O Tribunal do Júri de Cametá, condenou o réu Ivan Rodrigues Moreira a 59 anos de prisão, em regime fechado, pelos assassinatos da mulher dele, Cleisiana Soares Sacramento, de 24 anos, e do filho do casal, Ivan Willian Sacramento Moreira, de 10 anos. O juiz Márcio Rebello, que presidiu o julgamento, leu a sentença durante a noite de ontem. A reunião do júri demonstrou a celeridade dos processos na comarca de Cametá, pois o crime foi praticado 1 ano atrás.
O assassinato, praticado com requintes de crueldade, ocorreu em janeiro do ano passado, no bairro Cidade Nova, em Cametá, na Região do Baixo Tocantins. A mulher estava dormindo com o filho quando os dois foram mortos pelo réu.
O crime chocou moradores do município. Cleiciana Sacramento, então esposa do réu, teve o crânio amassado por golpes de bigorna. O filho do casal foi estrangulado com um guardanapo.
Ivan Moreira foi preso na madrugada do dia 8 de janeiro de 2020, quando foi à Delegacia de Polícia da cidade informar que havia encontrado a esposa e o filho mortos ao chegar do trabalho. Antes, ele tinha ido à casa do pai, onde informara sobre as mortes.
Equipes da Polícia Militar e da Polícia Civil foram ao local e encontraram os corpos de Cleiciana Sacramento e de seu filho. De acordo com policiais, Ivan Moreira foi detido após apresentar versões contraditórias aos agentes durante as averiguações.
Na acusação atuou o promotor de justiça Márcio Almeida de Farias, com apoio da assistente de acusação, Martha Pantoja Assunção, que pediram a condenação do réu. Pela defesa, os advogados Marcelo Freitas, João Ricardo Batista de Oliveira e Antônio do Socorro Cruz dos Santos sustentaram as teses de negativa de autoria e de clemência.
Formulados os quesitos, o conselho de sentença reconheceu, por maioria de votos, que o réu praticou o crime de homicídio qualificado contra as duas vítimas.
Na sentença sobre a morte da mulher, o juiz Marcio Rebello entendeu que, na forma como foi perpetrada, premeditada e executada, a empreitada criminosa demonstra a presença de uma frieza emocional e de uma insensibilidade acentuada por parte do réu, que procedeu a uma covarde e bárbara investida contra a mulher, enquanto ela dormia.
“Verifico a conduta social e a personalidade flagrantemente desajustada e destoante do que se espera de um ser minimamente racional e provido de sentimentos, pois o desenrolar desta trama criminosa conta com detalhes sórdidos, mesquinhos e evidencia a mais absoluta impiedade humana e uma total subversão de valores”, aponta, destacando que o réu era usuário de drogas, o que também milita em seu desfavor.
Pelo assassinato da mulher, com agravante de feminicídio, o juiz aplicou ao réu a pena máxima de 30 anos de prisão, em regime fechado. Pela morte do filho, Ivan Moreira foi condenado a 29 anos de prisão, também em regime fechado.
Veja a íntegra da sentença condenatória:
PROCESSO: 0000284-10.2020.814.0012
CRIME: HOMICIDIO QUALIFICADO
RÉU: IVAN RODRIGUES MOREIRA
VÍTIMAS: Cleisiana Soares Sacramento e Ivan Willian Sacramento Moreira
Crimes: Artigo 121, §2º, Incisos I, IV e VI do CP em relação à vítima Cleisiana Soares Sacramento c/c Artigo 121, §2º, Incisos III e IV do CP
SENTENÇA
Vistos etc.
Inicio adotando como relatório o mesmo da decisão de Pronúncia, acrescido do que consta em atae do pensamento de Martin Luther King para quem “o que preocupa não é o grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons”.
Na fase dos debates, a tribuna da acusação representada pelo Douto Promotor de Justiça, DR. Márcio Almeida de Farias e pelo ilustre Assistente de Acusação Advogada Dra. Martha Pantoja Assunção sustentou sua pretensão em plenário, pleiteando a condenação do réu nos termos da pronúncia.
A Defesa, a seu turno, representada pelos nobres Advogado DR. Marcelo Freitas, Dr. João Ricardo Batista de Oliveira e Dr. Antônio do Socorro Cruz dos Santos, sustentou as teses de negativa de autoria e de clemência.
Observadas as formalidades processuais legais, transcorreu sem anormalidades a sessão de julgamento.
Formulados os quesitos, o douto Conselho de Sentença reconheceu, por maioria de votos, que o réu IVAN RODRIGUES MOREIRA praticou o crime de homicídio qualificado em face das vítimas acima nominadas.
Passo então a fixar a pena em observância ao mandamento constitucional da individualização da pena previsto no art. 5º da CF/88 e ao sistema trifásico do art. 68, CP.
Crime do art. 121, §2º, incisos I, IV e VI do CP em relação à vítima Cleisiana Soares Sacramento
O crime de HOMICÍDIO QUALIFICADO, previsto no artigo 121, §2º, incisos I, IV e VI do CÓDIGO PENAL BRASILEIRO prevê a PENA DE 12 a 30 ANOS DE RECLUSÃO já utilizada a qualificadora do feminicídio (art. 121, §2º, inciso VI do CP).
Quanto à CULPABILIDADE, entendo que, na forma como foi perpetrada, premeditada e executada, a empreitada criminosa ora em exame demonstra a presença de uma frieza emocional e de uma insensibilidade acentuada por parte do réu, que procedeu a uma covarde e bárbara investida contra a vítima enquanto esta dormia.
Registro ainda que pouco importou o vínculo afetivo, emocional e os nobres sentimentos que a vítima Cleisiana nutria pelo réu Ivan Rodrigues Moreira, o que chocou a consciência jurídica universal, a sociedade local e agrediu as mais comezinhas noções acerca da racionalidade humana, tudo conduzindo ao mais profundo juízo de reprovabilidade por este Juiz.
O réu não apresenta ANTECEDENTES CRIMINAIS.
Verifico a CONDUTA SOCIAL e a PERSONALIDADE flagrantemente desajustadas e destoantes do que se espera de um ser minimamente racional e provido de sentimentos, pois o desenrolar desta trama criminosa conta com detalhes sórdidos, mesquinhos e evidencia a mais absoluta impiedade humana e uma total subversão de valores.
Ademais, o réu era usuário de drogas, o que também milita em seu desfavor.
A torpeza dos MOTIVOS será considerada agravante na 2ª fase da dosimetria.
As CIRCUNSTÂNCIAS do crime merecem reprovação a maior considerando o emprego do recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima reconhecido pelo Conselho de Sentença e pelo fato de ter sido o delito meticulosamente arquitetado.
As CONSEQUENCIAS do crime também merecem o rigor necessário por parte do Estado-juiz, eis que a vítima teve sua vida ceifada quando ainda possuía longa perspectiva de vida.
O COMPORTAMENTO DA VÍTIMA em nada contribuiu para o ocorrido.
A análise das circunstancias judiciais subjetivas como realizada, além de expressa permissão legal do art. 59, CP, encontra guarida na lição do brilhante magistrado paulista Guilherme de Souza Nucci para quem “quanto mais se cercear a atividade individualizadora do juiz na aplicação da pena, afastando a possibilidade de que se analise a personalidade, a conduta social, os antecedentes, os motivos, enfim os critérios que são subjetivos em cada caso concreto, mais cresce a chance de padronização da pena, o que contraria, por natureza, o princípio constitucional da individualização da pena, aliás, cláusula pétrea” (NUCCI, “Individualização da pena”, RT, 2007, 2ª edição, pg. 195).
Pelo exposto, fixo a PENA-BASE em 28 anos de reclusão para a condenado IVAN RODRIGUES MOREIRA.
Não existem atenuantes, porém considero a qualificadora do motivo torpe reconhecida pelo Conselho de Sentença como circunstância agravante, a exemplo do fato do crime ter sido praticado contra cônjuge (respectivamente art. 61, inciso II, alínea “a” e “e”, CP), razão pela qual AGRAVO a pena anterior em 01 ano de reclusão por cada agravante.
Não existem causas de diminuição ou de aumento de pena.
Assim, pelo crime de homicídio qualificado do art. 121, §2º, I, IV e VI do CP, torno a pena definitiva e concreta do acusado IVAN RODRIGUES MOREIRA em 30 anos de reclusão em face da vítima Cleisiana Soares Sacramento.
Crime do art. 121, §2º, incisos III e IV do CP em relação à vítima Ivan Willian Sacramento Moreira
O crime de HOMICÍDIO QUALIFICADO, previsto no artigo 121, §2º, incisos III e IV do CÓDIGO PENAL BRASILEIRO prevê a PENA DE 12 a 30 ANOS DE RECLUSÃO já utilizada a qualificadora do meio insidioso ou cruel (art. 121, §2º, inciso III do CP).
A CULPABILIDADE deve ser valorada negativamente em grau máximo pelos mesmos motivos expostos na dosimetria acima.
O réu não apresenta ANTECEDENTES CRIMINAIS.
Verifico a CONDUTA SOCIAL e a PERSONALIDADE flagrantemente desajustadas e destoantes do que se espera de um ser minimamente racional e provido de sentimentos, conforme razoes já registradas acima.
Os MOTIVOS do crime não merecem valoração negativa.
As CIRCUNSTÂNCIAS do crime merecem reprovação a maior considerando o emprego do recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima reconhecido pelo Conselho de Sentença, o que será valorado a título de agravante na segunda fase da dosimetria.
As CONSEQUENCIAS do crime também merecem o rigor necessário por parte do Estado-juiz, eis que a vítima teve sua vida ceifada quando ainda criança.
O COMPORTAMENTO DA VÍTIMA, por obvio, em nada contribuiu para o ocorrido.
Pelo exposto, fixo a PENA-BASE em 27 anos de reclusão para a condenado IVAN RODRIGUES MOREIRA em face do crime cometido contra a vítima Ivan Willian Sacramento Moreira.
Não existem atenuantes, porém considero a qualificadora do recurso que impossibilitou ou dificultou a defesa da vítima (inciso IV), a exemplo do fato do crime ter sido praticado contra descendente, AGRAVO a pena anterior em 01 ano de reclusão por cada agravante.
Não existem causas de diminuição ou de aumento de pena.
Assim, pelo crime de homicídio qualificado do art. 121, §2º, III e IV do CP, torno a pena definitiva e concreta do acusado IVAN RODRIGUES MOREIRA em 29 anos de reclusão em face da vítima Ivan Willian Sacramento Moreira.
DO CONCURSO DE CRIMES
Os autos noticiam que os crimes foram praticados mediante mais de uma ação, tornando, portanto, aplicável o sistema do cúmulo material previsto no art. 69, CP.
DO DISPOSITIVO
Pelo exposto e em razão da fundamentação acima, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na Denúncia e CONDENO como CONDENADO tenho IVAN RODRIGUES MOREIRA a uma PENA DEFINITIVA, CONCRETA e FINAL de 59 (cinquenta e nove) anos de reclusão pelos crimes de homicídio qualificado praticado contra as vítimas.
Determino que as penas sejam cumpridas em regime INICIALMENTE FECHADO, ex vi do art. 33, CP.
DA PRISAO PREVENTIVA e DA EXECUCAO PROVISÓRIA DA PENA
Diante da condenação ora imposta, indiscutível a presença do fumus comissi delicti através da materialidade e dos suficientes indícios de autoria.
Mas não é o bastante.
Acerca do periculum in mora, permitam-me uma digressão: este magistrado entende que há crimes, na verdade, de tamanha gravidade, que, por si só, justificam a prisão. E, neste caso, todos haverão de concordar que os delitos ora tratados, graves e chocantes, tiveram incomum repercussão, causaram intensa indignação e geraram no tecido social incontrolável e ansiosa expectativa de uma justa contraprestação jurisdicional.
A comunidade precisa respeitar a lei, a Polícia e a Justiça e os delitos objeto da presente sentença condenatória externam uma gravidade concreta geradora de um profundo abalo neste sentimento de respeitabilidade, que, para o restabelecimento da confiança no império da ordem posta, exige uma imediata e incessante reação.
A falta desta reação aniquilaria essa confiança e serviria de estímulo à prática de novas infrações, não sendo razoável, por isso, que condenados por crimes brutais permaneçam livres, sujeitos a uma conseqüência remota e incerta, como se nada tivessem feito.
Não nego a existência de vozes que reclamam a cautelaridade para a manutenção da prisão preventiva.
Pois bem: se um e outro, isto é, se clamor público e necessidade da preservação da respeitabilidade de atuação jurisdicional se aliarem à certeza quanto à existência do fato criminoso e a veementes indícios de autoria, claro que todos esses pressupostos somados servem de bom, seguro e irrecusável fundamento para a excepcionalização da regra constitucional que presume a inocência dos condenados até o trânsito em julgado.
Ademais, a cautelaridade resta também evidenciada pela necessidade de se assegurar a ordem pública e a aplicação da lei penal considerando que o acusado informou em seu depoimento que respondeu a processo de crime de roubo e de tráfico, já tendo sido inclusive condenado anteriormente.
Outro motivo que justifica a manutenção do acusado no cárcere também diz respeito EXECUCAO PROVISORIA prevista no art. 492, inciso I, alínea “e”, CPP, tendo que vista que o acusado recebe reprimenda estatal superior a 15 anos de reclusão.
A arrogância do ora condenado quando imaginou que enganaria o Estado o fez assumir a perfeita caricatura desenhada por Oliver Thomson na obra “A Assustadora História da Maldade” e descumpriu a advertência do escritor inglês Samuel Richardson que havia dito “Tende cuidado, vossa violência vos tira o poder de defesa”.
Detalhado estudo da Escola americana de Direito de Harvard sobre “como conter o crime” já apontou a necessidade de “reformar o processo penal para impedir os criminosos bem representados de zombar de todos nós, agravando as penas e humanizando as prisões”.
Por todas essas razões, e ainda firme na crença do filósofo francês Jean-Jacques Rousseau para quem “o homem é bom por natureza; a sociedade é que o corrompe”, não vejo outra saída a este Juiz senão DETERMINAR A IMEDIATA EXECUCAO DA PENA, MANTENDO A PRISAO PREVENTIVA do condenado IVAN RODRIGUES MOREIRA, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade da presente sentença na forma do art. 312, CPP c/c art. 492, CPP.
Serve a presente como MANDADO DE PRISAO em relação ao condenado, recomendando-o na Casa Penal em que se encontra.
Após o trânsito em julgado, determino a expedição das peças necessárias ao Juízo das Execuções Penais, ofício à Justiça Eleitoral e o lançamento do nome dos condenados no livro “rol dos culpados”.
Sentença publicada. Partes intimadas.
Plenário do Tribunal do Júri, Fórum da Comarca de Cametá, Estado do Pará, aos 02 de fevereiro de 2021, precisamente 18h55min.
MARCIO CAMPOS BARROSO REBELLO – JUIZ DE DIREITO – Titular e Presidente do Tribunal do Júri
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