Regina Casé fez sucesso ao interpretar dona Lurdes em “Amor de Mãe”, que foi ao ar na Globo entre 2019 e 2020. Agora Manuela Dias, autora da novela, dá novos rumos à personagem.
Publicado pela editora Melhoramentos, “Diário da Dona Lurdes” acaba de chegar às livrarias. Spin-off de “Amor de Mãe”, na obra Manuela constrói o dia a dia de dona Lurdes após todos os seus filhos partirem de casa, numa história sobre solidão e formas de reinventar a vida. A narrativa, que se passa entre abril e julho de 2022, desdobra-se principalmente por meio de registros da personagem em seu diário, como o título entrega.
“Dona Lurdes é a minha mãe, é a sua mãe, a vizinha, a babá, a doméstica, a professora, a motorista, a costureira, a cozinheira… Existem muitas donas Lurdes pelo Brasil. Mulheres guerreiras e amorosas às quais devemos não só as nossas vidas, mas a criação de um povo. São elas que dão vida, amamentam, alimentam, educam, vestem, ensinam as crianças a falar, andar e sonhar. São elas que cuidam, madrugada após madrugada, de gerações e gerações de brasileiros. Mulheres desamparadas pelo Estado e pela sociedade que abrem mão de suas ambições individuais para se dedicarem integralmente ao projeto de ser mãe”, registra Manuela na nota que precede o texto principal da obra.
Veja alguns trechos do livro:
O diário
“Vou começar um diário porque a mulher foi na Ana Maria Braga ontem e disse que escrever é bom para aliviar a angústia. E eu estou com um aperto danado aqui no meu peito que não passa. Ryan disse que ia ligar e não ligou.
Filho é só preocupação.
Filho é só preocupação.
Filho é só preocupação.
A mulher que foi na televisão disse que é para gente sair escrevendo tudo que vier na nossa cabeça e no nosso coração. Ela disse que não importa se escrever errado. Disse até que não existe errado”.
Filho pro mundo
“Esse negócio que a gente cria filho pro mundo, sei não. Será? Acho que eu gostava mais quando meus meninos moravam tudo aqui comigo. Essa casa tá um vazio que só Nossa Senhora mesmo! Tá parecendo até que eu tô numa tumba.
Credo! Não acredito que eu escrevi isso! Será que traz mau agouro escrever coisa ruim? Vou parar!”.
Briga com Deus
“Oi, ontem não deu pra escrever não, que eu estava ocupada demais brigando com Deus e seu mundo! Briguei com Ryan porque não deu notícia. Briguei com Érika que não quer dar antibiótico pro meu neto. Ela diz que deixar o menino doente fortalece o sistema imunológico. Agora, veja: o pobre do Pedrinho já é obrigado a morar num diacho de um bote, embarcado feito um marinheiro desde o dia que nasceu! Sendo que Davi e Érika ancoram aquele barco até perto de negócio de petróleo em chamas!
A vida do pobre do menino é de manifestação em manifestação? Quase que a primeira palavra que meu neto fala é ‘protesto’ em vez de ‘mamãe’. Vai vendo! Mas é o bendito do antibiótico que vai fazer mal… Tem cabimento?”
Outros sonhos para as mulheres
“Estou aqui tentando me lembrar do que eu queria fazer antes de meus filhos nascerem, mas eu só consigo me lembrar que eu queria ter filhos! Credo.
Deviam ensinar outros sonhos pras mulheres.
Hoje em dia, essa coisa de ser mulher está muito avançada! As meninas nascem já sabendo que têm que ser independentes, cuidar da própria vida, ter seu dinheiro. Eu mesma sempre ensinei isso pras minhas filhas.
Não estou dizendo que resolveu, mas melhorou muito. As mulheres, aliás, melhoraram muito! Agora só falta os rapazes acompanharem, né?”
Reunir a família
“Ontem foi um cansaço que só a bênção! Mas eu estava com saudade, assim, de reunir a família, de ouvir aquele conversê no quintal, todo mundo falando alto, Ryan afinando o diabo do violão por horas, Brenda naquela bênção daquele celular! Ave Maria! Eu tinha me esquecido como adolescente é chato! Ô idadezinha insuportável! Se bem que eu estou sendo má, porque a bichinha lavou toda a louça no maior bom humor.
Acho que eu tô é cansada ainda de ontem… E eu também fiquei nervosa porque Magno e Ryan iam conhecer Evandro. A verdade é que eu estou gostando de Evandro, então queria que fosse tudo bem”.
Cruzeiro do Roberto Carlos
“Lídia só faz ficar mais rica! Toda hora essa mulher herda uma fazenda, herda um prédio, uma empresa, uma fábrica! É uma loucura a quantidade de dinheiro que a família dessa mulher tem. Camila diz que vem tudo do tempo da escravidão, mas aí fica difícil de averiguar? Eu só sei que Lídia não se aporrinha com nada não. Nada com Lídia vira preocupação, vira tudo dinheiro. É tanta empresa, que ela tem uma empresa pra cuidar das outras empresas. Magno disse que eles têm um prédio no centro da cidade que é só o escritório da família, compreende? Imagine isso, um prédio! A verdade é que quem é pobre não sabe nem o que é ser rico. Mas eu gosto daquela doida. Lídia fica na dela, curtindo a vida, mas ela fica de olho, que de boba ela não tem nada. E, no final do mês, ela só vê o dinheiro entrando. E os presentes que a doida me dá? Eu fico apavorada de ser assaltada só de ter um colar de água-marinha em casa. Eu já quase que vendi, que eu queria ir no cruzeiro do Roberto Carlos. Mas agora decidi que eu vou guardar. Quando Brenda entrar na faculdade, dou pra ela”.
Fonte: Splash UOL
