Quando a venda da empresa for consumada, segundo Tabaranã, ele fará denúncias às à Comunidade Econômica Europeia e ao Tribunal Penal Internacional
A venda da gigante do dendê Agropalma pelo conglomerado empresarial deixado pelo banqueiro Aloysio de Andrade Faria, agora sob a direção de suas cinco herdeiras – Lucia, Júnia, Cláudia, Flávia e Eliana –, lança um holofote de dúvidas sobre uma série de questões delicadas e potencialmente controversas que cercam a operação da empresa, especialmente em relação às alegações de irregularidades fundiárias, ambientais e sociais, incluindo violações de direitos humanos.
Esses problemas não apenas colocam em xeque a responsabilidade corporativa e ética da Agropalma, mas também desafiam as herdeiras a se posicionarem frente aos legados e práticas da empresa que agora buscam negociar. Não é possível que elas não saibam, ou finjam ignorar, o que acontece fora da bolha de prosperidade financeira dentro da qual vivem.
Se nada sabem, por outro lado, estariam sendo enganadas por quem cercava o banqueiro Aloysio de Faria e dele também omitiu a situação que há mais de 40 anos ocorre na empresa estabelecida no Pará. O que também seria difícil de acreditar, pois uma empresa com solidez econômica e boa reputação no mercado zela por sua imagem e credibilidade junto aos clientes.
Em entrevista concedida ontem ao Ver-o-Fato, o sr. José Maria Tabaranã da Costa Junior, representante de sua mãe, Aída Maria, e de seus irmãos em ações judiciais que envolvem a Agropalma, afirmou que a hora da verdade para as cinco herdeiras “já chegou e elas deveriam vir a público explicar porque família do banqueiro insiste em manter silêncio sobre fatos notórios e indesmentíveis”.
“Minha família tem orado muito e agradecido a Deus pela força que ele nos tem dado para suportar tanta pressão, ameaças e indiferença dessas pessoas. Se a justiça dos homens está se fazendo, embora demorada, a justiça de Deus é infalível e surge no tempo certo”, diz Tabaranã.
“Proposta indecente”
Ele relata que anos atrás, quando o banqueiro Aloysio ainda estava vivo, a família Tabaranã foi chamada a São Paulo para que o caso fosse resolvido por meio de um acordo entre as partes, mas era “tudo simulação, não queriam resolver nada, apenas ganhar tempo, confiando no poder financeiro e na influência política que gozam no Pará”.
“O emissário desse encontro em São Paulo e de outro, desta vez realizado em Belém, o advogado Christophe Cadier – que chegou a declarar em inquérito policial aberto no Acará que já sabia dos problemas da empresa na região e que iria resolvê-los – ofereceu migalhas sobre nossas terras que já haviam ocupado ilegalmente, usando documentos falsos e até cartório fantasma. Naturalmente que nossa família recusou a proposta indecente, mas anos depois a própria Agropalma divulgou a mentira de que nossa família queria extorquir a empresa, fazendo chantagem. Para você ver até onde vai o cinismo dessa gente”, enfatizou Tabaranã.
De acordo com Tabaranã, sobre a alegada chantagem “nunca existiu”. “O que sempre existiu de fato e de direito foram as denúncias realizadas junto aos órgãos competentes que, em sede de apuração e de ação penal, concluíram que diretores da empresa Agropalma praticaram atos delituosos, como corrupção ativa e passiva e uso de documentos falsos. Se de fato existisse algum tipo de extorsão ou chantagem o poderoso grupo Agropalma já teria utilizado de seu poder econômico e político para tentar a condenação da família por essas imputações”.
Grito fora do Brasil
Segundo ele, a família apenas aguarda a concretização da venda da Agropalma para tomar algumas providências, como a comunicação fartamente documentada do que ocorre no Pará, as ações judiciais criminais e civis contra a empresa, denunciando tudo à Comunidade Econômica Europeia (OCDE), à Organização Internacional do Trabalho (OIT) e até ao Tribunal Penal Internacional, na Holanda. “Não vamos ficar parados, Deus tem dito em nossas orações que o direito humano está ao nosso lado e devemos continuar a batalha, porque o justo vencerá o ímpio”. E revelou que pesquisadores e jornalistas internacionais têm procurado sua família para saber detalhes sobre o caso. “Nosso grito de socorro já está sendo feito fora do Brasil”, resumiu.
Por fim, Tabaranã foi lacônico ;” enquanto as herdeiras tomam champagne com o dinheiro oriundo da farsa Agropalma, minha família e os povos tradicionais da região do Acará e Tailândia pagam essa conta. É um verdadeiro brinde à impunidade”. Seu aviso é de que a realização da COP-30 em Belém “não passará em branco e muitas outras revelações virão à tona diante da comunidade internacional”.
Com a palavra, a Agropalma
O Ver-o-Fato procurou ontem a direção da Agropalma, em São Paulo, para ouvir a versão da empresa sobre a entrevista de Junior Tabaranã. Por meio de sua assessoria da empresa, embora tenha recebido um resumo das declarações, a empresa divulgou a seguinte nota:
“A Agropalma refuta veementemente todas as infundadas e inverídicas acusações”.
Perguntas às 5 herdeiras e seus advogados
Entre os inúmeros documentos entregues ao Ver-o-Fato, Júnior Tabaranã, formula indagações que, segundo ele, as cinco herdeiras deveriam responder – seja de viva voz ou por meio de seus advogados. Das cinco herdeiras, Lúcia de Campos Faria e Junia de Campos Faria Ziegelmeyer moram em São Paulo, Flávia Faria de Vasconcellos, no Rio de Janeiro, Cláudia Faria, em Nova York, e Eliana Faria, em Londres.
1. Conhecimento sobre a propriedade das terras
A revelação de que uma parcela significativa dos 106 mil hectares entre os municípios do Acará e Tailândia não pertenceria legalmente à Agropalma, mas sim a herdeiros de Antônio Maia, a família Tabaranã, e a comunidades quilombolas e indígenas, levanta importantes questionamentos sobre a legitimidade da propriedade das terras pela empresa. É crucial que as herdeiras investiguem e esclareçam estas alegações.
2. Respostas às ações penais e acusações ambientais
As acusações enfrentadas pela Agropalma e seus executivos, incluindo corrupção, uso de documentos falsos, falsidade ideológica, e violações ambientais, exigem uma resposta transparente e ética das herdeiras. É fundamental que elas demonstrem comprometimento com a justiça e a sustentabilidade, adotando medidas para resolver essas questões legais de maneira conclusiva e responsável.
3. Suspensão de certificação internacional e licenciamento ambiental
A suspensão da certificação pela RSPO (Roundtable on Sustainable Palm Oil) e a falta de licenciamento ambiental para operar a indústria de beneficiamento em Tailândia são assuntos de grave preocupação. Isso não apenas afeta a reputação da Agropalma como líder na exportação de óleo de palma, mas também questiona o compromisso da empresa com práticas sustentáveis e éticas. As herdeiras têm a responsabilidade de abordar esses desafios diretamente, buscando restaurar a certificação e garantir o pleno cumprimento das leis ambientais. Devem responder ainda sobre suspensão de licenças ambientais pela Semas e sobre a ilegalidade da propriedade das terras junto ao Incra, que a empresa não conseguiu comprovar.
4. Questões de direitos humanos e crimes ambientais
As alegações de violações de direitos humanos, incluindo o assassinato de um indígena Tembé, no final do ano passado, além de acusações de crimes ambientais adicionam outra camada de complexidade à gestão da Agropalma. As herdeiras precisam adotar uma postura firme contra tais práticas, implementando políticas rigorosas de direitos humanos e ambientais, e cooperando plenamente com as investigações para assegurar que justiça seja feita.
Situação da Agropalma
Para as herdeiras de Aloysio de Andrade Faria, a venda da Agropalma representa não apenas uma transação financeira significativa, mas também uma oportunidade para reavaliar e reformular as práticas empresariais da companhia. Ao enfrentar as questões levantadas, elas têm a chance de liderar com exemplo, mostrando que é possível alinhar os interesses empresariais com a responsabilidade social, ambiental e ética.
A situação da Agropalma, tanto nas esferas legal, ambiental quanto social, exige uma gestão cuidadosa e transparente, refletindo um compromisso genuíno com a sustentabilidade e a ética empresarial.
Direitos da família Tabaranã
A questão da posse e propriedade das terras ocupadas pela Agropalma no estado do Pará revela um complexo emaranhado jurídico e social, que coloca em destaque a disputa por terras entre a empresa e a família de Aída Raimunda da Silva Maia, descendentes do português Antônio Maia. Com aproximadamente 106 mil hectares de terras sob a gestão da Agropalma, alegações indicam que cerca de 70 mil desses hectares seriam, na verdade, de propriedade legítima da família Maia, com base em decisões judiciais, incluindo uma decisão já transitada em julgado emitida pela desembargadora Luzia Nadja do Nascimento, do Tribunal de Justiça do Pará.
Este cenário jurídico complexo não apenas coloca a Agropalma na posição de posseira das terras, mas também abre a possibilidade para a família Maia de intervir legalmente na transação de venda da empresa. Essa potencial intervenção poderia, teoricamente, embargar a venda, dada a importância da clareza na titularidade das terras envolvidas na operação da Agropalma, especialmente considerando a magnitude da transação e seu impacto tanto no mercado local quanto internacional.
A decisão judicial favorável à família Maia, lavrada pela desembargadora Luiz Nadja do Nascimento, não apenas reforça seus direitos sobre uma parcela significativa das terras em questão, mas também destaca a necessidade de uma resolução justa e legalmente embasada que reconheça os direitos de todas as partes envolvidas.
Por outro lado, para a Agropalma e seus potenciais compradores, essa situação exige uma avaliação cuidadosa dos riscos jurídicos associados à transação, bem como a consideração de um possível diálogo com a família Maia para resolver a disputa de forma amigável e legalmente sólida.
Enfim, é hora de deixar narrativas de lado e encarar os fatos.