A combinação das isenções com a destinação de 80% da produção de minério do território paraense para a exportação gera contribuição média de 8% e máxima de 15% pelas empresas.
Doutora em Desenvolvimento Sustentável, a professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Maria Amélia Enriquez apresentou estudo inédito em que estima em 8% a a contribuição média das empresas minerárias instaladas no Pará e em 15% a máxima. Os cálculos fazem parte de estudo lançado no segundo dia do Seminário Internacional Justiça Fiscal Desigualdade e Desenvolvimento.
O percentual confronta a estimativa utilizada amplamente pelo Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) para criticar a carga tributária brasileira.A entidade fala em 38% e difunde a ideia de que as empresas mineradoras pagam impostos demais.
No entanto, no livro “Estudos da Mineração no Pará” produzido pelo Sindifisco, Maria Amélia questiona esse percentual. “O IBRAM fala que a carga tributária do Brasil é a maior. Pega carga nominal, a gente vê que não é verdade isso”, sustenta.
A professora observa que o IBRAM não apresenta os dados efetivos do recolhimento fiscal pelas empresas que permitiriam conferir a fórmula de cálculo e os números exatos da contribuição. A falta de transparência é um dos problemas para que a sociedade possa conferir a informação.
Para fazer a estimativa, a equipe coordenada pela professora cruzou dados financeiros disponíveis em relatórios da Vale. Por estar na Amazônia, a empresa e as demais mineradoras que atuam no território paraense pagam menos Imposto de Renda e não depositam PIS/Cofins. Também estão livres do ICMS porque exportam produtos primários.
“Considerando que parte considerável do minério vem da Amazônia, onde temos redução de IR (por ser área de influência da Sudam) e não se paga PIS/Cofins e ICMS, já temos carga mínima. Como 80% da produção é voltada pro mercado externo, então, na verdade, a base tributária é muito menor do que o falado. O máximo que poderia ser, sendo muito otimista, é 15,8%”, explicou.
Maria Amélia também comparou o percentual sugerido com a estimativa de pagamento tributário da Vale feita às três esferas públicas, a partir de relatórios financeiros da empresa. A estimativa é que a média ficaria em 8%, considerando variação entre o menor percentual, de 3%, e o máximo, de 16%, entre 2015 a 2019.
“Então, nosso cálculo não fica diferente daquilo que é de verdade. Essa ideia de que o setor é altamente tributado, é uma falácia que precisa ser desconstruída”, defendeu.
Fórmula atual desestimula a industrialização em todo o Brasil
A professora observa que somente os que comercializam no mercado interno teriam carga elevada, mas no Pará, essas empresas somam apenas 20%. A combinação entre a isenção das exportações com a cobrança elevada para a comercialização interna é apontada, inclusive, como desestímulo à industrialização.
“Se você é um empresário da mineração e vai vender pro mercado externo, aqui na Amazônia, você não paga ICMS, PIS/Cofins e IR. Por que vou agregar valor aqui? Vou vender pro mercado interno? Não vou. Porque vou fazer bateria de cobre no Pará se é mais barato eu vender o concentrado de cobre que não pago nada e não tenho problema como folha?”, analisa.
Modelo tributário não é único e precisa considerar as especificidades
A professora da UFPA fez um panorama dos modelos tributários de outros países e concluiu que não há um modelo único a ser seguido por causa das especificidades de cada local. Ela defende, no entanto, que o modelo brasileiro precisa ser revisto e o Pará pode protagonizar a mudança.
“No pós-pandemia, temos que pensar nesse modelo que não está atrapalhando só o território regional. Está dando tiro no pé da industrialização do país. E acho que Pará pode ser o protagonista nacional da mudança, colocando o dedo na ferida, mostrando para o país o que precisa ser feito em termos de tributação”, avalia.
Um dos primeiros passos a trilhar, na visão da professora, é garantir o acesso às informações sobre a carga tributária efetiva e nominal do setor mineral. Outro é “desconstruir o mantra que fala que o imposto sobre bens minerais não se exporta”.
Maria Amélia adverte que o bem mineral é único, vai acabar e a sua exploração precisa ser convertida na promoção do desenvolvimento, a exemplo do que fizeram outros países, seja da Europa, América Latina ou África.
Ela citou a experiência da Indonésia, que proibiu a venda de produtos básicos pra tentar forçar a industrialização, e estabeleceu royalties de 10%. A África do sul tem modelo considerado interessante por tornar a população negra acionista das multinacionais e criar um mecanismo para que as comunidades fossem acionistas.
“Quando olhamos o Canadá e a Noruega, que estão no topo do desenvolvimento humano, eles tributaram fortemente os seus recursos naturais para financiar o estado de bem-estar social e hoje estão no outro patamar de desenvolvimento. Se a gente não retirar desse recurso que é o mais forte da nossa economia, de onde a gente vai tirar?”, ponderou.