O procurador da República no Pará, Alan Mansur, ingressou na última sexta-feira, 3, com aditamento – que significa acréscimo ou retificação de dispositivos legais, penais ou processuais – à ação penal que tramita na 4ª Vara Federal de Belém contra a Agropalma. O documento, cuja íntegra o Ver-o-Fato teve acesso (veja no final desta reportagem), traz um fato novo que agrava o envolvimento no caso dos réus, o ex-presidente da empresa, José Hilário Rodrigues de Freitas e o cartorário Francisco Valdete Rosa do Carmo.
Alan Mansur trata da quebra do sigilo bancário de Francisco Valdete que comprova que ele recebeu depósitos da Agropalma para restaurar matrículas fraudulentas de terras e dar aparente legalidade às propriedades supostamente alegadas pela empresa. A família Tabaranã, proprietária legítima, segundo documentos no Iterpa, da maior parte dos 106 mil hectares ocupados pela Agropalma, é assistente do MPF na acusação contra a empresa nessa ação penal na 4ª Vara.
“Nesse contexto, como decorrência do afastamento do sigilo, o relatório de análise 4/2024 identificou dois depósitos no valor de R$ 33 mil e R$ 10 mil na data de 25/11/2011 na conta de poupança de titularidade do réu Francisco Valdete Rosa do Carmo, em que foi solicitada ao Banpará por e-mail (anexo ao relatório), encaminhado em 23/10/2013, cópia do cheque, comprovante de depósitos e identificação do depositante”, narra o procurador do MPF.
Conforme resposta por e-mail encaminhada pela Instituição Financeira em 24/04/2024, o saque do cheque nº 000339, sacado da agência 3524 da conta bancária nº 13009234 do Banco Santander no valor de R$ 33 mil, emitido pela empresa Agropalma S/A, foi destinada à realização de depósito efetuado em conta poupança da agência 034 (Concórdia do Pará) do Banpará de titularidade do investigado Francisco Valdete.
“Identificou-se, ainda de acordo com a instituição financeira, que o valor total do depósito realizado em favor do investigado atingiu a quantia de R$ 43 mil, sendo R$ 10 mil em dinheiro, em que constou como depositante Odete do Socorro Lima do Carmo, esposa do cartorário. Cabe ressaltar que Odete do Socorro Lima do Carmo, além de ser cônjuge do investigado, consta também como procuradora na movimentação da conta de poupança, de acordo com Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS).
Por outro lado, após exame dos dados bancários, não foi identificada transação no valor de R$ 150 mil relativo ao cheque nº 000336, porém foi encontrada transferência interbancária no valor de R$ 120 mil em favor do investigado. Por fim, tais foram as conclusões da análise:”, explica Alan Mansur
O fiscal da lei acrescenta: “portanto, em vista dos achados após o levantamento do sigilo bancário, confirmaram-se os fatos descritos na denúncia acerca dos indícios extraídos do correio eletrônico enviado por Eder Jofre Costa Ferreira a Antonio Pereira da Silva sobre o pagamento indevido de verbas ao então cartorário Francisco Valdete pela empresa Agropalma”
E conclui: ” a despeito da diferença de valores entre o que aponta o correio eletrônico e os valores identificados com o afastamento do sigilo, tais discrepâncias não desnaturam ou alteram as condutas típicas atribuídas aos réus, antes, robustecem o arcabouço probatório suficiente para a condenação dos réus. Em suma, o presente aditamento tem caráter objetivo, pois sua finalidade é a inclusão de novos elementos probatórios aos autos.
Diante do exposto, o MPF requer o Aditamento à denúncia para que seja juntado aos autos a documentação em anexo consistente no Relatório de Análise 4/2024 e seus anexos, oportunidade que ratifica os termos da denúncia”.
Com a palavra, a Agropalma
O Ver-o-Fato procurou em São Paulo, sede do grupo do qual a Agropalma faz parte, ouvir a manifestação da empresa sobre o aditamento à denúncia no caso em que ela é ré. A assessoria de imprensa ficou de enviar os esclarecimentos, mas até o fechamento desta edição ainda não havia feito. O espaço continua aberto à manifestação.
VEJA AQUI A ÍNTEGRA DO ADITAMENTO DO MPF À AÇÃO PENAL
O comunicado da Agropalma
Em nota enviada no começo desta noite ao Ver-o-Fato, Agropalma se manifesta sobre o aditamento à denúncia na ação penal que tramita na 4ª Vara Federal de Belém. No comunicado, a empresa acusa o Ver-o-Fato de usar “tom sensacionalista” e de “grave erro de interpretação sobre uma movimentação do referido processo”.
E ainda que “diferentemente do que o veículo se propôs a comunicar de forma equivocada, a atualização processual não imputa nenhuma condenação à Agropalma. A companhia esclarece que os valores mencionados no processo se referem exclusivamente aos custos cartoriais”.
Veja a nota na íntegra da empresa, abaixo:
COMUNICADO AO VER O FATO
“A Agropalma repudia o tom sensacionalista da matéria publicada nesta segunda-feira, dia 6/5, pelo Ver-o-Fato e chama a atenção para o grave erro de interpretação sobre uma movimentação do referido processo. Diferentemente do que o veículo se propôs a comunicar de forma equivocada, a atualização processual não imputa nenhuma condenação à Agropalma. A companhia esclarece que os valores mencionados no processo se referem exclusivamente aos custos cartoriais.
Como já informado inúmeras vezes ao veículo, a Agropalma reforça que todas as suas terras foram adquiridas de boa-fé de seus legítimos proprietários e possuidores, inclusive com a comprovação da documentação pelos órgãos competentes no momento da aquisição. Toda investigação ou processo judicial envolvendo a matéria atestam a legitimidade da posse ou propriedade da Agropalma sobre as terras adquiridas, e jamais constataram qualquer participação da companhia em qualquer conduta criminosa.
Além disso, todas as compras de propriedades e taxas cartoriais foram realizadas via sistema bancário, o que reflete o cuidado da Agropalma em seguir o devido processo legal e, com isso, pautar suas tomadas de decisão com base na transparência, na ética e nas relações socioambientais. Agropalma”
Resposta do Ver-o-Fato
Em primeiro lugar, no contato com a Agropalma e pedido de manifestação da empresa, por meio da assessoria de imprensa dela, a Agropalma não respondeu à pergunta sobre a quebra do sigilo bancário e a identificação dos depósitos ao cartorário Valdete do Carmo. Preferiu enveredar pelo caminho tortuoso da mentira, tentando atribuir a suposto “erro de interpretação” o aditamento feito à denúncia pelo procurador da República, Alan Mansur.
Sobre isso, tanto a matéria quanto o título são de clareza solar e refletem, sem nenhuma ilação ou erro, o que diz o documento do MPF enviado ao juiz da 4ª Vara Federal.
Em segundo lugar, muito ao contrário do que diz a nota da Agropalma, o Ver-o-Fato não imputa nenhuma condenação à empresa. Nem o portal de notícias e menos ainda o procurador Alan Mansur. O fiscal da lei, como base nos valores identificados na quebra do sigilo bancário, afirma que os elementos ” robustecem o arcabouço probatório suficiente para a condenação dos réus (grifo nosso). Em suma, o presente aditamento tem caráter objetivo, pois sua finalidade é a inclusão de novos elementos probatórios aos autos”.
Caso antes tivesse submetido aos seus competentes e caríssimos advogados o texto em forma de nota enviado ao Ver-o-Fato, a empresa não teria cometido a tentativa de desinformar ou agredir a inteligência dos leitores com essa notória mentira .
De resto, sobre as outras alegações da empresa, o Ver-o-Fato não tem nada a comentar sobre a nota. Até porque as acusações de fraudes, corrupção e estelionato estão contidas na denúncia do MPF e quem vai dizer se a Agropalma é ou não culpada dos crimes a ela atribuídos não é este portal, que aliás não tem vocação para juiz, mas a própria Justiça Federal.