A sala do apartamento em um edifício no bairro do Reduto, em Belém, virou um conservatório solidário da música clássica. Para driblar a evasão dos alunos da Escola de Música da Universidade Federal do Pará (EMUFPA), nesses tempos de pandemia, a professora de violino Thaís Carneiro arregaçou as mangas e levou para a casa dela as aulas que ministrava no prédio da instituição, agora fechado para reforma.
A decisão da professora surpreendeu os próprios alunos, alguns insatisfeitos com as aulas virtuais. Thaís Carneiro garante que a retomada das aulas presenciais resgatou muitos alunos que, impacientes com as condições impostas pelos seguidos confinamentos, já tinham decidido por abandonar o curso.
O jovem João Paulo Silva da Costa, de 14 anos, disse que estava decidido a não mais continuar com as aulas de violino, mas ficou sensibilizado com o esforço incomum da professora. Hoje João Paulo é um dos mais de 30 alunos que frequentam a casa da violinista, em escalas de pequenos grupos.
“Confesso que fiquei impressionado com esse gesto de respeito e carinho por todos nós. Me reanimou. Me senti valorizado”, avaliou o aluno. O pai do João, advogado Josué Costa, dispensa elogios à professora. “O que a Thaís faz tem uma significância muito grande no processo de resgate da autoestima dos alunos. Meu filho valoriza esse gesto exatamente com a vontade renovada de continuar como aluno de música, o que me parecia sentimento perdido”, completa ele.
A EMUFPA reúne centenas de alunos nos seus cursos de música, nas modalidades técnico e livre. A evasão dos alunos durante todo esse tempo em que a escola suspendeu suas atividades presenciais foi notória, apesar da retomada das aulas de forma online. O João Paulo, por exemplo, fazia parte de uma turma de oito alunos. Só restam ele e mais um. Para completar, a escola, que deveria retomar as aulas neste semestre, precisou adiar o recomeço porque as obras de restauração e ampliação do prédio ainda não foram concluídas.
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A professora Thaís Carneiro tem vida dedicada à música. Se vira nos 30. Além das aulas na EMUFPA, participa de projetos de extensão até para alunos com deficiência visual. Tem uma aluna cega recebendo aulas em sua casa. Thaís se diz completamente entregue a sua exaustiva agenda de compromissos.
Rola até acompanhamento de projetos comunitários nos bairros periféricos de Belém e até das cidades de Santarém e Macapá. Sem falar das aulas particulares. A professora lembra que decidiu abrir as portas do seu apartamento para evitar o crescimento das estatísticas da evasão. “As aulas online não bastam. O violino exige uma interação mais concreta, efetiva e afetiva entre o professor e o discente”, explicou.
A pedagoga Luciete Andrade, mãe do aluno Ivan Estevão Andrade Arifano Romero, hoje com 15 anos, disse que o filho, que estuda violino desde os 8 anos, não pensou em desistir do curso. “Mas admito que era preciso mais do que as aulas virtuais”, lembra. Ela diz que a professora Thaís sempre foi uma profissional comprometida com a aprendizagem de suas turmas. “Meu filho não pensou em desistir porque a Thaís não lhe deu tempo para tomar essa decisão”, brincou a mãe do aluno.