Agricultores da comunidade Vale do Bocaia, no Baixo Acará, denunciaram à polícia a invasão de homens armados que, a serviço da empresa Brasil Bio Fuel (BBF), antiga Biopalma, praticaram toda sorte de violência, inclusive tortura. A empresa é acusada de grilagem de terras e de querer, na marra, expulsar as famílias que há décadas vivem na área. Ela diz ter comprado mais de 600 hectares do empresário Antônio Carlos Fonteles de Lima e que, em vista disso, seria a proprietária das terras. Mas os agricultores contestam judicialmente a suposta propriedade, alegando inclusive falsidade documental.
Segundo os relatos, a Biopalma contratou milícia privada cujo objetivo seria espalhar o terror na região, intimidando quem se atreve a defender o direito de permanecer na terra. Na última sexta-feira, por exemplo, como mostram vídeos enviados ao Ver-O-Fato, os milicianos chegaram por volta das 5h30 armados e em caminhões.
Eles queriam que os agricultores deixassem o local e ao ser questionados sobre a invasão, sem qualquer ordem judicial, partiram para a violência, praticando agressões físicas e desferindo tiros em direção aos que criticavam a conduta arbitrária dos cerca de 50 homens. Mulheres e crianças que integram as 60 famílias da comunidade ficaram muito assustadas com a fúria dos seguranças. Os invasores, além de armas, portavam coletes e capuzes.
Foi um festival de truculência, de acordo com o boletim registrado na Delegacia de Polícia do Acará. Os seguranças derrubaram as casas de madeira dos agricultores, quebraram motocicletas e ainda jogaram spray de pimenta sobre as mulheres e crianças. Marcos Nunes Pinto, que processa a Biopalma na justiça, ao reagir à agressão, foi baleado. Ele foi levado para uma unidade de saúde da cidade do Acará, mas devido ao seu estado de saúde foi transferido para um hospital de Belém.
No registro policial, a narrativa do agricultor Felizel Monteiro da Silva demonstra os momentos de terror qie as famílias passaram nas mãos dos seguranças. Conta Felizel, que esteve na delegacia acompanho dos também agricultores Maksciel Campos de Souza e Micael Pinto da Silva, todos residentes na comunidade Vitória da Fé.
Como de costume estávamos em nossos locais de trabalho e quando iríamos começar a trabalhar, a empresa BBF invadiu o local, com caminhões do tipo contêineres, tratores e ônibus com muitos trabalhadores. Quando a gente foi contestá-los, perguntando se eles teriam algum mandado, desceram fortemente armados e, sem identificar quem usaria as armas de fogo, começaram a atirar em nossa direção, dizendo que as ordens que tinham era para matar”.
Ainda segundo o relato na delegacia, Felizel conta que após os disparos das armas de fogo dos capangas da BBF, os agricultores conseguiram correr em busca de proteção, mas alguns ficaram pelo meio de caminho, passando a apanhar, enquanto outras eram baleadas e algumas recebiam spray de pimenta. Os que conseguiram correr ficaram vendo de longe seus familiares apanhando dos seguranças e seus barracos derrubados, “um sonho de anos vindo ao chão”. Os seguranças “derrubaram nossos barracões que usamos para nos alimentar, derrubaram casas e dispararam bombas de efeito moral contra nossas mulheres e crianças e ainda atiram contra mais de 25 motos e um caminhão baú”
Em um vídeo, é possível acompanhar o momento em que os trabalhadores tentam impedir a passagem de um caminhão e são surpreendidos por homens encapuzados e armados, que já descem do veículo atirando. Os trabalhadores se afastam sem nenhuma condição de enfrentar o poder bélico dos homens armados. Nenhum agricultor aparece com arma de fogo ou arma branca no vídeo em questão.
Com a palavra, a BBF, em nota:
A Brasil BioFuels (BBF) informa que ontem (01/10/21), por volta das 06 horas da manhã, quando trabalhadores se dirigiam a algumas das fazendas da empresa no Pará para realizar a colheita de palma de óleo, foram surpreendidos por aproximadamente 25 invasores que há alguns meses têm tentado ilegalmente se apropriar das fazendas da BBF, instalando barracos no local, furtando os frutos pertencentes à empresa e impedindo, com emprego de violência e grave ameaça, a continuidade das atividades dos trabalhadores rurais da BBF.
Há aproximadamente duas semanas, os invasores promoveram verdadeiro terror na localidade, ameaçando os trabalhadores com arma de fogo, cercando os representantes da empresa e impedindo os caminhões e demais veículos da empresa de sair do local, promovendo o furto de grande quantidade de frutos colhido pelos empregados da empresa. Diante de tantas ocorrências, devidamente comunicadas às autoridades policiais, a BBF tem reforçado sua equipe de segurança com o objetivo de preservar a integridade física de seus colaboradores, que vem sofrendo ameaças em inúmeras localidades em que atua no Estado do Pará, além de mitigar os grandes prejuízos financeiros suportados por invasões ilegais muitas vezes estimulada por advogados e comerciantes locais, que financiam tais condutas criminosas para se apropriar de ganhos oriundos do furto de frutos.
Na data de ontem, conforme já era previsto, os invasores pertencentes à Comunidade conhecida como Bucaia, aguardavam os trabalhadores da BBF novamente portando armas de fogo, alguns com sachos, facões e outras armas brancas, os quais foram devidamente apreendidas pela polícia civil em auto próprio. Os criminosos mais uma vez efetuaram bloqueio e passaram a agredir os colaboradores da BBF, com nova tentativa de adentrar a cabine do caminhão da empresa e agredir o motorista, como ocorreu na situação anterior – um dos agressores inclusive efetuou um disparo de arma de fogo atingindo o veículo, o que ocasionou um verdadeiro tumulto e alguns colaboradores da BBF sofreram lesões e passaram por atendimento médico.
Imediatamente e em resposta a mais essa investida dos invasores contra o pessoal da BBF, a equipe de segurança se viu obrigada a agir de forma a evitar novas ocorrências e, principalmente, com o objetivo de desarmar os insurgentes e evitar situações mais graves, além de desmontar os barracos ilegalmente instalados em um ponto específico de uma das fazendas de dendê da BBF. Diante dessa situação causada pelos criminosos, a polícia local foi acionada pela BBF para conter a situação. O Boletim de Ocorrência 00117/2021.100792-6, foi registrado na delegacia de Concórdia do Pará – 3ª RISP. A BBF aguarda apuração do caso para maiores esclarecimentos.
Na mesma localidade, já foram registrados diversos Boletins de Ocorrência em decorrência de incontáveis furtos de frutos, desmatamento, ameaças e lesão corporal na área de atuação da empresa pelos indivíduos da referida comunidade, liderada pelo indivíduo denominado Marcos Nunes Pinto (“Marquinhos”) que, inclusive, foi quem efetuou o disparo por arma de fogo na porta do Caminhão da empresa, conforme acima mencionado, o que poderia ter ocasionado uma tragédia.
A BBF lamenta o ocorrido e aguarda uma atuação firme das autoridades, de modo a elevar a segurança pública das regiões nas quais atua, com a geração de mais de 6000 empregos, sendo importante para a economia das localidades do Pará e demais estados da região norte onde possui negócios. Finalmente, a Companhia reitera o respeito às pessoas e às comunidades e reafirma seu compromisso social, ambiental, econômico e energético.”
Agricultores rebatem empresa:
” Os agricultores são nascidos e residem na terra há anos, terra passadas de pais para filhos. Antes de iniciarem o projeto de agricultura familiar no cultivo de dendê, viviam de outras agriculturas como mandioca para venda in natura, farinha, pupunha, e etc.
Em 2010, foram procurados pela antiga empresa Biopalma para iniciarem o PAF – projeto de agricultura familiar – onde cederiam suas terras para o plantio de dendê, onde, a própria Biopalma entraria com subsídios para o plantio, e os agricultores ficariam responsáveis pela manutenção, limpeza, colheita do dendezal.
Os agricultores então realizavam a colheita dos frutos e vendiam para a empresa Biopalma, a qual ficava responsável por retirar os frutos das terras dos agricultores. O referido projeto, durante os anos, deu certo e vinha sendo honrado pelas partes, até o momento em que a empresa foi vendida para a BBF, momento em que passaram a hostilizar e perseguir os pequenos agricultores e moradores locais, pois os seguranças da empresa, e PM afastados passaram a andar quase que diariamente armados nas terras, ameaçando os agricultores e suas famílias.
A então empresa BBF ingressou em juízo no mês de fevereiro do corrente ano, alegando que os agricultores haviam invadido suas terras, e reivindicando em juízo a posse das terras. No entanto, reivindicam as terras com base em documentação falsificada, e adulterada, envolvendo vários cartórios do Estado do Pará, inclusive, através de PAD, oficiais de cartórios foram afastados de suas atribuições pelo Tribunal de Justiça do Estado.
Toda a população do vale do Acara que possui projetos agrícolas em parceria com a antiga Biopalma, teme por suas vidas e pela perda de suas terras no atual momento, onde a BBF os intimida e os ameaça para que se retirem de duas próprias terras.
Por não obterem êxito na pretensão judicial ajuizada em fevereiro do corrente ano, desistiram das causas protocoladas em primeiro e segundo grau de jurisdição, temendo serem presos, por juntarem no processo escritura publica de compra e venda, forjada e falsificada, e agora, usam da força e do poderio econômico para intimar, agredir e perseguir os pequenos agricultores.
Forjam Boletins de Ocorrência com mentiras e inverdades, atribuindo aos agricultores aquilo que os próprios fazem: ameaças, vandalismo e crimes ambientais. Os agricultores recebem a solidariedade de toda a população acaraense, que sabe que os agricultores são pessoas humildes, pacíficas, e que residem e nasceram nas terras”.