Por Danilo Casaletti
Figuras fundamentais na carreira dos cantores, os produtores musicais, ao longo da história, inevitavelmente, ganharam também os holofotes. Aqui no Brasil, para a bossa nova, Aloysio Oliveira foi nome de destaque. No fim dos anos 1960, Manoel Barenbein convenceu o tímido Chico Buarque a gravar um disco e se tornou figura chave do Tropicalismo. Roberto Menescal esteve à frente de discos de Elis Regina, Nara Leão e Maria Bethânia.
Essa lista é longa. Marco Mazzola assinou produções de Raul Seixas, Ney Matogrosso, Belchior e Simone. Nos anos 1980, Lincoln Olivetti deu o acento pop à música popular brasileira. Isso só para citar alguns. Todos somaram milhões de cópias vendidas e festejadas com os lendários discos de ouro, de platina e de diamante.
Na era das plataformas digitais, a medida são os players que cada música pode obter, a capacidade de viabilizar feats (parcerias e participações em uma gravação) – e quanto um produtor pode engajar o público nas redes sociais, além da qualidade do trabalho. E um dos que brilham nessa nem tão nova ordem musical é o carioca Tiago Alves, de 36 anos, que atende pela alcunha de Papatinho, ou simplesmente Papato. Foi ele que formatou, por exemplo, a carreira do rapper L7nnon (fala-se Lennon), um dos nomes que disputam os primeiros lugares nas listas de artistas mais ouvidos na atualidade.
PAPASESSIONS
Papato também é responsável pela faixa França, que junta L7nnon, Xamã, Juliette e Welisson, recém-lançada dentro do projeto Papasessions. A gravação já soma 2,5 milhões de visualizações no YouTube.
No passado, ele reuniu Anitta, Snoop Dogg e Ludmilla para a gravação da música Onda Diferente. Descobriu Orochi em uma batalha de rimas na rua. Neste ano, produziu o pedreiro paulista Aleck Johnson, que viralizou com um vídeo no qual fazia rap em meio a uma obra.
Papatinho, que recentemente recebeu o Prêmio Multishow de Produtor do Ano, começou no rap. Depois, abriu espaço para o trap, um subgênero do rap, no Brasil. Faz questão sempre de olhar para novas tecnologias a fim de criar suas músicas.
“Não quero ficar datado a um momento, a um gênero”, afirma. Já foi procurado por Matheus Fernandes e botou bateria de trap no piseiro do cantor cearense. Fez o remix da música É o Amor, de Zezé di Camargo, no qual tocou sua MPC, equipamento eletrônico para criar as batidas.
Na enciclopédia (digital) da música brasileira, Papatinho sabe bem qual deve ser seu verbete. “Sou produtor de música urbana. Dentro disso, tem rap, trap, drill, pop, funk, R&B…”, diz ele.
“Faço sempre do meu jeito, com a minha assinatura. Consegui conquistar a minha identidade, assim como o Pharrell Williams e Dr. Dre (produtores americanos). Mesmo com minha transição do rap para o pop, consegui manter a originalidade”, argumenta.
Em seu perfil no Instagram, ele avisa que suas produções já somam mais de 3 bilhões de streamings. E segue contando. Reconhece que os números têm importância. Entretanto, com a sinceridade que permeou o papo de cerca de uma hora com a reportagem, diz que os indicadores não são o que o move.
“Sempre fiz música porque eu gosto. Atualmente, estou no estúdio com um moleque (Dx) que se aproximou de mim em um hotel e foi demitido pela gerência. Vamos fazer uma música juntos. Amanhã, posso estar com a Anitta. Serei sempre o Papatinho”, diz. Prova disso é seu mais recente single, Progresso Pros Nossos. Nele, juntou Cidinho & Doca, pioneiros do funk carioca, MC Hariel, da nova cena do funk de São Paulo, e o pupilo L7nnon. Juntou o funk com o drill, a batida londrina do momento. O clipe foi gravado na Cidade de Deus, no Rio. Uma realização pessoal, segundo ele.
CARREIRA
Papatinho já soma 16 anos de carreira. Começou menino, cortando e juntando intuitivamente pedaços de músicas em MP3. Desfazia e montava de outra maneira. Virou um beatmaker, aquele que constrói as batidas. Totalmente autodidata.
O primeiro trabalho profissional foi com o grupo de rap ConeCrewDiretoria. As letras “proibidonas” não eram muito sua cara, confessa. Preferiu as batidas. “Sou bem careta”, diz ele. O apelido Papatinho vem de “só no sapatinho” e tem a ver com seu jeito leve de ser.
O dinheiro que começou a ganhar, a partir de 2010, e, depois, com os primeiros hits, investiu na construção de seu estúdio, onde funciona a gravadora Papatunes. Atualmente mora em frente à praia, mas não demora muito no surf: seu prazer é fazer música – e se apresenta também como DJ.
No exterior, onde é chamado de Papatino, o comportamento é o mesmo. Se viaja, é para produzir demos, beats e parcerias. Já produziu para Will.i.am, do grupo Black Eyed Peas, e Jason Derulo. “O gringo quer ouvir a mistura. Quer nossa percussão brasileira, mas também não pode ser nada muito sujo”, explica.
Em tempos de corrida pelo topo das paradas, Papatinho enxerga longe e afirma que a produção atual será vista no futuro como uma criação original brasileira, assim como o samba e a bossa nova. “Essa música da periferia, a batida funk, só tem aqui no Brasil. A Anitta leva muito disso, mesmo nas produções lá fora”, diz.
Papatinho já tem novas cartas na manga. Prepara um novo álbum com L7nnon para 2023. Além do garoto Dx, tem dois ou três artistas no radar. Só aguarda o momento certo. Para quem o procura em busca de uma fórmula mágica, avisa: nada é fácil. “Não adianta vir com uma música. Faça 10, 20. O L7nnon dormiu dois meses aqui no sofá do estúdio.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.