A Amazônia abriga a maior biodiversidade do mundo, com uma riqueza inigualável de flora e fauna. No entanto, essa vasta diversidade tem sido alvo de uma ameaça crescente: a biopirataria. Esse fenômeno insidioso envolve a exploração ilegal e não autorizada dos recursos da região, representando um verdadeiro assalto ao banco genético amazônico por interesses estrangeiros.
A biopirataria na Amazônia assume várias formas, desde a coleta de plantas e animais até a extração de compostos químicos valiosos para a indústria farmacêutica e cosmética. Essa prática desenfreada representa não apenas uma violação dos direitos soberanos do Brasil sobre seus recursos naturais, mas também uma ameaça direta à sustentabilidade e ao equilíbrio ecológico da região.
O interesse internacional na biodiversidade amazônica é impulsionado pela busca incessante por novos compostos bioativos que podem ser utilizados no desenvolvimento de medicamentos, cosméticos e produtos químicos. A Amazônia é considerada um verdadeiro tesouro biológico, contendo espécies únicas e uma variedade de adaptações genéticas que podem ser cruciais para a sobrevivência humana diante de desafios como doenças emergentes e mudanças climáticas.
O problema central da biopirataria é a ausência de regulamentações eficazes para proteger os recursos genéticos amazônicos. Muitas vezes, comunidades indígenas, que são os guardiões tradicionais desse conhecimento ecológico, são marginalizadas e excluídas das discussões sobre a exploração de seus territórios. A falta de consentimento informado e de mecanismos legais robustos permite que empresas estrangeiras acessem livremente esses recursos, muitas vezes sem oferecer benefícios justos às comunidades locais.
O assalto ao banco genético amazônico não apenas impacta a soberania nacional e a biodiversidade, mas também perpetua um ciclo de desigualdade socioeconômica. As comunidades que historicamente viveram em harmonia com a natureza, dependendo de seus recursos para subsistência, enfrentam a exploração predatória de suas terras e apropriação indébita de seu conhecimento ancestral.
Segundo o professor Francisco Carrera, em sua Análise Jurídica da biopirataria na Amazônia, são esses os principais crimes que ocorrem na maior floresta tropical do planeta:
Ameaça a soberania Nacional
Art. 15. – Convenção da biodiversidade “I – em reconhecimento dos direitos soberanos dos Estados sobre seus recursos naturais, a autoridade para determinar o acesso a recursos genéticos pertence aos governos nacionais e está sujeita à legislação nacional.” Dispositivo regulamentado pelo Decreto Federal n. 4339/02 Garante a soberania do Brasil sobre o seu patrimônio genético
Ameaça a biodiversidade – tráfico de material genético
Tráfico de animais – utilização de comunidades locais – conhecimento ancestral Tráfico de besouros – utilização da carapaça para extração de queratina(cosméticos) Tráfico de anfíbios – utilização de alcalóides da epiderme dos sapos Tráfico de folhas – extração de princípios ativos Tráfico de sangue de indígenas – pesquisa científica
Tráfico para fins científicos (Biopirataria):
Modalidade especializada em extrair substâncias químicas para a pesquisa científica e para a produção de medicamentos. Ex: Sapos Amazônicos, Aranhas, Escorpiões, Serpentes Venenosas e Besouros.
Venda de sangue indígena
Biopiratas vendem sangue de índios brasileiros na internetPor US$ 85, empresa dos Estados Unidos oferece amostras de DNA de tribos de Rondônia Comissão do Senado está investigando a venda de DNA de índios brasileiros Brasília – Quadrilhas internacionais de biopiratas (traficantes de recursos genéticos) vêm usando a internet para vender na Europa e nos Estados Unidos produtos retirados ilegalmente da Amazônia.
Entre os itens comercializados estão essências de plantas medicinais, animais, insetos e até amostras sangue que as amostras continuam expostas à venda. As amostras de DNA de sangue são de indígenas das tribos Karitiana e Suruí, em Rondônia. Elas podem ser compradas pelo razoável preço de US$ 85, o equivalente a R$ 242, 25, no site da Coriel Cell Repositories, empresa norte-americana de Nova Jersey especializada em pesquisas de genoma humano. No site é possível ainda encontrar amostras sanguíneas de índios do Peru, Equador e México. Fonte: Jornal PAGINA 20 – Especial
Venda de sangue indígena 2
A transação é simples. Basta apenas que a pessoa acesse o endereço preencha um formulário e o envie, por fax ou por , para a sede do laboratório nos EUA. No pedido, a pessoa precisa especificar qual o DNA solicitado e enviar o comprovante de depósito. A Coriel Repositories disponibiliza amostras de sangue de crianças, adolescentes e adultos. O caso está sendo investigado pela CPI da Biopirataria, criada ano passado na Câmara dos Deputados para investigar o contrabando de animais, o roubo de madeira e de recursos genéticos da Amazônia. A comissão apura também se há casos da venda de sangue de índios de outros Estados da região, entre os quais o Acre.
Fortalecimento das leis nacionais
Para combater efetivamente a biopirataria, é fundamental fortalecer as leis nacionais e internacionais que regem o acesso aos recursos genéticos. Além disso, é crucial promover a inclusão ativa das comunidades locais nas decisões relacionadas à exploração de seus territórios. Iniciativas de educação ambiental e conscientização pública são essenciais para mobilizar o apoio necessário à proteção da Amazônia e de seus preciosos recursos genéticos.
Os impactos da biopirataria na Amazônia vão além das fronteiras nacionais, reverberando em todo o ecossistema global. A preservação da biodiversidade amazônica não é apenas uma responsabilidade do Brasil, mas uma obrigação compartilhada por toda a comunidade internacional. A luta contra a biopirataria é uma batalha pela preservação da vida na Terra, e somente com a colaboração global e um compromisso unificado poderemos assegurar que o assalto ao banco genético da Amazônia seja detido, protegendo assim esse patrimônio incomensurável para as futuras gerações.
Sapo da região vale lá fora centenas de milhares de dólares
Uma pesquisa da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) encontrou indícios de biopirataria de conhecimentos dos povos tradicionais da Amazônia sobre a secreção da rã Kambôr.
De nome científico Phyllomedusa bicolor, essa pequena rã é usada por cerca de 15 povos indígenas, que conhecem as propriedades analgésicas e antibióticas da secreção do animal.
Ao cruzar informações no sistema de patentes internacionais, a pesquisa encontrou indícios de que 11 patentes registradas em países desenvolvidos podem configurar apropriação de recursos genéticos a partir de saberes tradicionais de povos indígenas, como explicou o pesquisador e professor de direito da universidade, Marcos Feres:
“Não é qualquer patente que use a secreção. Porque você pode usar a secreção com algum incremento, uma lógica de industrialização, que não tem uma relação direta com o conhecimento tradicional. Mas quando a relação é muito próxima do conhecimento tradicional, aí é que a gente começa a detectar um problema no sistema de patentes. Não há certeza, mas são indicações, fortes indícios de que está havendo ali um processo de apropriação de um conhecimento tradicional associado a recursos genéticos da região amazônica”.
Patentes
A maior parte das patentes são registradas em países como Estados Unidos, Canadá, Japão, França e Rússia.
O artigo publicado na revista Direito GV argumenta que as brechas nas convenções internacionais sobre patentes e biodiversidade, um sistema burocrático mais eficiente e a concentração do poder econômico nos países do norte global, permitem a apropriação de conhecimentos dos países do Sul.
Para o pesquisador Marcos Feres, o registro de patentes a partir de conhecimentos desenvolvidos no país gera perdas econômicas e políticas para o Brasil, transferindo esses recursos para nações mais desenvolvidas.