As prefeituras de Muaná, Marituba, Abaetetuba, Santa Isabel e São Sebastião da Boa Vista estão no esquema, que o MPF define como “organização criminosa”. Matéria atualizada com resposta de duas empresas citadas, em notas abaixo
O Ministério Público Federal MPF) abriu investigação para apurar denúncia de um esquema de corrupção montado para desviar dinheiro público das prefeituras de Muaná, Abaetetuba, Marituba, Santa Izabel do Pará e São Sebastião da Boa Vista, através de fraudes em licitação para compra de medicamentos.
De acordo com o procedimento investigatório, ao qual o Ver-o-Fato teve acesso, as empresas Paramed Distribuidora de Medicamentos, Distriben Distribuidora de Produtos Farmacêuticos e Hospitalares Ltda e R S Lobato Neto Eireli teriam montado um esquema em conluio com as prefeituras citadas para desviar milhões de reais, superfaturando os preços dos medicamentos.
Segundo a denúncia, o esquema criminoso foi descoberto durante a adesão dos municípios de Abaetetuba, Marituba, Santa Izabel do Pará e São Sebastião da Boa Vista à Ata de Registro de Preços nº 003/2021, oriunda do processo licitatório pregão eletrônico 011/2020, do município de Muaná, no arquipélago do Marajó.
Conforme o MPF, as adesões extrapolaram em muito o permitido por lei, provocando uma grande irregularidade e colocando em questionamento a legalidade do procedimento realizado. “Diversos medicamentos tiveram seus quantitativos excedidos na adesões que foram celebradas com outros municípios, ultrapassando em muito os estabelecidos na referida ata”, aponta a denúncia.
As quantidades utilizadas nestas adesões superam inclusive as demandas do próprio município de Muaná e quando juntadas não restaram dúvidas de que ocorreram ilegalidades e arranjos para beneficiar as três empresas detentoras dos preços registrados, prossegue a denúncia.
Preços combinados
Diz ainda a denúncia que as três empresas parecem ter combinado usar um teto de valores para as adesões, que ficou em R$ 9,5 milhões, utilizando os quantitativos registrados sempre acima do regulamentado pela lei e pelos órgãos fiscalizadores.
Além do mais, segue a denúncia, os preços fixados na Ata de Registro 003/2021 de Muaná são classificados como superfaturados para a data das adesões, quando comparados com os preços praticados em outros pregões para a aquisição de medicamentos, que foram realizados por outros municípios paraenses na época.
Relatório feito em cima dos levantamentos técnicos classifica os preços como absurdos, com o intuito de provocar dano ao erário, desviar dinheiro público.
Os preços praticados pela Distriben, por exemplo, quando comparados aos de outras licitações na mesma época apresentam superfaturamento de R$ 367.419.00, resultando em prejuízo e dano ao erário.
Já os preços praticados pela Paramed, quando comparados a outros na mesma época, apresentam superfaturamento de R$ 227.074,00, também resultando em prejuízo aos cofres públicos.
E os preços da R S Lobato não ficam atrás, ao contrário, chegam ao valor superfaturado de R$ 749.661,40, resultando em prejuízo e dano absurdo ao erário.
No total, os valores superfaturados pelas três empresas, ainda conforme a denúncia, chegam a R$ 1.344.154,40, dano que atingiu diretamente o município de Muaná, um dos mais pobres do Marajó.
A adesão de Marituba à maracutaia
Para o MPF, um fato muito suspeito e estranho foi que municípios como Marituba e Santa Izabel do Pará, distantes cerca de 108 km e 121 km, respectivamente, optaram por aderir a esta ata de Muaná, tão distante, enquanto que cidades grandes e próximas, como Belém e Ananindeua possuíam atas com preços mais compatíveis com as necessidades de fornecimento que tais municípios precisassem.
Uma das provas juntadas à denúncia é o consumo da Prefeitura de Muaná em 2020, onde foi apresentada uma dispensa de medicamentos para o consumo de um ano e as quantidades são infinitamente menores do que as que foram licitadas no pregão que gerou a ata 003/2021. Curiosamente, a maior contemplada na época foi a empresa Paramed.
Fazendo as comparações, segundo a denúncia, não restam duvidas de que a referida ata 003/2021 foi de fato produzida para servir de suporte para adesões fraudulentas e com preços elevados para outros municípios envolvidos no esquema.
Organização criminosa
Pela denuncia, “fica muito explícito que existe uma organização criminosa, que arquiteta os processos licitatórios e mediante um esquema muito bem delineado, consegue resultados expressivos, dando movimentação e volume às empresas envolvidas em tais práticas delituosas”.
Outro fato que aumenta a suspeita de conluio é que as três empresas envolvidas no esquema criminoso sempre tiveram os seus pagamentos priorizados pelas Prefeituras de Abaetetuba, Marituba, Santa Izabel do Pará e São Sebastião da Boa Vista em relação aos demais fornecedores de cada fundo municipal de saúde, demonstrando uma preferência e favorecimento a elas.
O Ver-o-Fato tenta contato com os envolvidos na investigação para que cada um deles se manifeste. O espaço está aberto ao contraditório e à defesa.
Atualização às 18h47
Com a palavra, a empresa Distriben
A respeito da reportagem, a empresa Distriben – Distribuidora de Produtos Farmacêuticos e Hospitalares -, por meio do escritório de advocacia Almeida Lima & Lima, enviou nota, contraditando as informações contidas na investigação do MPF. Eis a nota:
” DISTRIBEN – DISTRIBUIDORA DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS E HOSPITALARES – EIRELI, neste ato representada por seu advogado, vem apresentar o contraditório sob a luz do artigo 5º da Constituição Federal quanto aos fatos noticiados na reportagem de 10/10/2023 no sítio eletrônico “ver o fato” (https://ver-o-fato.com.br/exclusivo-fraudes-em-licitacoes-da-
saude-envolvem-3-empresas-e-5-prefeituras-do-para/).
Ciente da liberdade de imprensa e do direito de informar, a Distriben informa que ainda não foi oficialmente citada no processo mencionado na reportagem, de modo que se manifestará sobre as alegações do Ministério Público no momento oportuno.
Em tempo, informa que não coaduna com qualquer prática ilícita descrita na reportagem e que todos os certames que participou e participa atendem aos rigorosos critérios da lei e aos princípios da Administração Pública.
Agradecendo o direito de resposta, é o que tem a relatar no momento.
Belém-PA, 10 de outubro de 2023.
EMERSON ALMEIDA LIMA
OAB/PA 18.608 “
Com a palavra, a empresa ARS Lobato Neto Ltda
Defendida pela Sociedade de Advogados Ramos & Valadão, a empresa enviou a seguinte “Nota à Imprensa”, sobre os fatos descritos na reportagem:
“A R S Lobato Neto LTDA repudia veementemente as acusações veiculadas na reportagem publicada pelo jornalista Paulo Jordão no portal de notícias online “ver-o-fato” em 10/10/2023. A empresa reitera seu compromisso com a ética,
transparência e legalidade em todas as suas atividades.
Todos os contratos e processos administrativos nos quais a R S Lobato Neto LTDA celebrou com a Administração Pública, foram conduzidos de maneira íntegra e rigorosamente dentro dos parâmetros legais. A empresa zela pela lisura em suas operações e está disposta a colaborar plenamente com as autoridades para esclarecer qualquer dúvida que possa surgir.
É importante esclarecer à população em geral sobre o funcionamento de uma Ata de Registro de Preços. Trata-se de um instrumento utilizado pela administração pública para aquisição de bens e serviços de forma mais eficiente. Nesse contexto, a administração não está obrigada a adquirir a totalidade dos itens registrados na ata, o que confere flexibilidade e adequação às reais necessidades do órgão.
Além disso, a adesão de outras empresas à mesma ata é uma prática comum e legal, evitando a necessidade de novos processos licitatórios. Essa medida visa trazer economia e agilidade para os órgãos públicos, permitindo que as demandas sejam atendidas de forma mais rápida e eficaz.
A empresa R S Lobato Neto LTDA esclarece que desconhece de qualquer procedimento investigatório instaurado pelo MPF com intuito de investigar ou questionar a lisura e idoneidade do Pregão Eletrônico 011/2020 promovido pela Prefeitura Municipal de Muaná, que resultou na Ata de Registro de Preços 003/2021.
Até onde foi possível apurar, consta tão somente perante o MPF uma notícia de fato realizada por opositores e concorrentes que se utilizam deste expediente com viés político, alarmista, revanchista e propagandista, o que repudiamos veementemente.
A R S Lobato Neto LTDA reforça seu comprometimento com a verdade e está confiante na a total regularidade de suas operações. A empresa permanece à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos necessários à sociedade e às
autoridades competentes.
Belém, terra das mangueiras, 10 de outubro de 2023.
William Ramos
advogados da empresa R S Lobato Neto LTDA “