Uma decisão judicial proferida ontem, 10, pelo juiz Adelino Arrais Gomes da Silva, da Vara da Fazenda Pública de Ananindeua, sacudiu os planos de privatização da Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa). Conforme noticiado pelo jornal Valor Econômico e com detalhes da decisão obtidos na íntegra pelo portal Ver-o-Fato, o magistrado atendeu parcialmente a um pedido da prefeitura de Ananindeua, que questionava a legalidade do leilão marcado para hoje, 11, na sede da B3, em São Paulo.
Embora a licitação não tenha sido suspensa, o juiz determinou a exclusão imediata de Ananindeua do Bloco A, o principal lote da concorrência, exigindo a reestruturação do bloco regional e da modelagem da concessão.
“O perigo de dano (periculum in mora) é patente, considerando que a sessão pública de julgamento das propostas está prevista para o dia 11 de abril de 2025, o que poderá consolidar um contrato eivado de diversas nulidades, impondo obrigações contratuais de longa duração ao Município de Ananindeua e à sua população, com gravíssimo risco ao erário e ao acesso adequado aos serviços de saneamento”, diz o juiz na decisão.
Segundo ele, a concessão pretendida, se efetivada, “também poderá gerar tarifas elevadas e serviço deficitário, haja vista a desconsideração de dados populacionais atualizados e dos investimentos já realizados pelo Município (superiores a R$ 225 milhões)”.
Na ação movida pelo município, a prefeitura apontou supostas irregularidades no processo, como a formação territorial do Bloco A, que estaria em desacordo com a Constituição e a legislação vigente; a ausência de um instrumento de governança interfederativa, exigido por lei; a falta de autorização legislativa de Ananindeua; e o critério de julgamento do leilão, baseado na maior outorga fixa, em vez da menor tarifa para os consumidores.
O Ver-o-Fato entrou em contato com o governo do Estado e aguarda manifestação, sobre eventual recurso contra a decisão judicial.
O Bloco A, afetado diretamente pela exclusão de Ananindeua, engloba as cidades mais rentáveis do estado – Belém, Ananindeua e Marituba – e prevê uma outorga fixa mínima de R$ 1,042 bilhão, além de uma outorga variável ao longo do contrato. A licitação, que começou às 14h na B3, inclui ainda os Blocos B e D, totalizando 99 cidades e cerca de R$ 15,2 bilhões em investimentos, com o objetivo de universalizar os serviços de água e esgoto no Pará.
Segundo fontes, quatro grupos apresentaram propostas: Aegea, Azevedo e Travassos, Servpred e o Consórcio Eldorado Saneamento. Um quarto bloco, inicialmente planejado, foi descartado por falta de interessados e precisará ser reformulado.
População aguarda melhorias
A exclusão de Ananindeua do Bloco A, considerado o coração financeiro da licitação, levanta dúvidas sobre o futuro do projeto, estruturado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No modelo do Bloco A, a Cosanpa permaneceria responsável pela produção de água, enquanto o concessionário cuidaria da distribuição, em um arranjo semelhante ao adotado no Rio de Janeiro.
As metas também são mais ambiciosas: a universalização do abastecimento de água deve ocorrer até 2033 em todos os blocos, mas apenas no Bloco A o esgotamento sanitário também terá de ser universalizado até essa data. Nos Blocos B e D, o prazo para o esgoto se estende até 2039.
Enquanto isso, a população das cidades envolvidas segue à espera de melhorias nos serviços de saneamento, em um estado onde o acesso à água tratada e ao esgoto ainda é um desafio para milhões.
O desfecho do leilão, agora sob a sombra da intervenção da Justiça, será decisivo para o futuro da Cosanpa e da infraestrutura do Pará.