O juiz Celso Quim Filho, da 106ª Zona Eleitoral de Parauapebas, determinou nesta quarta-feira (9) a cassação do prefeito de Parauapebas, Darci Lermen (MDB), e do vice-prefeito, João Trindade, o João do Verdurão, por abuso de poder econômico durante a campanha eleitoral de 2020. Ele também tornou os dois inelegíveis por oito anos.
Segundo o juiz, os fatos que deram causa à representação pela cassação do mandato do prefeito e do vice dizem respeito à arrecadação de recursos de fontes lícitas, pois são provenientes de pessoas físicas. Porém, “foram obtidas de modo ilícito, o chamado “caixa dois”, que consiste em uma arrecadação de recursos paralela”.
O magistrado observa que embora as doações de montante expressivo tenham sido realizadas após as eleições de 2020, mas em período anterior à prestação de contas eleitorais dos candidatos, o que é permitido pela legislação eleitoral para o pagamento das despesas realizadas durante a campanha eleitoral, “as citadas doações foram realizadas por pessoas que não possuem capacidade econômica suficiente para tal”.
O PRTB, partido político de Parauapebas, apontou estas irregularidades das doações e, após a instrução processual, o Ministério Público Eleitoral manifestou o convencimento no sentido de que as alegações do representante estão acobertadas de razão, de vez que teria sido provado nos autos que as doações mais volumosas advieram do “caixa dois” da campanha dos representados.
Isto é, seriam recursos de real origem não declarada e com pretensos doadores figurando apenas como “laranjas” nas transações financeiras. Analisando os autos, o juiz observa que, segundo a Declaração de Imposto de Renda dos doadores, juntadas pelo advogado dos representados nos autos da mencionada PCE, os principais doadores da campanha do prefeito e do vice “possuem rendimento anual bem inferior aos valores doados. Isto aponta para indícios de que os recursos financeiros doados não pertenciam realmente àqueles que se apresentam como doadores”.
Ele destaca um trecho do Parecer Técnico Conclusivo do Cartório Eleitoral nos autos da prestação de contas eleitorais dos representados. “Chamou a atenção desse analista que algumas pessoas doaram quantias muito vultosas, valores de mais de R$ 100 mil por doador, entretanto sem ter condições de doar, considerando os comprovantes de capacidade financeira apresentados”.
Derrubados pelo imposto de renda
Exemplo foi a doação de Domingos Munia Neto, com a quantia de R$ 301.126,00, mas a declaração anual de Imposto de renda dele em 2019, exercício 2020, mostra que auferiu apenas R$ 31.170,07. Ou seja, o valor doado corresponde a 10 vezes a renda auferida pelo doador. Outro caso foi a doação de R$ 500 mil por Marcelo Nascimento Beliche, que para o juiz segue a mesma “linha de absurdo”, pois ele auferiu apenas R$ 42 mil em 2019. Um valor que corresponde a 12 vezes o que o doador dos R$ 500 mil recebeu naquele ano.
Para completar, outra aberração que chamou a atenção do analista foram 3 doações de R$ 100 mil cada feitas por Ocidenes Soares Leal, totalizando R$ 300 mil. Na declaração de renda de 2019, Ocidenes recebeu o valor de R$ 28.425,23. Mais de dez vezes menos do valor que ele doou às campanhas de Darci e João Verdurão.
“Diante da incongruência entre a renda declarada junto ao órgão fazendário e os valores doados para a campanha eleitoral, entende-se que a real origem dos recursos foi propositalmente omitida tendo em vista a camuflar uma provável fonte de recurso vedada pela lei”, afirma o juiz. Celso Quim Filho cita ainda a confissão feita perante ele por Marcelo Nascimento Beliche, “que declarou ter recebido em espécie o valor de R$ 554.779,00 que ele mesmo afirma ter depositado em sua conta pessoal e depois transferido a quantia de R$ 500.000,00 para a conta de campanha dos representados”.
Para deixar ainda mais evidente o ilícito eleitoral, também consta nos autos um ajuste na Declaração de Imposto de Renda de Marcelo Nascimento Beliche em data próxima à das doações, com o fim de incluir como seu rendimento valores coincidentemente semelhantes aos que autorizariam a doação efetuada e provenientes da venda de gado do qual a própria testemunha afirma, em audiência de instrução, “nunca ter sido dono”.
“Diante do exposto, julgo procedente esta representação por captação ilícita de recursos para fins eleitorais, com base no artigo 30-A, da Lei 9.504/97,para determinar a cassação do diploma dos representados Darci Jose Lermen e João José Trindade e para decretar a inelegibilidade dos mesmos, com base no artigo 1º, I, j, da LC 64/90, pelo prazo de oito anos, a contar da eleição”, decidiu o magistrado.
Entenda o caso
O prefeito Darci Lermen e o vice foram denunciados pela promotora de Justiça Eleitoral, Crystina Michiko Morikawa, pela prática de caixa dois, durante a disputa eleitoral de 2020. Na denúncia, a promotora requereu que os diplomas dos dois sejam cassados, alegando que há provas irrefutáveis no processo.
Segundo a denúncia inicial, feita pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) de Parauapebas, o apoiador da campanha dos dois, Marcelo Nascimento Beliche, confessou ter sido convencido a participar de uma fraude eleitoral, em que ele contribuiria com R$ 500 mil para a campanha. Ocorre que, de acordo com as denúncias, o dinheiro da “contribuição” foi repassado a Marcelo Beliche por pessoas ligadas ao atual prefeito.
Na transação, o “doador” também sairia contemplado com uma quantia em dinheiro. Na denúncia, Crystina Michiko Morikawa aponta a existência de doações acima do limite fixado em lei, como a de Marcelo Beliche, que em 2019 declarou à Receita Federal uma renda de R$ 42 mil. No caso, além de ilegal, seria impossível ele ter capacidade financeira para doar R$ 500 mil.
Para a promotora, “estão largamente demonstradas as irregularidades na captação dos recursos e na comprovação das despesas, o que compromete a prestação de contas e aponta a existência e prática de caixa dois.” Outro fato que pesou contra o prefeito e o vice de Parauapebas foi que as contas de campanha deles foram desaprovadas pela Justiça Eleitoral e a chapa não apresentou documentos que pudessem comprovar a regularidade das doações e despesas.
Conforme o processo, a chapa declarou ter arrecadado mais de R$ 1,7 milhão, sendo que R$ 1,6 milhão foi doado por terceiros, com a maior parte arrecadada após a realização das eleições.