O Movimento Social de Ribeirinhos do Pará, Regiões do Alto e Baixo Rio Tocantins reuniu centenas de entidades organizadas, durante o 1º Fórum dos Ribeirinhos do Pará, para debater os problemas que afetam diretamente a comunidade e reivindicar uma série de melhorias para a população impactada por grandes projetos no estado.
Eles pediram providências para compensar a população expropriada pela Hidrelétrica de Tucuruí, os impactados pela hidrovia Araguaia-Tocantins e a mitigação e compensação pela construção do Porto da Cargil e do Porto da Vila do Conde e pelos danos sociais, ambientais e econômicos de todos os acidentes e desastres ambientais ocorridos no Distrito Industrial e portuário de Barcarena.
Na primeira etapa, a Expedição em Busca dos Direitos dos Ribeirinhos reuniu com lideranças e entidades nos municípios de Marabá, Itupiranga, Ipixuna, Jacundá, Novo Repartimento, Goianésia, Breu Branco e Tucuruí, que puderam ter voz na pauta de reivindicações, considerando que as populações não foram ouvidas no processo de liberação das obras da hidrovia Araguaia-Tocantins.
Ao final do encontro foi lançado um manifesto, em que destacam a “ameaça dos impactos socioeconômicos e ambientais em curso, devido a implantação da hidrovia Araguaia–Tocantins e do derrocamento do Pedral do Lourenço”, e prometem união para “salvar a população que vive à margem do Rio Tocantins e lutar contra os danos causados pela Hidrelétrica de Tucuruí, e pela hidrovia”.
Eles querem que sejam realizadas audiências públicas, incluindo todas as comunidades que fazem parte do Rio Tocantins e seus afluentes e que elas sejam reconhecidas como impactados. Ao mesmo tempo em que sejam discutidas as indenizações referentes aos impactos do derrocamento do Pedral do Lourenço, como a melhoria das infraestruturas das localidades, formação educacional dos ribeirinhos, assim como acesso às novas tecnologias, com financiamentos para o desenvolvimento regional.
Também pedem políticas públicas nas áreas da saúde, economia, educação, habitação, regularização fundiária, com alternativas econômicas que possam ser implantadas nas comunidades, como os tanques de piscicultura, agroindústrias para processamento de açaí e de outras frutas nativas, como castanha do pará, bacuri, cupuaçu, babaçu, tucumã, murumuru, pracaxi e outras.
A enganação da Eletronorte
Os ribeirinhos alertaram que “não vão aceitar que aconteça o mesmo o que aconteceu com a barragem de Tucuruí, em que a Eletronorte prometeu fundos e mundos para as populações ribeirinhas, mas não cumpriu nada, mentiu, enganou as populações ribeirinhas e ainda está matando o rio”.
“O nosso povo perece por falta de conhecimento. Nossos pais, pessoas humildes, sem formação acadêmica e sem a malícia das negociatas, acreditaram ingenuamente nas palavras das autoridades. Alguns assinaram documentos respaldando ações que foram prometidas contrapartidas sociais, econômicas e ambientais, pensavam que essas pessoas tinham comprometimento e responsabilidade com eles, mas foram enganados”, pontua o manifesto.
“Sempre o discurso do desenvolvimento promete sonhos e mundos, milhões e milhões de recursos para as populações do Tocantins, mas o que vemos é apenas pobreza, falta de infraestrutura, aumento nas taxas de desemprego, baixa produtividade por falta de financiamentos e acesso a créditos, tecnologias, além da indisponibilidade de serviços de saúde e educação, altas taxas de mortalidade e elevadas taxas de analfabetismo e principalmente, os danos ambientais que fazem contaminar o rio e seus afluentes, desaparecer diversas espécies de peixes, pássaros, quelônios, animais silvestres”, ressalta o documento.
O projeto da hidrovia
O projeto de derrocamento e dragagem da via navegável no rio Tocantins integra o projeto da hidrovia do Araguaia-Tocantins, que faz parte de estudos estratégicos, como o Plano Hidroviário Estratégico – PHE (Ministério dos Transportes, 2014) e o Plano Nacional de de Integração Hidroviária – PNIH (ANTAQ, 2013).
A importância da hidrovia é justificada pela sua extensão e posição geográfica, que permite o escoamento da produção de grãos e minérios, e também da existência de longos trechos navegáveis, que poderão ser conectados com a conclusão de eclusas em alguns barramentos e obras em alguns obstáculos naturais, como nas regiões de pedrais futuramente, com novas intervenções.
De acordo com o PNIH, os cinco grupos mais importantes de produtos e cargas transportados atualmente pela hidrovia serão: minério de ferro, soja em grão, carga geral, óleo de soja e derivados e carvão mineral. A estimativa é que a hidrovia transporte 27% do volume dessas cargas, podendo chegar a 36% em 2030, totalizando 30 milhões de toneladas por ano.
As projeções apresentadas no PHE são ainda mais relevantes. Estima-se que, em 2031, o volume anual de cargas transportadas pela hidrovia, no trecho entre Marabá e Vila do Conde chegue a 32,5 milhões de toneladas, sendo que os principais produtos são representados por aço, minério, carvão, além de cargas agrícolas, como soja, farelo de soja e milho.
Localmente, a ampliação da via navegável também possui potencial de dinamização da produção rural dos municípios que margeiam o rio Tocantins, possibilitando o escoamento desses produtos.
Temores dos ribeirinhos
Com a obra da hidrovia, porém, segundo os manifestantes, o ribeirinho não poderá mais colocar suas redes de pesca e andar de canoa nos rios. O rio vai ficar poluído de óleo diesel e pelos rejeitos das embarcações. No derrocamento do Pedral do Lourenço serão utilizadas bombas de dinamite que vão contaminar de pólvora e enxofre, e outros elementos químicos danosos, além da explosão que vai matar peixes e danificar os berçários.
Conforme o manifesto, a dragagem vai expelir gases e deixar a água ácida. No relatório do Ibama, em tese, a população vai ficar três anos sem poder usar a água do rio, por isso eles querem buscar alternativas econômicas sustentáveis, como por exemplo, o uso e a fabricação de produtos com ervas medicinais, aromáticas, condimentares, azeites e chás especiais da Amazônia, colocando os ribeirinhos como promotores do desenvolvimento local articulado com políticas públicas, visando ampliar o acesso aos mercados nacional e internacional.
As principais pautas dos ribeirinhos são as seguintes:
1 – Que sejam incluídos todos os municípios e comunidades às margens do rio Tocantins e seus afluentes, como áreas impactadas pela hidrovia Araguaia-Tocantins;
2- Que sejam indenizados, (individualmente e mais uma pensão vitalícia de três salários mínimos a todos os impactados), por possíveis danos ambientais, sociais e econômicos causados por consequência da construção e operação da Hidrovia Araguaia Tocantins;
3 – Que seja formado um comitê gestor com 50 % de seus membros da sociedade civil, incluindo ribeirinhos, pescadores, extrativistas, quilombolas e indígenas para que de forma paritária possam participar e propor projetos de interesses das comunidades impactadas. Além de gerenciar a aplicação dos recursos financeiros destinados para a mitigação e compensações pelos danos ambientais e sociais causados por consequência da construção e operação da hidrovia, sob a fiscalizados do MPF E MPPA;
4 – Que seja realizada a regularização fundiária de todas os ribeirinhos, pescadores, extrativistas e quilombolas nas Regiões do Alto e Baixo Rio Tocantins;
5 – Construção de muros de arrimo ou de proteção em áreas afetas pela erosão da maré onde moram os ribeirinhos, pescadores, extrativistas, quilombolas e indígenas impactados pela cheia que acontece nos municípios às margens do rio Tocantins;
6 – Que seja considerado o decreto presidencial 6.040 de 07 de fevereiro de 2007;
7 – Que seja considerada a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT;
8 – Que sejam disponíveis programas de crédito e linhas de financiamento pelo Banco da Amazônia, Banco do Estado do Pará, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal para atender os ribeirinhos, pescadores, extrativistas, quilombolas e indígenas;
9 – Que as condicionantes sejam aplicadas em projetos geradores de trabalho e renda na produção agrícola e pesqueira, segurança alimentar e nutricional, água própria para o consumo humano, energia fotovoltaica e outros, para as comunidades e seus moradores.
Veja o manifesto na íntegra: