O cinema brasileiro caminha para fazer de 2024 um ano memorável, tanto pelo aumento do público quanto pelo reconhecimento em premiações internacionais. Desde a chamada “retomada” nos anos 1990, quando o Brasil voltou a figurar com destaque nas telas, o cinema nacional não via números tão promissores em termos de bilheteria e audiência. Até o dia 11 de setembro, mais de 7,4 milhões de pessoas assistiram a filmes brasileiros nos cinemas, gerando uma receita de R$ 142 milhões – os melhores resultados desde 2020.
O filme Os Farofeiros 2, que levou 1,8 milhão de pessoas às salas de cinema, é um dos principais destaques do ano. Contudo, o sucesso de público das produções brasileiras ainda é tímido em comparação ao domínio das produções internacionais. O filme mais assistido de 2024 no Brasil, Divertida Mente 2, atraiu quase 12 vezes mais espectadores que o principal longa brasileiro.
Apesar desse cenário, o fato de 2024 ter superado um longo jejum – desde 2019, nenhuma produção nacional havia ultrapassado a marca de 1 milhão de espectadores – revela uma retomada promissora. Parte desse ressurgimento está relacionado à volta da Lei de Cotas de Tela, que voltou a vigorar em julho e determina um número mínimo de exibições de filmes nacionais nos cinemas. A expectativa é que os impactos da lei sejam mais visíveis a partir de 2025, equilibrando a quantidade de estreias brasileiras com as produções estrangeiras.
Discrepância entre oferta e demanda
Mesmo com o impulso da nova legislação, as produções internacionais continuam a dominar o mercado cinematográfico no Brasil. Dos 567 filmes que estrearam até setembro, 355 foram internacionais, enquanto apenas 212 eram brasileiros. Mais preocupante ainda é a disparidade na escolha do público: apenas 8,4% dos espectadores optaram por assistir a produções nacionais, enquanto 91,6% preferiram filmes estrangeiros, segundo o Sistema de Controle de Bilheteria (SCB).
Cineastas e especialistas do setor acreditam que o crescimento no público é um primeiro passo, mas ainda distante dos níveis pré-pandemia. Em 2019, mais de 23 milhões de brasileiros foram aos cinemas para assistir a filmes nacionais. A cineasta Cibele Amaral acredita que, além da retomada de políticas como as cotas de tela, é necessário investir em campanhas de marketing mais agressivas e combater a pirataria, que ainda afeta a indústria.
“O público mudou a forma de consumir audiovisual, com muitas pessoas preferindo assistir em casa. Ainda existe uma questão forte de pirataria e pouca fiscalização, o que atrapalha muito. Não voltamos aos números de 2018, 2019, e ainda estamos longe disso”, pondera Amaral.
Reconhecimento internacional e aposta no Oscar
Apesar das dificuldades no mercado interno, o cinema brasileiro segue conquistando espaço em festivais internacionais. O filme Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, ganhou o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Veneza e colocou o Brasil novamente no radar do Oscar, na disputa pelo prêmio de Melhor Filme Estrangeiro, uma façanha que o país não conquista desde Central do Brasil (1999), também dirigido por Salles.
Outros dois longas chamaram atenção em festivais de prestígio: Motel Destino, de Karim Aïnouz, que foi exibido em Cannes, e Baby, de Marcelo Caetano, cujo protagonista, Ricardo Teodoro, ganhou o prêmio de Melhor Ator Revelação na 63ª Semana da Crítica em Cannes. Esses filmes demonstram que, além de uma recuperação em termos de público, o cinema brasileiro continua inovando e cativando a crítica especializada ao redor do mundo.
Com uma mescla de sucesso local e prestígio internacional, 2024 pode ser um divisor de águas para o cinema brasileiro, pavimentando o caminho para uma nova era de expansão, tanto nas telas nacionais quanto no cenário global. A questão agora é: como o Brasil irá sustentar esse impulso e traduzir o sucesso em bilheteria em uma presença mais robusta e sustentável nos próximos anos?