A corrupção sentou praça na Câmara Municipal de Igarapé-Miri, durante a eleição do presidente daquele poder, o vereador Antônio Cardoso Marques, o ” Toninho do Murutinga “, do PSB. A propina – entre R$ 20 mil, a menor, e R$ 50 mil, a maior – rolou solta e generosa na compra de votos dos vereadores. Ao fim e ao cabo, o placar a favor do candidato socialista foi uma goleada semelhante a uma partida entre peladeiros: 11 a 4.
O escândalo dessa eleição – que já corria em grupos de whatsaapp e blogs daquele município – também revelou a existência de um “mensalinho” na Câmara Municipal, onde vereadores comandados por “Toninho do Murutinga” aprovariam o que bem entendessem, até mesmo a cassação de quem cruzasse o caminho das ilegalidades.
A doação graciosa ao empresário Manoel Fonseca Bastos Filho, o “Mimi Bastos” – o homem mais rico da cidade – de um terreno de 18.000 metros quadrados do município no centro de Igarapé-Miri, também em troca de propina, é apenas um detalhe sórdido que veio à tona nas investigações da “Operação Escambo”, do Ministério Público, deflagrada na manhã desta quarta-feira, 11, naquela cidade do Baixo-Tocantins.
Na operação de hoje, da qual participaram policiais civis, do Gaeco – o grupo de combate ao crime organizado – e mais nove promotores de Justiça, foram cumpridos cinco mandados de prisão, sendo três de vereadores, do secretário municipal de Administração e de um empresário da cidade. As investigações do Ministério Público do Pará apontam que os envolvidos participam de um grupo criminoso montado para praticar delitos a partir da função que ocupam e da influência que exercem em Igarapé-Miri.
Esse grupo é suspeito de cometer crimes de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, estelionato, coação no curso do processo, além de falsificação de documentos. Além das prisões, a busca e apreensão de documentos, computadores, celulares e mídias ocorreu na residência e local de trabalho dos investigados, vereadores Antônio Cardoso Marques, o “Toninho do Murutinga”, presidente da Câmara, Mário Jelffison Farias Pantoja, o “Kadheq”, Ruffino Leão e Gelffison Brandão Lobo, o “Professor Gel”, secretário municipal de Administração, além do empresário Manoel Fonseca Bastos Filho, o “Mimi Bastos”.

De acordo com o MP, os presos foram encaminhados à Delegacia Geral de Polícia Civil e depois à Diretoria Estadual de Combate à Corrupção (Decor). Em seguida, deveriam realizar exame de corpo de delito e depois seriam entregues ao sistema penitenciário.
Relatam os autos,que correm sob sigilo de justiça, que se encontra ocorrendo na Câmara de Vereadores de Igarapé-Miri uma “verdadeira mercância de votos”. Ou seja, os vereadores estariam comercializando leis, cassações e demais atos que dependam da aprovação do legislativo miriense.
Compra de votos na Câmara
O Ver-o-Fato teve acesso ao pedido de prisão preventiva e de busca e apreensão formulado pelo Ministério Público e deferido pelo juiz da comarca de Igarapé-Miri, Charbel Abdon Haber Jeha. O processo está segredo de justiça. Veja a íntegra do documento:
“Em janeiro deste ano, ocorreu, como previsto em lei, votação para eleição do presidente da Câmara de Vereadores, tendo circulado, de forma intensa, nas redes sociais e blogs da cidade,que o representado Antônio Cardoso Marques, o “Toninho do Murutinga”, atual presidente da casa legislativa, teria realizado compra de votos de diversos vereadores para obter êxito na eleição de sua chapa.
O Ministério Público apurou que vereadores como os senhores Neto Nahum, Gil Pinheiro, Rufino Leão, Mário Jelfflison e Guto da Comunidade teriam recebido cerca de R$ 50 mil, enquanto outros, como os vereadores Genivaldo Braga Valente e Nenca (José Roberto Santos Corrêa) teriam recebido a quantia de R$ 30 mil. Há informação ainda de que a vereadora Ângela Maués teria recebido a quantia de R$ 20 mil.
Ressalta o MP que, além de todo o valor em dinheiro recebido pelos vereadores mencionados e pago por Antônio Cardoso Marques “Toninho do Murutinga”, houve também a negociação de funções públicas, uma vez que o atual presidente da Câmara se encontrava apoiado pelo prefeito “Toninho Peso Pesado”, do MDB.
A veracidade de tais fatos se reforçou – prossegue o MP no pedido de prisão preventiva – através de áudios do vereador Mário Jelffison Pantoja, o “Kadheq”, nos quais ele narra que teve seu voto comprado pelo vereador “Toninho do Murutinga”, tendo recebido certa quantia em dinheiro, bem como informado que recebe uma espécie de “mensalinho” por meio do pagamento de diárias.
Durante interceptação telefônica, realizada no curso das investigações, foi possível, segundo narrado, obter diálogo realizado entre os vereadores Ângela Maués e Do Carmo, os quais falam que receberam de “Toninho do Murutinga” proposta no valor de R$ 40 mil, mais pagamentos mensais de diárias, para que votassem nele.
Vereador confirmou
Esses fatos foram confirmados pelo vereador Do Carmo em depoimento prestado para o Gaeco na Promotoria de Justiça de Igarapé-Miri, no dia 6 de agosto de 2019, sendo que, no dia das eleições, “Toninho do Murutinga” ganhou a presidência da Câmara por 11 votos a 4, sendo os outros quatro votos destinados ao candidato Valdir Júnior.
Ainda de acordo com o pedido de prisão, durante as investigações constatou-se a compra de votos para a doação de um terreno pertencente ao município de Igarapé-Miri, com aproximadamente 18.000 metros quadrados, no centro da cidade, ao empresário Manoel Fonseca Bastos Filho, o “Mimi Bastos”, dono de um dos maiores supermercados da cidade.
Ficou ainda apurado que existe um pedido de doação do tal terreno desde o ano de 2014, porém se encontrava parado até o corrente ano,quando “Toninho do Murutinga” assumiu a presidência da Câmara Municipal e prometeu ao empresário que agilizaria a conclusão da doação.

Cumprindo promessa do presidente do legislativo, a doação do terreno foi colocada em pauta e votada de forma favorável ao empresário “Mimi Bastos”. Entretanto, houve o pagamento da quantia de R$ 5.500 para que fosse rateado em seu grupo político para que votassem pela doação do terreno.
Por fim, narram os autos que tais fatos restaram comprovados por meio do depoimento da testemunha Miguel Bilak, que é amigo do empresário “Mimi Bastos” e foi o responsável por repassar a quantia em dinheiro ao vereador “Toninho do Murutinga”, tendo ele narrado que o dinheiro seria “um agrado aos vereadores”. Consta ainda que foi repassado, após a votação na Câmara, por meio da testemunha João da Toia, a quantia de R$ 1.500 ao secretário de Administração, Gelffison Brandão Lobo, para que agilizasse a documentação do terreno doado ao empresário “Mimi Bastos”.
O que diz o juiz
“ As investigações apontam que os investigados participam de um grupo criminoso montado para praticar delitos na cidade de Igarapé-Miri, a partir da função que ocupam e da influência que exercem na cidade, havendo indícios de que ocultam provas em suas residências e em seus locais de trabalho”, afirma o juiz Charbel Abdon Haber Jeha no decreto de prisões e de busca e apreensão.
Ele enfatiza que do exame dos motivos expostos pelo Ministério Público, como também dos elementos de prova, ou seja, o auto circunstanciado da Operação Escambo e documentos que instruem a denúncia, “extraem-se indícios suficientes a justificar a efetivação da medida pleiteada, uma vez que há notícia de que os investigados negociaram e ainda negociam a aprovação de leis, tudo em troca do recebimento de propina que, conforme narrado, perdura até os dias atuais”.
“Imprescindível, portanto, o deferimento da medida para se possibilitar a apreensão de maiores elementos de convicção, de molde a possibilitar a aferição da veracidade dos informes, como também evitar que novos delitos sejam cometidos, resguardando-se assim a ordem pública e evitando que os investigados destruam as provas já existentes”, resume o juiz.
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