A operação conduzida pela Polícia Federal e autorizada pelo ministro do STF, Flávio Dino, trouxe à tona um enredo de suspeitas e denúncias que expõe a promiscuidade entre figuras públicas, família e empresários com vínculos estreitos ao governo do Pará. O alvo principal: a deputada federal Elcione Barbalho e seu filho, o governador Helder Barbalho.
Como em todo jogo de influência, os estilhaços do escândalo atingiram também empresários de alto calibre, envolvidos em contratos milionários com o Estado. Sob sigilo e intensas gestões nos bastidores para que a incursão da PF fosse abafada na imprensa, as informações que chegam ao Ver-o-Fato mostram facetas de um jogo sórdido de poder.
A assessoria de Elcione não responde aos pedidos de manifestação e a do governador se esconde dos jornalistas. Cinco viaturas da PF com agentes, de acordo com um policial, estiveram no Palácio do governo e na Casa Civil, durante a tarde de ontem. Informações, não confirmadas, dão conta de que celulares e documentos teriam sido apreendidos.
Um dos nomes que emergem no epicentro desse turbilhão é o do empresário Fábio Simões, figura conhecida por sua atuação no fornecimento de alimentação ao sistema penitenciário e hospitais públicos paraenses. Mais que um simples prestador de serviços, Simões seria compadre e, segundo fontes, sócio do ministro das Cidades, Jader Filho. Essa sociedade, dizem, remonta aos tempos da boate Casablanca, em Belém.
Procurado pela reportagem para comentar sua suposta ligação societária com Simões, o ministro Jader Filho optou pelo silêncio. Nem Jader nem sua assessoria responderam às perguntas enviadas. Um silêncio que, no cenário atual, grita mais alto que qualquer justificativa.
Amigos e contratos
Desde maio de 2019, após Helder Barbalho assumir o governo do Pará, os contratos da empresa MWS Eventos e Buffet, de Fábio Simões, com o Estado dispararam. Apenas no fornecimento de marmitas para presos e hospitais como Ophir Loyola, Gaspar Vianna e Hemopa, a empresa acumulou faturamento de cerca de R$ 300 milhões até 2024, segundo apuração do Ver-o-Fato no Portal da Transparência estadual.
O primeiro contrato, firmado por R$ 8 milhões, foi apenas o começo. De lá para cá, os valores se multiplicaram, acompanhados por sucessivos reajustes, mesmo que a qualidade do serviço prestado continue alvo de críticas. Até agosto deste ano, foram pagos R$ 34,3 milhões à empresa. A pergunta que não cala: como se justificar tamanha escalada de valores em um setor que deveria primar pela eficiência e austeridade?
“A comida servida nos presídios é um horror, muito ruim. Cheia de gordura e muitas vezes com gosto e cheiro capazes de dar náuseas, nem porco aguenta . E não adianta reclamar, porque o cardápio e a qualidade não mudam”, declarou um policial penal.
Investigação atinge outros nomes
A operação também trouxe à tona o nome do empresário Roger Aguilera, presidente do Paysandu e envolvido em transações questionáveis. Aguilera teria vendido um apartamento em São Paulo para Rodrigo Montori, mas o imóvel nunca foi entregue devido a um bloqueio judicial motivado por dívidas fiscais. Além disso, a PF investiga transações entre Aguilera e o marido da deputada Elcione Barbalho, bem como eventuais contratos com o governo estadual.
Roger Aguilera foi procurado pelo portal, mas não retornou às chamadas e nem pedido de entrevista sobre seu envolvimento na operação da PF
Razão a Flávio Dino?
A operação de ontem não poupou ninguém. Com “sangue nos olhos” contra as emendas parlamentares, o ministro Flávio Dino não apenas mirou na família Barbalho, mas também atingiu empresários cujos negócios dependem das gorduras financeiras geradas por essa promiscuidade institucional.
A operação no Pará e também na Bahia, onde ocorreram desvios de emendas parlamentares, seria uma espécie de salvo-conduto de Flávio Dino na queda de braço contra o Congresso Nacional, Ele quer dar a entender e manda recado de que estaria cheio de razões em restringir a dinheirama dos políticos em seus estados e as irregularidades investigadas pela PF
Na verdade, o caso ilustra como as relações de compadrio corroem a gestão pública, drenando recursos em contratos superfaturados e alavancando privilégios para poucos, enquanto a população sofre com serviços básicos precarizados. No fim das contas, quem paga a conta é sempre o contribuinte.