Em decisão emitida em 31 de outubro passado, o desembargador federal Alexandre Vasconcelos, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, rejeitou o pedido da defesa de uma paciente de Santarém, no Pará, para que o Sistema Único de Saúde (SUS) fornecesse medicamentos de alto custo para tratar sua fibrose pulmonar. O estado de saúde da mulher é muito delicado e ela, para respirar, precisa de ventilação mecânica.
A decisão, a qual o Ver-o-Fato teve acesso, destaca que o remédio solicitado, Nintedanibe 150mg, não é incorporado aos protocolos do SUS e que “faltam evidências científicas para garantir sua eficácia e segurança no tratamento avançado da doença.”
A defesa jurídica da paciente defendeu a necessidade do fornecimento do medicamento que seria, conforme suas alegações, “o único ou o mais eficiente para o tratamento da enfermidade que lhe acomete”. Alegou que se encontrariam presentes os requisitos autorizadores para a obtenção da liminar. E pediu a antecipação da tutela para que o SUS fornecesse o medicamento, conforme prescrição médica.
O advogado da paciente recorrerá contra a decisão do desembargador para que o TRF determine o fornecimento do remédio, que custa cerca de R$ 18 mil mensais. Já houve casos de decisões judiciais favoráveis aos pacientes com fibrose pulmonar.
Os argumentos do desembargador federal
O magistrado fundamentou seu parecer no recente entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabelece que o Judiciário não pode interferir diretamente nas decisões administrativas de incorporação de medicamentos.
A decisão requer que haja uma análise minuciosa da regularidade dos processos de decisão e que o ônus da prova recai sobre o autor, que precisa demonstrar evidências clínicas robustas sobre a segurança e eficácia do medicamento prescrito.
O desembargador Vasconcelos ressaltou que, apesar de reconhecer a gravidade da condição da paciente, o relatório técnico do Nat-Jus (Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário) apresentou parecer desfavorável ao fornecimento do Nintedanibe, argumentando que este fármaco não demonstrou benefícios clinicamente relevantes, como aumento da sobrevida ou redução significativa das exacerbações, para pacientes com fibrose pulmonar avançada.
A nota técnica ainda informou que existe uma alternativa, a pirfenidona, com efeito semelhante e custo significativamente menor.
Além disso, a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS) já avaliou o Nintedanibe e recomendou sua não incorporação ao SUS, argumentando que os benefícios clínicos e a relação custo-efetividade são insuficientes para justificar o uso do medicamento no sistema público de saúde brasileiro.
O magistrado concluiu que o simples parecer médico não é suficiente para garantir o fornecimento de um fármaco não incorporado, sendo imprescindível demonstrar sua eficácia comprovada e a inexistência de alternativas já disponíveis.
A decisão encerra com o indeferimento da tutela antecipada, mantendo a paciente sem o fornecimento do Nintedanibe pelo SUS.
Outros trechos
Na decisão do desembargador federal Alexandre Vasconcelos, diversos trechos foram ressaltados para fundamentar o indeferimento do pedido. Entre os principais pontos, estão:
Necessidade de Evidências Científicas Robustas: O desembargador destacou que “não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico”. Conforme o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), a opinião médica precisa ser amparada por “evidências científicas de alto nível”, como ensaios clínicos randomizados ou revisões sistemáticas, demonstrando a eficácia e segurança do fármaco requerido.
Parecer do Nat-Jus e da Conitec: Vasconcelos citou o parecer “não favorável” emitido pelo Nat-Jus e uma Nota Técnica de 2023, que indicam que o Nintedanibe não mostrou “benefícios clinicamente relevantes” para a fibrose pulmonar idiopática em estágio avançado, como aumento de sobrevida ou redução de exacerbações. A Conitec também ressaltou que o medicamento “não é custo-efetivo para a realidade do SUS”.
Alternativa Terapêutica com Custo Inferior: A decisão aponta a existência da pirfenidona, outro antifibrótico disponível no mercado brasileiro, que tem “ação semelhante e custo significativamente menor” em comparação ao Nintedanibe. O Nat-Jus destacou que a pirfenidona pode trazer benefícios semelhantes e representa uma opção menos onerosa ao SUS.
Limitações dos Estudos Clínicos: O desembargador enfatizou que os principais estudos do Nintedanibe (INPULSIS-1 e INPULSIS-2) e da pirfenidona excluíram pacientes com fibrose pulmonar em estágio avançado, o que impede a transposição de seus resultados para casos semelhantes ao da paciente. Ele citou que, “não há, portanto, evidências científicas sólidas de que pacientes com fibrose pulmonar idiopática (FPI) avançada, que iniciam antifibróticos já com a doença em estágio avançado, apresentem benefícios clinicamente relevantes com essas medicações.”
Recomendações do Conselho Federal de Medicina (CFM): O magistrado também se referiu às definições de “urgência” e “emergência” do Conselho Federal de Medicina, indicando que a situação da paciente não se enquadra nessas categorias, afastando a necessidade de um fornecimento imediato do medicamento.
Conclusão sobre o Fornecimento pelo SUS: Na conclusão, o desembargador esclareceu que o Judiciário não pode obrigar o SUS a fornecer o Nintedanibe sem a comprovação de sua eficácia e sem que se demonstre a inexistência de alternativas terapêuticas já incorporadas.
LAUDO MÉDICO