Ao afirmar que a anulação dos processos derivados da Operação Lava Jato foi um ato “formal”, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, reacendeu o entendimento de que os erros processuais não apagam os fatos que foram demonstrados naquelas investigações. A fala contundente de Fux foi endossada por juristas e ex-ministros do Supremo ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Na sexta-feira, o presidente da Corte foi o palestrante de uma cerimônia em comemoração aos 75 anos do Tribunal de Contas do Pará. O ministro afirmou que “ninguém pode esquecer” que houve corrupção no Brasil e mencionou os R$ 51 milhões em espécie apreendidos em um apartamento ligado ao ex-ministro Geddel Vieira Lima em 2017.
Também fez referência aos recursos desviados da Petrobras e ao escândalo do mensalão. “Ninguém pode esquecer que ocorreu no Brasil, no mensalão, na Lava Jato, muito embora tenha havido uma anulação formal, mas aqueles 50 milhões eram verdadeiros, não eram notas americanas falsificadas. O gerente que trabalhava na Petrobras devolveu US$ 98 milhões e confessou efetivamente que tinha assim agido.”
Para o ex-ministro da Justiça, Miguel Reale Jr., “sem dúvida, houve corrupção”. Segundo ele, essa constatação se dá pelas “delações acompanhadas de farta documentação contábil, com transferência de fortunas para offshores, sobrepreço na compra de sondas ou serviços por exemplo, os acordos cartelizados, a devolução de milhões seja em acordos de leniência no Brasil e em especial nos Estados Unidos”.
“Ainda por cima há muitos condenados que já cumpriram pena e estão a cumprir. Os erros da Lava Jato não tornam inexistentes os fatos e inocentes diretores da Petrobras, empresários como Marcelo Odebrecht e políticos beneficiários”, disse Reale Jr.
O ex-ministro do Supremo Carlos Velloso afirmou que Fux “simplesmente reconheceu uma evidência”.
“Vejo com bons olhos o pensar do presidente ministro Fux. Tanto avanço: mensalão e Lava Jato. O retrocesso entristece, considerada a corrupção. Paciência! Estamos irmanados na busca de dias melhores para esta sofrida República. As desigualdades sociais nos envergonham”, disse Marco Aurélio Mello, que se aposentou da Corte no ano passado.
Embora Fux não tenha citado em seu discurso, entre as decisões anuladas da Lava Jato estão as condenações impostas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato do PT na eleição presidencial. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
A palestra no TCE do Pará
Em sua exposição, o ministro presidente do STF enfatizou o papel dos tribunais de contas como essenciais ao Estado de Direito. Em um país onde não existam os tribunais de contas, criam-se todas as condições para uma “tempestade perfeita” entre os gastos públicos e a ausência de controle e de transparência. Tal “tempestade perfeita” tem o nome de corrupção, que representa a maximização da renda privada às custas do bem público. Os tribunais de contas tem como atribuição viabilizar a efetivação da percepção da accountability, ou seja, da prestação de contas pelos gestores.
“Todos os poderes devem contas à sociedade. Em diversas ocasiões falta uma percepção importantíssima: cada ato de corrupção é um colégio sem merenda para as crianças; é um hospital sem leitos; um local sem saneamento básico e, em um local sem saneamento, não há saúde. Os tribunais de contas são instituições intimamente ligadas à transparência da gestão pública”, explicou.
Segundo Fux, os tribunais de contas não se limitam apenas à verificação de orçamentos e contratos. Houve uma evolução da atuação dos órgãos de controle externo de forma que passaram a averiguar, de modo mais amplo, a destinação e a aplicação correta dos recursos públicos. Isso ocorre por meio do empoderamento dos tribunais, justificado pela teoria dos poderes implícitos.
“Os tribunais de contas podem muito e devem fazer muito. Eles são os guardiões do dinheiro público”, defendeu o ministro do STF. Os TCs também influenciam a exacerbação da cidadania com o exercício do controle social da população sobre os gastos públicos. Cabe aos tribunais de contas agirem também em busca da eficiência, prezando pela celeridade no julgamento de seus processos”.
O presidente do STF falou ainda sobre iniciativas importantes implementadas pelos órgãos de controle, como por exemplo o programa Destrava, que tem por objetivo contribuir para a retomada de obras públicas paralisadas pelo país, por meio da atuação integrada entre tribunais de contas, Controladoria Geral da União e o Poder Judiciário. Outra importante iniciativa apresentada por Luiz Fux foi o projeto Justiça 4.0, o qual reúne a Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o Ministério das Relações Exteriores (MRE), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com foco na inovação e modernização da Justiça no Brasil.
Após a palestra, a Conselheira Presidente do TCE-PA, Lourdes Lima, presenteou o convidado de honra do Fórum com um exemplar do livro a respeito dos 75 anos do TCE-PA. Na sequência, ocorreu cerimônia de outorga da Medalha Serzedello Corrêa ao presidente do STF. A mais alta honraria do TCE-PA, instituída pela Resolução nº 3.799, de 9/10/1970, é conferida a pessoas de comprovada idoneidade moral e reconhecido merecimento, aferido pela prática de atos ou serviços relevantes em favor deste Tribunal de Contas ou do estado do Pará.
Entre outros presentes que ouviram a palestra de Fux estava o governador do estado, Helder Barbalho.