Poeta é o ser capaz de descobrir novos sentidos para palavras gastas por uso excessivo.Opõe-se a quem lhes dissipa o valor, empregando-as descuidadamente.
Uma palavra, em especial, requer-lhe uso zeloso. A que designa a área das suas criações, pelas quais se consome e consome seus dias. A palavra Poesia.
Vinicius de Moraes uma única vez a empregou para designar alguém. E esta ocasião ficou registrada numa crônica de Fernando Sabino, “O gerador de Poesia”, dedicada ao paraense Jayme Ovalle.
O escritor mineiro se preparava para escrevê-la. E, quis saber do poeta como ele definia Ovalle.Vinicius, então, fez estas declarações atordoantes, para quem nunca ouviu falar daquele filho de Belém:
– É o poeta em estado virgem. A mais bela crisálida de Poesia que jamais existiu, desde William Blake. É o mistério poético em toda a sua inocência, em toda a sua beleza natural. É voo, é transcendência absoluta. É amor em estado de graça.
Na crônica, o próprio Sabino admitiu que, antes de conhecer Ovalle, sabia da fama dele, mas duvidava da consistência dela.Contou:
– Ovalle era ainda um mito, de contornos imprecisos, cuja existência eu atribuía em parte à imaginação criadora de seus amigos. Até que vim conhecê-lo pessoalmente. E foi um impacto para a minha vida. Nosso convívio diário, durante quase três anos, era um deslumbramento permanente para a minha sensibilidade.
Também Carlos Drummond, Murilo Mendes, Augusto Frederico Schmidt, Olegário Mariano, Murilo Mendes e Otto Lara Resende, entre outros, se encantaram com Ovalle.
Que, sem nenhuma obra publicada – diz seu biógrafo, Humberto Werneck, em “O Santo Sujo” -, espantosamente deixou marcas fundas e reconhecíveis nas Artes de seu tempo.
– Não só pelos achados poéticos e espirituosos que cravejavam sua conversação, como por simplesmente existir, extraordinário personagem que era.
Um personagem capaz de espalhar em seu redor influência muito estimulante, com uma criatividade inocente, anárquica e dispersiva.
Mais íntimo do paraense, ainda, foi Manuel Bandeira. Ele chegou a escrever o “Poema só para Jayme Ovalle”. E produziu um texto como letra para a música “Azulão”, que Ovalle compôs, sem ter tido nenhuma formação musical formal.E que Bidu Sayão, a maior cantora lírica brasileira, introduziu no repertório das grandes divas mundiais da Ópera.
A incursão de Ovalle pela Música deslumbrou Mário de Andrade, musicólogo, além de literato. Que também se apegou ao paraense. A ponto de, mais tarde, escrever numa carta a Bandeira:
– Quem é mesmo uma maravilha é Ovalle. Que sujeito bom e, sobretudo que sujeito extraordinário. Fiquei adorandoele, palavra. Se eu pudesse escolher um tipo pra eu ser eu queria o Ovalle.
Mário estava apto a avaliar o valor do paraense, compositor intuitivo. Em outra carta a Bandeira, ele garantiu:
– Heitor Villa Lobo se deixou influenciar musicalmente por Ovalle.A influência – acrescentou – foi profunda e já fez muito bem ao Villa.