Revisão da velocidade da internet necessária para escolas públicas considerou aspectos técnicos apontados em reportagem do ‘Estadão’ que mostrou que parâmetros adotados pelo MEC limitavam a concorrência e favoreciam a entrada da empresa Elon Musk no governo
O governo federal redefiniu parâmetros das velocidades de internet necessárias para conectar milhares de escolas públicas depois de o Ministério da Educação (MEC) baixar uma regra que limitava a concorrência entre as empresas e favorecia a entrada da Starlink, de Elon Musk, no setor. A ideia de conectar escolas à internet é uma das principais bandeiras do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na área educacional e deverá custar R$ 8 bilhões até 2026.
Como revelou o Estadão em outubro, os critérios do MEC estavam acima de referenciais técnicos do Brasil e do exterior, restringiam o mercado de internet por satélite à empresa de Musk e não eram atendidos nem pelo programa de conectividade de escolas da Telebrás, a estatal de telecomunicações. Após a publicação da reportagem, o ministro Camilo Santana suspendeu a regra e determinou uma reavaliação.
m vez de uma velocidade mínima de 50 megabits por segundo (mbps), a mínima agora será de 20 mbps. Este patamar atende recomendações técnicas a um custo menor e é considerado suficiente para atividades pedagógicas em determinados tipos de escolas (entenda abaixo).
A revisão dos critérios foi realizada pelo Comitê Executivo da Estratégia Nacional das Escolas Conectadas (Enec), responsável por estabelecer as normas da política do governo que vai levar internet às escolas. As novas velocidades definidas pelo grupo foram divulgadas em uma resolução publicada pelo MEC em 22 de fevereiro.
A Enec foi lançada em setembro para conectar ou melhorar a internet de 138 mil escolas. A estratégia, apresentada no âmbito do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), é uma das principais iniciativas do governo Lula para a área da educação. Essa política pretende mexer apenas na conexão das unidades de ensino. Equipamentos como computadores para os alunos deverão ser viabilizados em um segundo momento por meio de licitações do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Como era?
Uma portaria publicada pelo MEC em agosto de 2023 estabeleceu em 50 megabits por segundo (mbps) a velocidade mínima de conexão para as escolas.
O parâmetro é “pequeno” para os centros urbanos, atendidos pela tecnologia de fibra óptica, mas considerado alto para localidades afastadas, onde a conexão via satélite é a principal opção. A internet por satélite é mais lenta do que a por fibra.
O Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), criado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), principal referência técnica para assuntos de conectividade no Brasil, recomenda velocidade equivalente a 1 mbps por aluno, no maior turno da escola. Sem recomendação de velocidade mínima.
“Apoiamos a ideia de seguir critérios/metodologias reconhecidos nacional e internacionalmente. Nesse sentido, tem sido bem aceito o critério de 1 mbps/aluno no maior turno, ou na impossibilidade, a melhor internet disponível na região”, afirmou Paulo Kuester Neto, supervisor de projetos do NIC.br, ao Estadão.
Das 138 mil escolas públicas do Brasil, cerca de 40 mil ficam fora da área de cobertura de fibra óptica, em regiões mais remotas e sem infraestrutura. Portanto, serão conectadas com satélite. Do total, 23 mil são pequenos estabelecimentos, com menos de 50 alunos. O mínimo para todas essas seria de 50 mbps.
O índice é superior aos padrões praticados nos Estados Unidos (EUA) e em alguns países da Europa. Também está acima da meta das Nações Unidas para todas as escolas do mundo até 2030. A referência nos EUA, por exemplo, também é a de 1 mbps por aluno.
Quando o governo estabeleceu a regra anterior, o satélite brasileiro operado pela Telebrás ficaria subutilizado. Ele conectava escolas a uma velocidade máxima de 20 mbps. Usando um outro tipo de tecnologia de satélites, a Starlink oferece velocidades maiores, superiores a 50 mbps.
Como ficou?
A referência de 1 mbps por aluno foi seguida, mas com distinções entre a internet por fibra e a conexão por satélite. No primeiro caso, o mínimo ficou estipulado em 50 mbps por escola. No outro, em 20 mbps.
Em reunião do comitê da Enec em 27 de outubro, Paulo Kuester Neto foi convidado para apresentar os critérios técnicos que acabaram sendo considerados pelo grupo, conforme a ata do encontro obtida pelo Estadão por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). O supervisor do NIC.br coordena um núcleo de ciência de dados que trabalha com conectividade de internet em instituições de ensino.
Kuester Neto apresentou o parâmetro de 1mpbs “como a referência internacional, e o modelo a ser seguido pelo Brasil”. As justificativas apresentadas por ele foram o “respeito às diferenças de tamanho, ao desafio de uma realidade geográfica extensa e diversa e à capacidade de sustentar uma abordagem com diversos tipos de tecnologia”. Esse padrão garante conectividade para buscas gerais na internet, acesso a redes sociais e videochamada.
A decisão do comitê da Enec foi tomada em uma reunião realizada em dezembro, liderada pela secretária-executiva do MEC, Izolda Cela. Com informações de O Estado de São Paulo.