O procurador da República, Felipe de Moura Palha e Silva, enviou ofício ao prefeito de Barcarena, Paulo Sérgio Alcântara, pedindo que, no prazo de cinco dias úteis, a prefeitura informe ao Ministério Público federal quais as obras e atividades que estão sendo realizadas ou foram concluídas nos últimos 60 dias, dentro das áreas onde estão situadas as comunidades quilombolas Sítio Conceição, Sitio São João e Gibrié de São Lourenço.
De acordo com o ofício, “embora a Prefeitura de Barcarena tenha ciência do compromisso assumido, continua chegando ao MPF denúncias das três comunidades quilombolas, de que sem consultá-los, sem informa-los, sem a anuência dos comunitários, a prefeitura continua construindo edificações dentro da poligonal das referidas comunidades, violando os direitos das comunidades e descumprindo o compromisso assumido com o MPF”.
O procurador lembrou os encaminhamentos que já foram firmados em reunião com representantes da Prefeitura de Barcarena, que tratou sobre o Projeto de Regularização Fundiária (Reurb) e o compromisso assumido pelo município de acatar recomendação do MPF, que determinou ao prefeito que não realize intervenções que possam violar os direitos territoriais das comunidades quilombolas e tradicionais existentes no município.
Felipe Moura Palha anexou no ofício, datado do último dia 7, a Informação Técnica nº/F-4/INCRA- SR-01/202, que discrimina as poligonais das comunidades que tiveram suas terras invadidas.
As denúncias dos quilombos Sítio da Conceição Sitio São João e Gibrié de São Lourenço foram publicadas com exclusividade pelo Ver-o-Fato. De acordo com as comunidades, o prefeito de Barcarena, Paulo Sérgio Alcântara, mandou construir um muro em uma área que foi delimitada e demarcada como território quilombola pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra), impedindo qualquer acesso ao rio Murucupi, destruindo plantações e derrubando castanheiras.
O líder do quilombo Sítio Conceição, José Roberto Cravo, gravou e enviou ao Ver-o-Fato um vídeo mostrando a construção de uma obra da prefeitura local, que ironicamente se trata de uma área de proteção ambiental, em que o muro impede a passagem dos comunitários, dentro de seu próprio território.
Nas imagens, fica claro a prática de crime ambiental, com o esgoto sendo despejado diretamente no rio Murucupi, sem nenhum tratamento.
Roberto Cravo registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia de Barcarena, denunciando a obra irregular em área quilombola, mas a prefeitura continuou com a construção, mesmo rendo sido advertida pelo Ministério Público Federal e pelo Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) de que o território foi demarcado e espera a titulação definitiva.
A prefeitura de Barcarena, por sua vez, afirma que o muro foi construído com autorização da justiça, em local onde será implantado o parque natural da cidade, em área de preservação ambiental.
Outra denúncia dos quilombolas foi sobre a morte do Rio Murucupi, em Barcarena, que vem sendo contaminado há décadas por rejeitos de minérios e esgoto sem tratamento dos grandes projetos industriais e dos bairros instalados em Vila do Conde, e o envenenamento das comunidades quilombolas que vivem no entorno e dependem do rio para tirarem sua subsistência.
À beira do desespero, com forte sensação de impotência, por se sentirem abandonados pelo poder público e pelos órgãos que deveriam protege-los, os quilombolas falaram de suas angústias e de seu sofrimento por insistirem em ficar em suas terras. Afirmam que estão morrendo aos poucos e não vislumbram um futuro para filhos e netos, porque o rio está morto. Denunciam até ameaças de morte por continuarem lutando pela permanência na região.
O pescador Raimundo, do Quilombo Gibrié do São Lourenço, afirmou que o rio acabou e quem dependia dele agora fica chupando o dedo. “Não dá mais para pescar, porque não tem peixe que preste, nem dá para pegar camarão ao menos, porque a água está completamente poluída e fede. A água não serve nem para lavar os pés e as mãos e quem tomar banho no rio se enche de coceira e micose”, lamenta.
O quilombola Mário Santos denunciou o crime ambiental praticado há anos, com o lançamento de rejeitos de minérios e esgoto no Rio Murucupi, inicialmente pela implantação do projeto Albrás Alunorte e depois continuou com a Prefeitura de Barcarena, que recebeu o esgoto da indústria para fazer o tratamento, mas não tomou nenhuma providência.
Mário Santos gravou um depoimento ao lado de uma grande tubulação que despeja esgoto sem tratamento no Rio Murucupi, bem no meio de uma vegetação que insiste em resistir. Mas ele alertou que a poluição está matando a vegetação e também aos moradores. E lembrou que o camarão e o peixe que se consegue pescar no Rio Murucupi tem cheiro e gosto de esgoto.
Veja aqui o ofício do MPF à prefeitura: https://drive.google.com/file/d/1t5H_Bl9tvNG2EbJKFpLVnfznCVtCBvFN/view?usp=sharing
Discussion about this post