ela diz ainda que em alguns estados, como São Paulo, os MPs também tomaram idênticos procedimentos envolvendo o mesmo símbolo, provocando manifestação de descontentamento dos apoiadores. Marcela argumenta que neste sentido, seguramente, ” a reação de tais defensores do questionado símbolo, seria diversa se ao invés deste slogan, a Prefeitura tivesse adotado como símbolo uma “arminha feita com as mãos”, ou quaisquer exemplos alusivos a partidos ou movimentos de oposição a eles. Não seria sem razão a sua indignação, pois do mesmo modo, tais símbolos são vedados a estarem vinculados à administração pública”.
Por fim, ela enfatiza: ” honrei, como de costume, a Sociedade de Igarapé-Açu, sem intenção alguma de ofender quem quer que fosse, e encerro esta resposta com uma pergunta, que infelizmente tem sido recorrente em nossos dias: “que tempos são esses em que temos que defender o óbvio? Vale a pena a reflexão”.
Veja a nota da promotora, na íntegra:
“Em face da repercussão do ofício da lavra da Promotoria de Justiça em que atuo, e da necessidade de prestar esclarecimento à população de Igarapé-Açu, a qual,
nestes quase 3 (três) anos me foi atribuído o dever de resguardar os direitos, informo que na data de ontem 02/03/2021, atendi a Secretária de Assistência Social de Igarapé-Açu, ROSILDA MENEZES DE SOUZA, e sua assessora, onde comunicaram a agenda da semana dos eventos em alusão ao Dia Internacional da Mulher.
O evento veiculava em seu material de propaganda, o símbolo do braço levantado e punho cerrado, vinculado ao município de Igarapé-Açu – ao lado do símbolo do
município e com o nome da cidade bem acima do punho cerrado. Além disso abrangia a entrega de “brindes e sorteios” de diversos produtos tais como camisas, máscaras, álcool em gel, e até premiação em dinheiro corrente.
Em razão disso, instauramos os procedimentos devidos (Notícia de Fato e Inquérito Civil) e requisitamos, mediante ofício, informações sobre a utilização do símbolo, que é vinculado a ideologia marxistas, comunistas, e a diversos movimentos sociais, para que a Prefeitura pudesse indicar e justificar a utilização do símbolo, e ainda remetesse cópia do procedimento administrativo relativo à aquisição dos produtos que seriam distribuídos no evento, questionando a necessidade de tais gastos, em um período crítico, de Pandemia, em que a necessidade seria evitar gastos despiciendos, que não fossem essenciais, concentrando-os na área da
saúde e em salvar a vida dos munícipes.
Entretanto, infelizmente, os fatos que ensejaram a atuação desta Promotora de Justiça, que no uso de suas atribuições visaram atender indistintamente aos preceitos constitucionais, e ainda resguardar recursos necessários à saúde neste momento crítico, requisitando informações, foram mal interpretados por algumas pessoas, desagradando parcela da sociedade, aos quais o símbolo representa.
Neste aspecto, com tranquilidade de consciência e atuação, afirmo que o exercício da atribuição ministerial não é agradar a grupos ou parcelas da sociedade, descumprindo a lei, mas está previsto de forma expressa no art. 127, caput, da Constituição Federal que é nosso papel, enquanto Ministério Público, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, garantindo os direitos da Sociedade, como um todo.
Neste sentido, seguramente, a reação de tais defensores do questionado símbolo, seria diversa se ao invés deste slogan, a Prefeitura tivesse adotado como símbolo
uma “arminha feita com as mãos”, ou quaisquer exemplos alusivos a partidos ou movimentos de oposição a eles. Não seria sem razão a sua indignação, pois do mesmo modo, tais símbolos são vedados a estarem vinculados à administração pública.
Neste raciocínio, o símbolo vinculado à Prefeitura de Igarapé-Açu por ocasião do ato em alusão ao Dia Internacional da Mulher, na compreensão desta Promotora de Justiça, viola princípios constitucionais da impessoalidade, da igualdade e da moralidade, sendo porém, possibilitado à Prefeitura, mediante o ofício, justificar seus motivos, inclusive podendo abranger outros aspectos não assimilados por nós.
Reafirmo, nesta ocasião, minha total admiração e reconhecimento aos movimentos sociais deste país, que em muito tem contribuído para o avanço na defesa dos
direitos humanos, dos cidadãos, e em especial, de nós mulheres, e sei o quanto nossa luta é constante. Do mesmo modo, a liberdade de consciência, e a pluralidade de posições ideológicas, reputo como fundamentais ao amadurecimento e desenvolvimento da Democracia. Não se trata de desmerecê-los ou não dar-lhes o devido valor.
Questiono dois pontos, quais sejam: a vinculação à propaganda institucional do Município de Igarapé-Açu a símbolos, ou slogans relacionados a movimentos, partidos, ideologias, quaisquer que sejam e como se deu a aquisição de vários itens, para serem distribuídos à população, como brindes, em momento de Pandemia.
Ressalta-se que tal discussão, não é única em nosso Estado, já que em alguns outros Estados do país, a exemplo, no Estado de São Paulo, onde já existem diversas ações contra a adoção, do mesmo símbolo da mão estendida, e punho cerrado, em vários semáforos pela cidade, sob a justa alegação de que também viola os princípios da Legalidade e da Impessoalidade.
Lá, como aqui, criou-se grande discussão acerca do assunto, e o debate sadio, construtivo, em torno de ideias, é sempre bem-vindo, entretanto reputo inadmissíveis, no Estado Democrático de Direito, que tanto afirmam defender, as agressões pessoais, argumentos parciais, e de autoridade, isto não contribui em nada para o debate jurídico-científico, e para a evolução do país.
Por fim, declaro que cumpri os princípios constitucionais conforme estão dispostos, primando pelo direito de todos, de toda a Sociedade, e não somente de classes,
partidos, ou movimentos, ainda que denotando sempre a alta admiração pelos mesmos, com a sonoridade que lhes é devida e dos quais espero, enquanto cidadã e mulher, o mesmo tratamento.
Honrei, como de costume, a Sociedade de Igarapé-Açu, sem intenção alguma de ofender quem quer que fosse, e encerro esta resposta com uma pergunta, que
infelizmente tem sido recorrente em nossos dias: “que tempos são esses em que temos que defender o óbvio?” Vale a pena a reflexão.
Marcela Christine Ferreira de Melo – Promotora de Justiça de Igarapé-Açu
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