Um ano de sofrimento para a população de Barcarena, de 70 pequenas comunidades, algumas vizinhas das barragens da norueguesa Norks Hydro, a empresa responsável pelo lançamento, nos rios da região, de rejeitos minerais não tratados, por meio de dutos clandestinos. As chuvas do dia 17 de fevereiro de 2018 foram fortes, é verdade, mas elas apenas expuseram crimes ambientais que já vinham ocorrendo.
Laudos de cientistas sérios, do Instituto Evandro Chagas, e da Universidade Federal do Pará, comprovaram a contaminação de rios, igarapés e poços artesianos por cromo, bário, arsênio, soda cáustica e outras substâncias, inclusive cancerígenas.
E a própria direção da Hydro, por meio de seu presidente, Svein Richard Brandtzaeg, admitiu o crime ambiental. “Nós descartamos água de chuva e da superfície da refinaria não tratadas no rio Pará”, afirmou ele em comunicado emitido após notificação da Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará (Semas), que identificou ainda um terceiro ponto de despejo irregular.
“Em nome da companhia, pessoalmente peço desculpas às comunidades, às autoridades e à sociedade”, disse Brandtzæg, no comunicado. Segundo Brandtzæg, tal conduta não faz parte dos procedimentos da empresa. “Isso é completamente inaceitável e contraria o que a Hydro acredita”, escreveu.
A empresa prometeu ainda que iria realizar uma revisão completa de todas as licenças da operação no município de Barcarena e começar uma auditoria interna. De lá para cá, um ano depois, nada foi informado sobre o resultado da tal auditoria interna. Afinal, transparência é palavra inexistente nos protocolos administrativos e ambientais da Hydro.
Resumo dessa ópera de terror exibida pelos reis empresariais da Noruega, sob o som da banda de rock A-Ha: nenhuma ação criminal contra ela até hoje foi impetrada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual, milhares de pessoas perderam suas fontes de renda – e os rios, contaminados, eram a principal delas -, saúde e a paz. Até para receber água mineral e não morrer de sede, a burocracia da Hydro escolhe os agraciados. Quem critica a empresa é alijado.
É kafkiano: não há ação criminal contra a Hydro, mas a Hydro, por mais bizarro que isso possa parecer, move um processo judicial, por “calúnia e difamação”, contra o cientista do Evandro Chagas (IEC), Marcelo Lima, que nada mais fez a não ser agir com dignidade e enorme senso profissional ao emitir, depois de provocado pela população vítima da Hydro, um laudo fundamentado sobre a contaminação das águas de Barcarena.
Audiência pública
Na véspera do fatídico aniversário da tragédia, Barcarena terá, nesta sexta-feira, dia 15, nova audiência pública convocada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) relacionada ao caso dos lançamentos irregulares de água da chuva não tratada pela Hydro no Rio Pará, denunciados em 17 de fevereiro do ano passado por várias comunidades.
A audiência será realizada das 9 às 13 horas na igreja da Assembleia de Deus do bairro Vila dos Cabanos, em frente à Praça de Alimentação. O evento é aberto a todos os interessados, até a capacidade máxima de público no espaço, que é de mil pessoas.
O MPF e o MPPA vão informar as comunidades sobre as iniciativas das duas instituições relativas ao cumprimento do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC) que o estado do Pará e a empresa Hydro Alunorte assinaram com os MPs em setembro.
A força-tarefa do MPF e a MPPA para o caso também pretende colher propostas, críticas e sugestões da população, para implementar a segunda fase de cadastramento de pessoas atingidas pelo vazamento de efluentes oriundos da planta industrial da empresa Hydro.
Além disso, serão discutidos os critérios de participação de representantes das comunidades e categorias atingidas pela ação da Hydro Alunorte, objetivando a composição do Comitê de Acompanhamento do referido TAC-Emergencial.
Audiência Judicial
Enquanto isto, no próximo dia 21, haverá uma audiência judicial na qual a Cainquiama, entidade das vítimas da Hydro, pede a paralisação das atividades da empresa norueguesa até que ela tome providências para evitar novo despejo ilegal de rejeitos misturado com água de chuva. Três técnicos, arrolados pela Cainquiama, devem ser ouvidos durante a audiência.
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