Carlos Mendes – editor do Ver-o-Fato
Uma postagem do dileto amigo Elias Pinto na página dele, na sexta-feira, 5, no Facebook, traz à tona uma informação sobre o estado de saúde do irmão, o também jornalista Lúcio Flávio Pinto. Como é sabido, Lúcio, prestes a completar 73 anos, trava uma batalha contra o mal de Parkinson. Não tem sido fácil a vida de Lúcio ao encarar o tratamento para minimizar a intensidade da doença.
O texto de Elias emocionou muita gente não apenas pela afinidade que o une ao irmão, mas pela cumplicidade de ambos ao compartilhar uma paixão extremamente salutar: a devoção à arte de escrever – e escrever bem -, à literatura e à poesia. Enfim, a manifestação libertária de pensar e dizer o que pensa.
Elias produziu um justo desabafo, uma não-aceitação do que está acontecendo com Lúcio. Está aflito e preocupado, com justa razão. E pede que os amigos, ou que se dizem amigos, também manifestem o mesmo amor que ele sente pelo irmão.
Entendo a inquietação de Elias e da família de Lúcio, mas o Pará inteiro muito deve à coragem e lucidez de Lúcio Flávio Pinto de fazer o jornalismo que sempre fez, sem concessões aos poderosos de plantão e sem vender a alma ao diabo das tentações mundanas. Lúcio rejeitou pressões, denunciou ameaças, inclusive de morte, e seguiu em frente, com a altivez de quem não negociou a dignidade.
Definido pelo sempre saudoso Euclides Bandeira como “exército de um homem só”, Lúcio é uma referência que talvez nem ele próprio se dê conta, para novos jornalistas e até velhos, como eu, que o tenho como amigo – sei que a recíproca é verdadeira – e fonte de inspiração. Nossa afinidade em torno do jornal “O Estado de São Paulo” nos aproximou ainda mais.
Ele, antes de mim, foi quem montou a sucursal do Estadão em Belém, dando vida a um projeto competente que idealizou e foi abraçado pela família Mesquita, dona do jornal. Depois, a partir de meados da década de 90, assumi a correspondência do Estadão no Pará, permanecendo por longos 23 anos.
Então, para resumir: seja por seu caráter e honradez, ou em trabalhos profissionais no jornal O Liberal, na fase do “seu” Rômulo Maiorana, seja no Estadão, seja no Bandeira 3, em A Província do Pará, mais atrás, na televisão, ou em sua intensa produção de pensador sobre a Amazônia, além de tantas outras sementes de fertilidade intelectual aqui germinadas, Lúcio Flávio precisa saber que todos nós o amamos. E muito.
É um amor sem contrapartida. Porque o verdadeiro amor por quem tanto admiramos não exige reciprocidade. Ele é o que é. Misto de gratidão, afeto e alegria.
Fica bem, Lúcio. É o que te deseja o “dr. Mendes”, termo que sempre usaste ao carinhosamente a mim se dirigir, sendo eu um doutor de coisa alguma.
Um abraço e um beijo, querido.
Veja o que Lúcio escreveu em seu blog, sobre a postagem do irmão, Elias, também abaixo:
Amor pela palavra – Meu irmão, o jornalista e escritor Elias Ribeiro Pinto, conseguiu reunir dezenas de amigos e leitores com um texto que postou no seu Facebook. Um texto que me emocionou muito. Só ele poderia prestar um depoimento tão íntimo sobre a relação que temos, desde a mais remota (a minha iniciada exatamente 10 anos antes da dele) com os livros e, em particular, a poesia. Até me tornar jornalista profissional, aos 16 anos, em maio de 1966, eu me dedicava à literatura (e à filosofia, além da política). Pensava que esse seria o meu rumo existencial e profissional.
Lia sem parar obras de autores do Brasil e do mundo, com ênfase na poesia. Até escrevia versos, alguns dos quais publiquei no caderno de cultura que criei, em 1967, no jornal A Província do Pará (e na coluna Poemograma, que abrigou poetas conhecidos e novos). Alguns dos poemas saíram na antologia Cantação, apreendida pela Polícia Federal quando ainda estava na gráfica, logo depois do AI-5, em 1969.
Nos últimos tempos, talvez na premonição de um fim que se anuncia, divulgo aqui alguns desses cometimentos literários que resistiram ao tempo, à desorganização e ao desleixo. Na esperança de que sejam legíveis e possam criar inspiração para a criação dos leitores, como a inspiração que levou o Elias a me presentear com sua linda manifestação de colega, amigo e irmão.
Diz o texto:
Eu quero prestar um tributo aqui
ao cara mais íntegro que eu tive o prazer de conviver
um cara que foi jornalismo em sua essência
que eu vi ser atacado à esquerda e à direita
mas ainda assim ele se manteve fiel à essência do jornalismo
que é a busca da verdade, do fato.
Já antecipo o nome: Lúcio Flávio Pinto. Meu irmão.
Não relembrarei os nossos momentos; por ora, não interessam.
Mas relembrarei tê-lo visto três ou quatro dias atrás, frágil, alcançado pelas doenças que o vão minando
Doenças que ninguém desconfiaria ao vê-lo ágil no pensamento que deságuam nos seus textos no blog
Eu queria dizer que o amo.
Porra, vocês não são capazes de dizer o mesmo?
Tanta gente que o admira e o tem como referência mas se acovardou e preferiu, sei lá, deixar pra lá
Você sabe ao que me refiro
E firo – eu firo duramente aqueles que me ferem
Mas o Lúcio nunca foi assim. Jamais feriu. A delicadeza em pessoa. E vocês sempre souberam disso. E se calaram.
Paro por aqui. Por enquanto. Há algo que me une ao Lúcio acima, ou abaixo.
E a isso se chama: poesia. Aliás, isso é: chama.
Amo o Lúcio.