O juiz Magno Chagas, da 1ª Vara da Fazenda Pública, mandou suspender a licitação aberta no final de novembro passado pelo prefeito Zenaldo Coutinho para contratação de empresa que irá executar serviços de pavimentação, drenagem e urbanização da nova Avenida Augusto Montenegro, entre o terminal Mangueirão e o terminal Maracacuera. A obra envolve custos de R$ 148, 9 milhões. O Ver-o-Fato teve acesso exclusivo à decisão judicial.
O procedimento licitatório, segundo o mandado de segurança impetrado pela empresa Engefort Construtora e Empreendimentos Ltda, por meio do escritório de advocacia Mendes & Mendes, “apresenta diversos vícios, sobretudo desrespeito às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal para a realização do procedimento”.
Essa licitação, segundo os advogados da empresa, orçada em exatos R$ 148.995.814,07 e com prazo de contratação estabelecido de 30 meses, “alcança e compromete o orçamento da próxima gestão, colocando em voga a viabilidade da contratação”. Além disso, completa, o edital “restringiu o caráter competitivo do certame, haja vista que requer cadastro prévio junto ao Cadastro Unificado de Fornecedores –Sicaf, como exigência obrigatória para a habilitação na referida licitaçã, além de ausência de transparência quanto ao procedimento de habilitação do consórcio vencedor do pregão realizado no dia 30/11/2020”.
Na decisão, o juiz Magno Chagas argumenta que estão “presentes os requisitos legais para deferimento do pedido formulado pelo impetrante em face de tutela antecipada de urgência, haja vista que o edital contém vícios de legalidade, portanto, passível de controle judicial. De fato, o edital, ato administrativo que vincula às partes, dispõe que somente interessados previamente habilitados no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores estariam aptos a participar do procedimento licitatório, o que se reputa violador do caráter competitivo do certame público, com possibilidades efetivas de inviabilizar a seleção da
proposta mais vantajosa pela Administração Pública”.
O magistrado observa que o Tribunal de Contas da União já sumulou que tal exigência “não atende a finalidade pública, vez que cria critérios que não se coadunam com a igualdade de condições entre concorrentes, orientação que deve ser seguida por todos os entes da Administração Pública, com o intuito de promover a higidez dos procedimentos de finalidade pública”.
Veja a decisão na íntegra
Vistos, etc.
Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA impetrado por ENGEFORT CONSTRUTORA E EMPREENDIMENTOS LTDA em face de ato que reputa ilegal e abusivo e atribui ao MUNICÍPIO DE BELÉM e outros (3), partes qualificadas. Narram os autos, que em 04/11/2020 foi dado publicidade a realização de procedimento licitatório na forma de Regime Diferenciado de Contratação(RDC) eletrônico, realizado às 9:30h do dia 30/11/2020 através do portalwww.comprasgovernamentais.gov.br, cujo
critério de julgamento estabelecido foi o de menor preço global e o regime de execução de empreitada por preço unitário, com o modelo de disputa aberto.
O referido procedimento licitatório tem como objeto a seleção da proposta mais vantajosa para a contratação de empresa para execução dos serviços de pavimentação, drenagem e urbanização da nova Avenida Augusto Montenegro, entre o terminal Mangueirão e o terminal Maracacuera. O procedimento licitatório supracitado apresenta diversos vícios, em síntese: Desrespeito às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal para a realização do procedimento;
O procedimento licitatório, orçado no montante de R$ 148.995.814,07 (cento e quarenta e oito milhões e novecentos e noventa e cinco mil e oitocentos e quatorze reais e sete centavos) com prazo de contratação estabelecido de 30 meses, alcança e compromete o orçamento da próxima gestão, colocando em voga a à viabilidade da contratação; O edital restringiu o caráter competitivo do certame, haja vista que requer cadastro prévio junto ao Cadastro Unificado de Fornecedores –SICAF, como exigência obrigatória para a habilitação na referida licitação; Ausência de transparência quanto ao procedimento de habilitação do consórcio vencedor do pregão realizado no dia 30/11/2020.
Em decorrência dos fatos narrados, requer o impetrante a concessão de liminar determinado a suspensão de imediato o procedimento licitatório, impondo a disponibilização dos documentos de habilitação das empresas vencedoras para análise das partes interessadas e realização de eventuais questionamentos.
Relatei. Decido.
Recebo a inicial com a emenda promovida no ID 22032903, por reputar represente os pressupostos da ação. Defiro o pedido de parcelamento de custas em 04 parcelas, conforme requerido pelo impetrante no ID 22073993, devendo a UNAJ adotar as providências cabíveis para correção do valor da causa no sistema PJE e seus consectários.
Passo a análise do pedido liminar.
Pois bem. A concessão de medida liminar em Mandado de Segurança obedece ao comando normativo do artigo 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/09, isto é, reclama a presença do relevante fundamento do pedido (fumus boni iuris) e do perigo de ineficácia da medida (periculum in mora), caso persista o ato impugnado. Nesse sentido, de bom alvitre trazer à baila o disposto por José Henrique Mouta Araújo (Araújo, José Henrique Mouta. Mandado de Segurança. 5. ed. rev., atlz. e ampl. – Salvador: JusPodvim, 2015):
“Ora, sendo a tutela provisória liminar em mandado de segurança modalidade de tutela antecipada, é necessário concluir que não há juízo de discricionariedade na apreciação da medida, desde que estando presentes os requisitos legais para a sua concessão (art. 300, do CPC/15). Na verdade, o que por vezes ocorre na prática, é que o impetrante não consegue demonstrar a presença da urgência e da relevância do pedido, sendo postergada a apreciação do pedido de liminar para momento posterior às informações.
Portanto, mister aduzir que, estando presentes os requisitos, deve ser concedida a medida liminar (se for o caso com a fixação de caução, fiança ou depósito – art. 7º, III, da nova LMS), evitando inclusive o perecimento do direito material discutido no mandamus.” Assim, a liminar em Mandado de Segurança não se presta a qualquer prejulgamento da lide, mas tão somente a análise dos pressupostos ensejadores de sua concessão.
Nesta oportunidade a análise se restringe ao juízo de probabilidade, ou seja, do fumus boni iuris, além da necessária demonstração da existência de um risco de dano que possa vir a prejudicar a eficácia da tutela pretendida ao final. Outrossim, nos termos do art. 300, do Código de Processo Civil, os efeitos da tutela de urgência pretendida no pedido inicial devem ser antecipados quando, a partir das provas carreadas aos autos, restar caracterizada a verossimilhança das alegações, haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
Tais requisitos encontram-se compilados nos preceitos do fumus boni iuris e no periculum in mora, a serem interpretados em conjunto com o disposto no § 3º do art. 300 do CPC, posto que o pedido será indeferido na medida em que restar evidenciada a irreversibilidade dos efeitos práticos gerados pelo provimento antecipado. O magistério de Humberto Theodoro Júnior assim se posiciona acerca dos requisitos necessários à antecipação dos efeitos do pedido: “O perigo de dano refere-se ao interesse processual em obter uma justa composição do litígio, seja em favor de uma ou de outra parte, o que não poderá ser alcançado caso se concretize o dano temido nasce de dados concretos, seguros, objeto de prova suficiente para autorizar o juízo de probabilidade em torno do risco de prejuízo grave.
Pretende-se combater os riscos de injustiça ou de dano derivados da espera pela finalização do curso normal do processo. Há que se demonstrar, portanto, o “perigo na demora da prestação da tutela jurisdicional” (NCPC, art. 300). Esse dano corresponde, assim, a uma alteração na situação de fato existente no tempo
do estabelecimento da controvérsia – ou seja, do surgimento da lide -, que é ocorrência anterior ao processo. Não impedir sua consumação comprometerá a efetividade da tutela jurisdicional a que faz jus o litigante.” (NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 20ª Ed. Editora Forense, p. 802).
Da análise em face de cognição sumária dos autos, vislumbro presente os requisitos legais para deferimento do pedido formulado pelo impetrante em face de tutela antecipada de urgência, haja vista que o edital contém vícios de legalidade, portanto, passível de controle judicial. De fato, o edital (ID 21820262), ato administrativo que vincula às partes, dispõe que somente interessados previamente habilitados no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores estariam aptos a participar do procedimento licitatório, o que se reputa violador do caráter competitivo do certame público, com possibilidades efetivas de inviabilizar a seleção da
proposta mais vantajosa pela Administração Pública.
Necessário levar em consideração que o Tribunal de Contas da União já sumulou que tal exigência não atende a finalidade pública, vez que cria critérios que não se coadunam com a igualdade de condições entre concorrentes, orientação que deve ser seguida por todos os entes da Administração Pública, com o intuito de promover a higidez dos procedimentos de finalidade pública.
A propósito, a súmula: Súmula nº 274 –É vedada a exigência de prévia inscrição no Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores –SICAF para efeito de habilitação em licitação. No mesmo sentido, merece ser considerado o fato de que o procedimento licitatório objeto da presente controvérsia prever um plano de execução que extrapola a gestão do atual governante e impõe onerações a futura gestão, o que pode dar ensejo a violações da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A alegada inexistência de transparência no decorrer do procedimento de seleção e contratação pública também é substancial para consolidar a necessidade de deferimento da liminar pleiteada pelo impetrante. Vale registrar que o fazer/agir público deve se nortear pela publicidade, de modo a possibilitar o controle da atuação administrativa. No caso em questão, o procedimento não se encontra acobertado pelas hipóteses de sigilo constitucional, de modo que a inexistência de
transparência no que tange o desenrolar do procedimento que culminou na declaração de um vencedor do certame, não encontra amparo constitucional.
Desta feita, DEFIRO o pedido de liminar para determinar a SUSPENSÃO do procedimento licitatório correspondente ao EDITAL -RDC ELETRÔNICO Nº 034/2020-SEURB, em qualquer fase que se encontre, até ulterior decisão deste juízo. Nos termos do Art. 7º, I da Lei 12.016/2009 notifique-se a autoridade apontada como
coatora a prestar as informações de estilo no prazo legal de 10 (dez) dias.
Cite-se a pessoa jurídica de direito público a qual esteja vinculada a autoridade coatora, para querendo, ingressar no feito, nos termos do Art. 7º, II da Lei 12.016/2009. Após, ao Ministério Público.
Publique-se. Registre-se. Intime-se. CUMPRA-SE EM REGIME DE URGÊNCIA!
Servirá esta, por cópia digitalizada, como MANDADO DE INTIMAÇÃO, nos termos do
Provimento nº 03/2009-CJRMB TJE/PA, com a redação que lhe deu o Prov. nº 011/2009.
Belém, 18 de dezembro de 2020.
MAGNO GUEDES CHAGAS
Juiz de Direito da 1ª Vara de Fazenda Pública de Belém
(DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE)
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