Com aceno de venda da empresa ao mercado e compradores endinheirados de olho na oferta, a Agropalma recebeu uma notícia extremamente desagradável, na semana passada. A empresa foi comunicada de que a certificação de suas plantações de dendê no Pará está suspensa por violações de critérios da Roundtable do Óleo de Palma Sustentável (RSPO).
O Ver-o-Fato levantou as razões que motivaram a suspensão da certificação pela RSPO, informada à direção da Agropalma pelo IBD Certificações, maior certificadora de produtos orgânicos e sustentáveis da América Latina e única empresa 100% brasileira de certificação de produtos orgânicos e biodinâmicos e de certificação de produtos de agricultura sustentável e socioambiental com reconhecimento internacional.
Ao procurar a Agropalma para que ela se manifestasse sobre a drástica medida e as razões para que isso ocorresse, a empresa que é a maior exportadora de óleo de palma do continente, preferiu não comentar os detalhes da suspensão ( leia nota enviada ao Ver-o-Fato no final da matéria ). Ela afirmou que a avaliação para suspensão da certificação “foi inadequada, pois não reflete a realidade e as regras da RSPO”. Disse ainda que, por este motivo, “recorreu da suspensão”. Segundo a empresa, as indústrias de Belém e Limeira (SP) continuam operando com suas certificações da RSPO e não foram atingidas pela suspensão.
Fraudes e pressões
É sabido que desde 2011, quando a RSPO emitiu pela primeira vez a certificação internacional à Agropalma, havia pressão para que o selo de credibilidade fosse cancelado. A IBD Certificações, que representa a RSPO no país, foi avisada diversas vezes de que inúmeros problemas dificultavam a continuidade dessa certificação.
A principal delas: a Agropalma não é proprietária dos 106 mil hectares de terras no Pará, sendo que 20 por cento desse total são constituídos por terras públicas, enquanto o restante – cerca de 70 por cento – pertence à família Tabaranã, que mantém na Justiça várias demandas contra a empresa paulista, tendo alcançado expressivas vitórias.
O IBD, na verdade, tomou conhecimento de várias fraudes perpetradas por diretores da Agropalma em 02 de julho de 2015 e já denunciadas à justiça pelo Ministério Público do Pará, mas só agora, quase oito anos depois, resolveu agir, suspendendo a certificação da empresa.
Esperava-se do IBD a celeridade e eficiência em seguir os critérios da RSPO. Contudo, o que se viu nesse caso foi uma letargia. O IBD sustentou ativa a certificação da Agropalma num período em que a empresa sofreu operação da PF, investigação de fraudes em documentos públicos, teve diversas matrículas de terras canceladas, conflitos com comunidades quilombolas, além de causar danos ambientais com derramamento de produtos em rios, dentre tantas outras mazelas.
O IBD soube das fraudes, respondeu ações civis públicas na Vara Agrária de Castanhal, vendo de perto todo o estratagema clandestino que por décadas sustentou a posse da Agropalma sobre as terras apontadas pelo MP como originárias de grilagem. Mesmo assim manteve a certificação ativa.
A casa caiu
É muita coincidência que a certificação da RSPO para a Agropalma tenha iniciado em 2011, exatamente o período das fraudes desvendadas em investigações pela Polícia Federal. Causava estranheza a RSPO continuar certificando a Agropalma na frágil justificativa de: que “estamos nos regularizando”.
Diante dessa pueril justificativa, surge a pergunta: a RSPO certifica o que é irregular para que depois o membro certificado inicie o procedimento de regularização? Fica evidente que a casa dessa desculpa caiu.
Outro ponto questionável: manter a certificação das refinarias em Belém e Limeira é correto, já que os frutos são oriundos de áreas griladas e de comunidades tradicionais?
Caminhos fechados
Os fatos gritam mais alto e as irregularidades, há pelo menos 11 anos escancaradas, somente agora provocam a suspensão da certificação. Os caminhos da Agropalma foram fechados há tempos e hoje ela é uma empresa estrangulada pelas próprias fraudes em que se meteu.
No Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), as certificações das fazendas que a empresa dizia a ela pertencer foram todas canceladas por “uso de documentos falsos” Pelo mesmo motivo, na Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), também foi cancelado o Cadastro Ambiental Rural (CAR). Isto sem falar que 57 mil hectares tiveram suas matrículas em cartórios canceladas pela Justiça por fraudes denunciadas em ações civis públicas do MP paraense.
Para completar esse rosário de maracutaias, o ex-presidente da Agropalma, José Hilário de Freitas, responde a uma ação penal na Justiça Federal de Belém, de iniciativa do Ministério Público Federal (MPF) por uso de documentos falsos da empresa no Incra e na Receita Federal. Já o MP estadual, acusa a empresa de ter montado 16 processos administrativos fraudulentos dentro do tristemente famoso Instituto de Terras do Pará (Iterpa).
Essa jogada, autêntico gol contra, teria o objetivo de ocultar decisão de 2011 da desembargadora Luzia Nadja Nascimento, que anulou o grotesco inventário de Jairo Mendes Sales – decisão sobre a qual não cabe mais qualquer recurso – e tornou a Agropalma desprovida de qualquer palmo de terra onde mantém suas plantações de dendê, das quais é extraído o óleo de palma.
NOTA DA AGROPALMA AO VER-O-FATO
Comunicado à imprensa
“A Agropalma recebeu, na última semana, um comunicado da certificadora IBD informando que a certificação RSPO de suas plantações havia sido temporariamente suspensa.
A companhia analisou o relatório da certificadora e discorda dos apontamentos por entender que a avaliação foi inadequada, pois não reflete a realidade e as regras da RSPO e, por este motivo, recorreu da suspensão.
Ressaltamos que os certificados RSPO das refinarias da Agropalma, em Belém/PA e Limeira/SP, seguem vigentes e não haverá impacto na entrega de pedidos.
Desde a nossa primeira certificação em 2011 sempre demonstramos total comprometimento e evidências sólidas quanto ao atendimento dos Princípios e Critérios da RSPO. Atuamos sob regras rígidas e somos reconhecidos mundialmente por nossas práticas sustentáveis e transparência em nossos processos.
A Agropalma reforça seu compromisso com a sustentabilidade e a excelência no atendimento a seus clientes e demais partes interessadas”.