Sem políticas ambientais e reordenamento tributário, mineração no Pará caminha para o esgotamento
Um grito de alerta. Essa é a mensagem da professora Maria Amélia Enríquez, da Universidade Federal do Pará (UFPA), doutora em Desenvolvimento Sustentável, e do economista e mestrando Lucas Ferraz no livro “A Mineração – Dinâmicas Socioeconômicas no Pará e Alternativas para Contrapor à Maldição dos Recursos”. A obra foi lançada pelo Sindicato dos Servidores do Fisco Estadual do Pará (Sindifisco-PA), nesta sexta-feira (20), no seminário “Mineração no Pará: efeitos socioeconômicos e ambientais e alternativas à maldição dos recursos”, realizado no auditório do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, em Belém.
O livro desenha a estrutura que sustenta a mineração no Pará e adverte para um cenário de “maldição dos recursos” experimentada por outros países minerários. O modelo de exploração exaustiva das jazidas, com graves impactos socioambientais, desaceleração da industrialização, baixa geração de empregos, produção dirigida a commodities e enriquecimento de empreendimentos transnacionais, assinalam os autores, avança para um ponto de não retorno – o esgotamento das minas e o corte de investimentos – que acendem mazelas como a pobreza, a violência e a destruição ambiental.
Segundo os autores, dados sistematizados indicam que a isenção tributária que beneficia a exportação de commodities e a falta de um planejamento para a industrialização do setor mineral estão no centro do problema. Experiências fiscais de outros países minerários são alternativas analisadas no livro.
A professora Maria Amélia destacou que a incidência de pobreza, a falta de investimento em saneamento básico e os péssimos indicadores da educação demonstram que a mineração não exibe sua potência, com 87% do que o Pará exporta, na esfera socioeconômica. “Em termos de participação do PIB (Produto Interno Bruto), o Pará representava 1,8 e hoje representa 2,5. Não teve aumento expressivo de participação do PIB no desenvolvimento. Mas a gente observa indicadores negativos, como o aumento da violência; nos anos 2000 o Pará era o vigésimo no ranking e hoje é o sexto”, afirmou a professora.
Segundo Maria Amélia, o livro é um grito de alerta para a correção da rota. “Tem políticas para isso: políticas de compras regionais, de fundos regionais, de incorporação, de desenvolvimento regional. A gente mostra quais seriam as alternativas”, disse.
O economista e pesquisador Lucas Ferraz, coautor do livro, apontou saídas para a deformação do sistema: as “melhores práticas”, por meio de políticas públicas. “A criação de fundos de desenvolvimento. Ou seja, utilizar tributos e royalties gerados a partir da atividade mineral para a atenção às demandas sociais e promover a chamada equidade intergeracional, que é quando você utiliza recursos finitos, no caso os recursos minerais, para promover um desenvolvimento que vai beneficiar, sobretudo, as gerações futuras. Outra prática é o maior encadeamento das empresas minerais com os fornecedores locais, gerando mais renda, maiores possibilidades de emprego e arrecadação de tributo”, elencou.
Ao compararem a política tributária brasileira com a de outros países, os autores constataram que o Brasil tem uma das menores cargas tributárias incidentes sobre os bens minerais. “De uma forma genérica, não se observa na amostra de países possibilidade de deduções e isenção de imposto de renda tão ampla como ocorre no Brasil”, atestam os autores.
Para Maria Amélia, o setor mineral corre o risco de entrar em colapso. “O Estado está flertando com a maldição dos recursos. O que é isso? Em vez dessa dádiva que são os recursos minerais ser utilizada para a promoção do desenvolvimento, para a melhoria da qualidade de vida, para elevar o desenvolvimento a um patamar superior, a gente está patinando em indicadores ruins”, ressaltou.
Segundo a professora, a nova lógica passa pelo reordenamento da política tributária do setor mineral, com o fim da desoneração prevista desde a Lei Kandir “Entre as 27 unidades da federação, o Pará é um dos que menos tem a participação do imposto na contabilidade do PIB. Está na 26ª colocação. Só perde para o Amapá. Quanto ao emprego, renda e salários, o Pará também está nas últimas posições. Mas quando a gente vê os ganhos de capital, é o primeiro. O desenvolvimento passa por uma justa e equitativa distribuição de renda, sim”, concluiu.