Maior produtor e exportador de minérios do Brasil, especialmente o minério de ferro, o Pará e os paraenses têm sido pouco beneficiados por esse imenso potencial, prova disso é que o Estado ainda exibe alguns dos piores índices de desenvolvimento humano do país. Para mensurar a distância entre a riqueza tirada do solo e os resultados concretos para a melhoria de vida da população, o Sindicato dos Servidores do Fisco Estadual do Pará (Sindifisco/PA) deu início ao que promete ser o mais completo estudo sobre o setor no Estado.
O trabalho, coordenado pela economista e pesquisadora da Universidade Federal do Pará, Maria Amélia Enriquez, deve ser concluído ainda neste semestre. Os primeiros dados divulgados na semana passada, contudo, já apontam para as causas de injustiças históricas. O Ver-o-Fato conversou com o presidente do Sindicato, Charles Alcântara, sobre os primeiros resultados. Confira:
Que tipo de questões o Sindicado pretende responder com esse estudo?
Queremos quantificar o já reconhecido potencial do Estado do Pará em termos de riquezas minerais e analisar, cientificamente, os resultados do setor para o desenvolvimento socioeconômico do Pará. A gente sempre tem a impressão de que há descompasso entre nossas riquezas e a qualidade de vida da população, mas achamos importante ter uma radiografia desse descompasso para saber o real tamanho do problema.
Quais as conclusões que já podemos ter na atual fase do estudo?
A sociedade desconhece os enormes volumes de minérios que já foram, e que serão extraídos do território paraense, nos próximos anos. Em termos de comparação, o minério de ferro já retirado do nosso solo equivale a dez morros do Pão de Açúcar. A sociedade desconhece qual o valor disso. Não se discute com profundidade as consequências de extrair esse volume de um recurso que não é renovável. Não teremos isso para sempre, então é preciso ter uma política para construir uma economia em bases sustentáveis.
Como esses resultados podem ajudar os governos no desafio de equacionar a velha questão de sermos um “Estado rico com povo pobre”?
Esses dados devem servir de base para um amplo debate sobre a política mineral no Estado. Precisamos desenvolver um modelo consequente, que permita que essa exploração, já está fixada em nosso território, possa, resultar em benefícios para além do município diretamente afetado e alcance toda uma região por meio de conexões produtivas integradas, sustentabilidade ambiental e proteção aos diretos humanos. Nossa intenção é ajudar a promover um amplo e qualificado debate sobre o futuro do desenvolvimento do Estado do Pará, considerado que o link tributário é a principal ferramenta para financiar o desenvolvimento do Estado; e o Pará está impedido de fazer isso por força da desoneração tributária dos produtos – inclusive primários – exportados para o exterior, partir da Lei Kandir (1996), que foi constitucionalizada em 2003 (Emenda 42/2003). Uma eventual revogação da Taxa Mineral, pelo Supremo Tribunal Federa tornará a situação ainda mais crítica. É indispensável, portanto, repensar seriamente o futuro do desenvolvimento do estado a partir de sua base mineral.
O Sindifisco defende a volta da tributação do setor mineral?
Claro. Defendemos porque é totalmente injusto que o cidadão comum arrecade, em média, 20% de ICMS em sua conta de luz, de combustível, de alimentos etc e o segmento mais forte apenas capitalize os lucros, deixando um legado de impactos sociais e ambientais que se agravarão ao longo do tempo, principalmente, se certas condições necessárias de infraestrutura física e social não forem atendidas. E o atendimento dessas condições é de responsabilidade do Estado. E como ele faz isso sem recursos financeiros adequados?
A desoneração sobre a exportação dos produtos primários é apontada como uma forma de tornar o Brasil mais competitivo no mercado externo. A volta da tributação não compromete nossa balança comercial?
Quando pesquisamos a rota do desenvolvimento das nações que têm ou que tiveram a mineração por base, como atualmente a Austrália ou a Indonésia e, nos anos 1970, o Canadá, e até mesmo os EUA, constatamos que a mineração, por meio da política tributária, teve papel crucial para financiar o atual nível de bem-estar desses países. Veja modernamente o caso de Dubai, que desonera todas as atividades que agregam valor em seu território, mas que mantém a tributação sobre o petróleo e o setor financeiro, considerados setores-âncora para o financiamento do desenvolvimento local. Se o Estado não contar com as ferramentas tributárias proporcionadas pelo segmento mais forte de sua economia, vai contar o com o quê para superar sua condição de pobreza? Há que se diferenciar também os lucros em níveis economicamente justificáveis e eticamente aceitáveis dos superlucros que as grandes empresas de mineração exportadoras vêm acumulando nos últimos anos. A Austrália, por exemplo, taxa os superlucros. Aqui não temos nenhuma salvaguarda para que a sociedade, que é detentora do patrimônio mineral, se beneficie desses superlucros.
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