O Pará continua na linha de frente da escravidão de trabalhadores no país. É uma liderança que deveria cobrir de vergonha qualquer governo, mas isso parece não incomodar a área do executivo. Em contrapartida, fiscais da lei e policiais, unidos no único objetivo de combater essa prática abjeta, unem seus esforços e realizam trabalho digno de elogios.
Alojamentos improvisados na mata, sem acesso à água potável, banheiro ou alimentação adequada, além de jornadas de trabalho desgastantes, sem qualquer proteção física ou contrato trabalhista. Essas são algumas das irregularidades constatadas em nova operação no Pará. A operação, iniciada em julho passado, segue seu caminho e desta vez resgatou 80 trabalhadores em garimpos clandestinos no município de Ourilândia do Norte, no sudeste paraense.
Além de combate ao trabalho escravo, a ação da Polícia Federal (PF), integrada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ministério Público Federal (MPF), tinha como foco o combate a crimes ambientais e extração ilegal de minérios no Estado. Nos 15 alvos flagrados com trabalhadores, a maioria dos encontrados em situação análoga à escravidão eram do próprio município de Ourilândia e adjacências, e do Estado do Maranhão.
Entre os 80 resgatados, sete eram mulheres. Havia ainda três adolescentes, filhos da cozinheira do local, e uma criança de 1 ano e 6 meses, filho de uma outra trabalhadora. No mesmo dia do flagrante, o grupo foi encaminhado para Ourilândia e Marabá, para que, os que manifestaram interesse, pudessem retornar para as suas cidades de origem, a maioria do Maranhão.
Segundo a subprocuradora-geral do MPT, Edelamare Melo, que participou da operação, juntamente como procurador do trabalho Acir Hack, os trabalhadores, via de regra, não informaram os nomes dos proprietários dos garimpos, se referindo a eles, em alguns casos, pelo apelido que são conhecidos, o que dificulta a adoção de medidas judiciais contra os infratores. “Por se tratar de garimpos ilegais, tivemos dificuldade de identificar os empregadores, mas as investigações seguem junto à Delegacia da Polícia Federal de Redenção”, afirmou a procuradora.
“O êxodo de trabalhadores do Maranhão para o Pará, em busca de dinheiro rápido e, na concepção deles, mais fácil, está ocorrendo por conta do desemprego em larga escala de lavradores que não encontram trabalho na sua atividade, em razão dos latifúndios de soja e milho que estão fazendo desaparecer as pequenas propriedades rurais”, explicou a procuradora Edelamare Melo.
Insalubridade
As condições precárias e violadoras de direitos foram confirmadas pelos membros do MPT e da Polícia Federal. Os trabalhadores estavam alojados em barracões improvisados, cobertos com lona e palha, sem fechamento lateral, expostos a riscos nas áreas de vivência, e em situação de vulnerabilidade. As necessidades fisiológicas eram feitas no mato ou em um banheiro improvisado com lona, com um buraco no chão, sem cobertura, higiene e privacidade.
Não havia local adequado para o preparo e armazenamento dos alimentos, alguns deles, inclusive, estavam no chão. A água para consumo, preparo dos alimentos e higiene era proveniente de uma grota, uma espécie de cavidade que acumula a água das chuvas, sem qualquer potabilidade.
Foi constatada ainda a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), material de primeiros socorros que, conforme a legislação, devem ser fornecidos pelo empregador sem custo para o empregado. Os trabalhadores relataram ainda que não receberam treinamento para o exercício das atividades perigosas e de risco desempenhadas nos garimpos.
Mais irregularidades
Em um segundo alvo da operação, onde cerca de 20 trabalhadores foram encontrados, todos receberam o pagamento pelos dias trabalhados, já que no momento da ação o empregador estava presente. O montante foi calculado com base no salário mínimo, já que os empregados tinham poucos dias no garimpo. Eles eram remunerados por produção e com pagamento em ouro, ou seja, se nada fosse produzido, nada recebiam. Nos demais garimpos não houve pagamento, pois os empregadores não foram identificados ou se evadiram no momento da fiscalização.
Desde 2019, as áreas das propriedades rurais fiscalizadas e as de seu entorno, pertencentes à União, estão sendo exploradas ilegalmente por garimpeiros. Nos locais também foram encontradas armas e munições, além de máquinas de uso na atividade mineradora que foram apreendidas pela Polícia Federal, ou destruídas no local dada a impossibilidade de remoção e a possibilidade de reutilização para a extração ilegal do ouro. Todos os garimpos foram desativados. A ação contou com a participação de mais de 100 policiais federais, dois procuradores do MPT e um procurador da República. (Do Ver-o-Fato, com informações da Ascom do MPT no Pará e Amapá)