Audiência pública é sempre uma coisa complicada. Em muitos casos, todos são ouvidos, menos o próprio interessado: o público. Outro problema é o local onde a audiência é realizada. Se o assunto envolve o interesse de dezenas de milhares de pessoas, contra uma grande empresa ou grupo econômico que fere interesses de comunidades, todo cuidado é pouco. Pode ocorrer de um lado, geralmente o mais forte, levar pessoas a ele ligadas, ocupar a maior parte dos lugares na audiência e fazer valer seus interesses, prejudicando o outro lado.
Em Barcarena, ninguém ignora, as multinacionais mandam e desmandam. Poluem o ar, contaminam rios, igarapés, poços artesianos, sonegam até o fornecimento de água mineral, mesmo sob ordem da justiça, e não são punidas. Processos judiciais se arrastam e não aparecem condenações. Bons advogados usam sempre um arsenal de recursos para retardar decisões que eles sabem inevitáveis.
Vejam o que está acontecendo agora, há um mês de uma audiência pública coordenada pela força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) para o caso Hydro. Pois bem. O MPF, juntamente com a Promotoria de Justiça de Barcarena, promoverão no próximo dia 27 de novembro, a partir das 8h30, mais uma reunião aberta. De acordo com o próprio MPF, o evento será realizado para “prestação de contas às comunidades sobre a distribuição dos cupons-alimentação, auditorias e atualização de informações do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC) que a empresa Hydro Alunorte e o Estado do Pará assinaram com o MPF e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) em 2018”.
O local da audiência será a Igreja da Assembleia de Deus, localizada em frente à Praça de Alimentação, no bairro Vila dos Cabanos. Ocorre que a “capacidade máxima de público no espaço é de 1.000 pessoas. A Cainquiama, entidade que congrega 121 comunidades dos sete núcleos populacionais, mais ribeirinhos e habitantes de ilhas da região, somam mais de 16.000 pessoas e querem um local com espaço bem maior.
As comunidades alegam que a Hydro, em audiências anteriores, levou ônibus e mobilizou seus empregados para ocuparem a maioria dos assentos na Assembleia de Deus, deixando poucos lugares para o pessoal filiado à Cainquiama. Como a audiência e o local já foram definidos pelo MPF e MP, a Cainquiama está convocando seus filiados a não comparecer ao evento. Ela sugere um local onde caibam 10 mil pessoas. E ainda soltou uma “nota de repúdio” (veja, abaixo).
Segundo o MPF, a força-tarefa para o caso Hydro investiga denúncias feitas em fevereiro de 2018 por comunidades de Barcarena sobre lançamentos irregulares de água da chuva não tratada pela Hydro no rio Pará. “Além de investigar as denúncias, a força-tarefa vem atuando para que a empresa reduza impactos socioambientais e tome providências para prevenir a ocorrência de irregularidades”, sustenta o fiscal da lei.
Nota Pública da Cainquiama
” A Cainquiama, que representa 121 comunidades dos 7 núcleos populacionais e mais rios e ilhas de Barcarena, com mais de 16 mil associados, representando um universo de quase 60 mil pessoas, REPUDIA o método da parceria entre o MPF e a Norsk Hydro para realizar um simulacro de Audiência Pública para apenas 1 mil pessoas, em local exíguo, e que deve repetir o que ocorreu nas anteriores, quando a Norsk Hydro ocupou a maior parte dos ingressos com seus empregados e seus parentes, impedindo que os verdadeiros interessados e vitimas dos danos sejam ouvidos.
A Cainquiama CONVOCA o POVO a NÃO participar dessa Audiência até que seja apresentado local adequado e que comporte pelo menos 10 mil pessoas, sob pena de configurar simulação que visa legitimar o Acordo ESPÚRIO que o MPF estabeleceu com a Norsk Hydro em evidente e dramático prejuízo às populações tradicionais e as demais comunidades impactadas pelas atividades poluidoras da multinacional norueguesa. Barcarena, 25 de outubro de 2019. Colégio Diretor da Cainquiama”.
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