O município de Santa Cruz do Arari, na região do Marajó, vive dias de angústia diante de um fato que é antigo, mas se intensificou nos últimos anos, sobretudo diante da inércia da área de segurança pública estadual: o roubo de gado. Para piorar, há dois anos a cidade não tem delegado e o contingente policial é reduzido para combater a criminalidade.
Por conta disso, as quadrilhas de ladrões de gado atuam com desenvoltura na região, agindo com violência e espalhando o terror. Para tentar resolver o problema, os pecuaristas decidiram criar uma associação. Uma das providências foi mandar ofícios para Belém, pedindo socorro às autoridades estaduais. Até agora, não deu resultado. Nada é feito.
O roubo de gado bovino e bubalino não redunda só em grandes prejuízos para os pecuaristas. Coloca também em risco a saúde da população que compra a carne dos animais roubados e abatidos. Belém e municípios próximos são os mercados mais procurados pelo criminosos. Como eles não fazem controle sanitário e deixam o gado sem cuidados higiênicos, a possibilidade de aquisição da carne de animais doentes é grande. Além de danos à saúde da população, o Estado também é prejudicado, pois não há arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Segundo a Agência de Defesa Agropecuária do Pará (Adepará), mais de 50 mil búfalos foram furtados de pelo menos 700 fazendas paraenses somente no ano de 2008, causando um prejuízo não só a estrutura econômica da região, mas também um crime qualificado no Código Penal Brasileiro, mais especificamente no artigo 155 (furto),que prevê prisão de um a quatro anos, e multa. Outro artigo do código penal muito violado pelos bandidos em Santa Cruz do Arari é o 162. Esse artigo diz que é crime “suprimir ou alterar, indevidamente, em gado ou rebanho alheio, marca ou sinal indicativo de propriedade: Pena – detenção, de seis meses a três anos, e multa”.
O Ministério Público do Estado já realizou estudo sobre o roubo de gado na região entre Santa Cruz do Arari e Cachoeira do Arari. E o que apurou é preocupante. “Tal delito é recorrente nos referidos municípios, além de não se caracterizar enquanto um fenômeno recente, visto que sua ocorrência data até do período provincial, de acordo com relatos oficiais da época em questão”, diz o MP.
Para o MP, o que chama a atenção para essas ocorrências é a quantidade, cada vez maior, de gado bovino e bubalino furtado que é comercializado, não só em nosso estado, mas também em outros estados brasileiros, o que em muitos casos, incorre não somente em um crime contra os cofres públicos, mas também um crime de segurança sanitária e epidemiológica, uma vez que incide no risco de colocar em circulação, no mercado, carne de origem duvidosa nos lares de nossa sociedade.
É espantoso saber que um terço da carne de gado consumida pelos paraenses, comprada em feiras de bairros de periferia e em alguns supermercados do Estado, é ilegal e corre o risco de estar contaminada devido a uma ausência dos mecanismos de controle sanitário e qualidade do produto. Com constantes furtos de gado bovino e bubalino na Ilha do Marajó, muitos animais têm sido abatidos sem qualquer fiscalização ou higiene, estocados em caixas de isopor e transportados para vários municípios dos estados do Pará e Amapá, atravessando algumas vezes as fronteiras do Brasil.
Como agem os ladrões
Quer ter uma ideia de como estão as coisas nas fazendas, veja o que diz um fazendeiro que identificamos apenas com o nome de João, para evitar represálias. Ele descreveu a ação dos criminosos da seguinte maneira: “os ladrões entram na propriedade e levam os animais sem reação dos funcionários, pois os funcionários estão desarmados e os ladrões armados e ainda os funcionários temem represálias. Na cidade todos sabem quem são os ladrões, exceto os pouco policiais que se encontram no município”. João contabiliza mais de 1.000 cabeças de gado levadas pelas quadrilhas.
Outro proprietário de gado, tratado com o nome fictício de Pedro, afirma que sua fazenda já foi vítima de dez ataques, perdendo mais de 200 animais. Ele diz que não sabe mais a quem recorrer para cessar a onda de crimes em sua fazenda. Tanto João quanto Pedro, assim como outros pecuaristas, são unânimes em dizer que fizeram denúncias às autoridades policiais, mas raramente conseguiram recuperar o gado.
A negligência das autoridades no combate às quadrilhas é enorme. Só não é maior que a ousadia dos ladrões. Que continuam a agir impunemente. Pobre Santa Cruz do Arari. Pobre Marajó. Vivem ao deus-dará em matéria de governo.
Vídeo de gado recuperado: