Caso aconteceu há 30 anos, e as famílias das vítimas querem reabrir o caso
A cidade de Belém volta a ser cenário de uma tragédia que repercute além das fronteiras do Brasil, trazendo vergonha ao estado. A jornalista Mônica Bergamo, da Folha de São Paulo, revelou em sua coluna de hoje que a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) deve analisar, em 2025, o caso conhecido como a “Chacina do Tapanã”. O episódio remonta a 1994 – ou seja, há 30 anos -, quando três adolescentes — Max Cley Mendes, Mariciley Mendes e Luís Fábio Silva — foram brutalmente assassinados durante uma operação policial.
As mortes teriam sido motivadas por vingança pelo assassinato de um agente, configurando um grave desvio de conduta. Como todos foram absolvidos, o Estado do Pará será o reú na corte internacional.
O caso, que já foi analisado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e agora está nas mãos da Corte IDH, aponta para uma série de violações de direitos humanos. De acordo com Bergamo, há “alta probabilidade de realização de uma audiência pública” ainda este ano. A decisão de levar o caso à instância internacional é resultado de uma longa luta de organizações como a Sociedade Paraense de Defesa de Direitos Humanos, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente e o Movimento Nacional de Direitos Humanos.
A exposição internacional do caso reforça o fracasso do Brasil em garantir justiça e proteção às vítimas de violência estatal. É especialmente constrangedor que Belém, capital de um estado rico em cultura e história, seja lembrada por episódios de tamanha brutalidade.
Violência sem punição
O caso é cercado de controvérsias. Segundo informações, os três adolescentes sofreram ameaças e agressões antes de serem mortos. As mortes foram inicialmente justificadas como “baixas em confronto”, registradas sob o polêmico termo “autos de resistência”. Contudo, há fortes indícios de que os jovens foram executados de forma deliberada.
Em 2018, os 21 policiais acusados foram absolvidos pela Justiça do Pará, decisão que gerou indignação entre ativistas e familiares das vítimas. A sensação de impunidade levou o caso às instâncias internacionais, expondo a incapacidade do sistema judicial brasileiro de lidar com crimes cometidos por agentes do Estado.
Pedido de justiça e reparação
Os representantes das vítimas alegam que o Brasil violou direitos fundamentais e exigem reparação às famílias, assistência psicológica e em saúde para os parentes, além da reabertura das investigações. Uma das demandas centrais é o fim do registro automático de mortes por policiais como “autos de resistência”, prática que há décadas é denunciada por mascarar execuções extrajudiciais.
Reflexões para o futuro
O caso da Chacina do Tapanã evidencia um problema estrutural no Brasil: a violência policial, frequentemente direcionada às populações mais vulneráveis, e a impunidade que a acompanha. O fato de o Pará estar no centro dessa denúncia internacional deveria acender um alerta para as autoridades locais e nacionais.
Que a análise da Corte Interamericana de Direitos Humanos traga a visibilidade necessária para que tragédias como essa não sejam esquecidas, mas também que sirvam como um marco para mudanças profundas na forma como o Brasil encara a violência policial e a proteção dos direitos humanos.
ABSOLVIDOS, SAIBA COMO
No dia 6 de agosto de 2018, o policial militar e os três ex-PMs acusados de participação na chacina ocorrida em 1994 foram absolvidos pelo júri do Fórum Criminal de Belém. Essa foi a primeira etapa do julgamento, que depois levou ao banco dos réus outros 13 militares, todos também absolvidos.
Os militares foram acusados de executar Max Cley Mendes, Marciley Rosenal Melo Mendes e Luiz Fábio Coutinho da Silva. Segundo a denúncia do Ministério Público, os jovens foram presos na rodovia do Tapanã, colocados nas viaturas dos policiais e posteriormente executados.
As vítimas teriam roubado a arma e assassinado (crime de latrocínio) o cabo da PM Waldemar Paz Nunes. Na época, 16 dos envolvidos estavam sob o comando do policial Neil Duarte de Sousa, atual deputado estadual.
Presidiu a sessão de júri o juiz Cláudio Henrique Rendeiro, da 4ª Vara, que em 2020 faleceu vitimado pela Covid-19. Os réus absolvidos foram Silvio Carlos Saldanha dos Santos, policial militar na ativa; Miguel Antônio Quaresma Lemos, Adalberto Costa Monteiro e João Rodrigues Monteiro, ambos policiais da reserva. (Do Ver-o-Fato, com informações da Folha de São Paulo)
IMAGENS DA ÉPOCA: SBT/PARÁ