A discriminação, sob qualquer ótica, é repugnante. Cada vez mais a sociedade desenvolve e aprimora o sentimento de mudança em relação ao tema, como forma de eliminar toda e qualquer forma de discriminação, seja racial, sexual, social, dentre outras.
Esse avanço deixou de exigir das empresas apenas o “não fazer”, isto é, o não discriminar, para exigir também o “agir”, isto é, a adoção de medidas efetivas para impedir a prática discriminatória, ainda que não intencional.
A Constituição Federal impõe como objetivo primordial da República a adoção de medidas para “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” (art. 3º, inciso IV). Este é um guia, um norte obrigatório a todos os gestores (públicos e privados) e, enfatize-se, a todos os cidadãos. Não se pode falar em cidadania sem a concepção de que todos possuem direitos e deveres inerentes à vida coletiva.
E qual a relação do tema com a atividade empresarial? Total!
No vazio debate das redes sociais polarizadas, acabam perdidos ou deturpados alguns conceitos importantes que devem guiar as atitudes em sociedade. Dentre estes, o de racismo estrutural. Sobre o tema, a Ministra Delaíde Miranda Arantes, do Tribunal Superior do Trabalho, faz um belo apontamento ao julgar o processo TST-RR-1000390-03.2018.5.02.0046: “Cumpre destacar que no atual estágio de desenvolvimento de nossa sociedade, toda a forma de discriminação deve ser combatida, notadamente aquela mais sutil de ser detectada em sua natureza, como a discriminação institucional ou estrutural, que ao invés de ser perpetrada por indivíduos, é praticada por instituições, sejam elas privadas ou públicas, de forma intencional ou não, com o poder de afetar negativamente determinado grupo racial”.
No processo em apreço, a empresa reclamada possuía um guia de padronização visual, medida administrativa para gestão do seu funcionamento e atendimento ao público. A questão é que este guia era composto e direcionado às pessoas brancas, deixando de contemplar pessoas negras. O resultado: a autora da ação, uma empregada negra, acabava sofrendo por não se enquadrar no “padrão” da empregadora, extraindo-se dos autos processuais que “os empregados de cabelo liso e comprido os utilizavam soltos, não sofrendo qualquer punição por isso, mesmo que estivessem fora dos padrões da empresa. Já a recorrente, a qual possuía cabelo ‘black power’ acima dos ombros, isto é, no padrão da demandada, era obrigada a utilizar tiara, sendo que constantemente a sua supervisora a chamava atenção acerca da maneira que usava seu cabelo.”
A decisão judicial ainda destacou que “a falta de diversidade racial no guia de padronização visual da reclamada é uma forma de discriminação, ainda que indireta, que tem o condão de ferir a dignidade humana e a integridade psíquica dos empregados da raça negra, como no caso da reclamante, que não se sentem representados em seu ambiente laboral.”
A reflexão proposta é revisitar os ‘(pré)conceitos’ e atos de gestão a fim de identificar como o racismo estrutural pode estar presente nas pequenas atitudes e, no caso de empresas, nas atitudes e hábitos de seus proprietários, gestores e empregados, com ou sem conivência dos superiores, com ou sem intenção de discriminação.
Daí a importância de adotar medidas firmes e objetivas para mudança desse paradigma, conscientizando o time sobre a necessidade de a diversidade ser imediatamente incluída nos seus planejamentos estratégicos e políticas internas.
Maria Cecília de Moura Ferreira e Maria Helena Gomes dos Santos (Programa Brasil, Gênero e Raça: Superando a discriminação no trabalho, disponível em https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/mercadodetrabalho/mt_013f.pdf)bem destacam que “A política de diversidade é vista como estratégica para a sobrevivência dos negócios para o próximo milênio. A atitude de algumas empresas terem incorporado a questão da diversidade nos seus planejamentos estratégicos, nas suas políticas internas, tem-se constituído em sucesso não só para empresas, como para a cidadania de um povo inteiro. Porque, sem prejuízo do mérito ou da qualidade, mudaram-se os paradigmas de não discriminar para a valorização da diferença, trazendo para o seio da empresa a contribuição de segmentos historicamente vitimados na sua condição de seres humanos.” E você, já revisitou e começou a mudança dos seus conceitos (ou preconceitos)? Será que as regras de governança estão realmente funcionando para garantir que todos, sem exceção, possuem os mesmos direitos e oportunidades? Faça a diferença!