Com o alto custo dos planos de saúde das terapias necessárias para garantir uma melhor qualidade de vida para as crianças, diagnosticadas com doenças como o autismo, famílias lutam também com espera e falta de vagas no SUS e com suspensões e exigências impostas pelos planos de saúde.
Durante a mais recente temporada do reality show “BBB 24”, a participante Fernanda Bande, residente em Niterói (RJ), trouxe à tona uma realidade enfrentada por muitas famílias brasileiras: a busca por tratamento adequado para crianças autistas. A história de Fernanda, cujo filho Marcelo, de 11 anos, é diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista, ressoou entre os telespectadores quando ela expressou o desejo de utilizar o prêmio do programa para proporcionar uma melhor qualidade de vida para sua família, principalmente para o filho.
Apesar de não sair vitoriosa do programa, Fernanda conseguiu iniciar um tratamento de psicomotricidade para Marcelo durante sua participação no “BBB 24”. O emocionante reencontro entre mãe e filho, registrado em vídeo, tocou os corações dos espectadores, destacando a luta diária enfrentada por pais e mães de crianças autistas em busca de cuidados adequados.
No entanto, a jornada de Fernanda não é única. Muitas outras famílias enfrentam uma batalha árdua para garantir que seus filhos tenham acesso a terapias que possam melhorar sua qualidade de vida. No Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado em 2 de abril, pais e mães no Rio de Janeiro foram às ruas protestar contra as dificuldades enfrentadas junto aos planos de saúde.
As queixas são variadas e incluem desde a suspensão de tratamentos até o cancelamento de contratos, passando pela falta de pagamentos para profissionais e clínicas. Além disso, muitos relatam dificuldades para obter reembolsos e recebem terapias sem a devida especialização ou com carga horária inferior à recomendada por laudo médico. A falta de profissionais qualificados para atender às demandas específicas das crianças também é uma preocupação recorrente.
Nas redes sociais, mães como Daiane Gomes e Suellen Verdan compartilham suas experiências e desafios diários. Daiane, mãe de Heitor, desabafa sobre a suspensão do tratamento do filho e a falta de pagamento pelo plano de saúde, enquanto Suellen, mãe de Lucas e Helena, relata os altos custos das terapias e as dificuldades para obter reembolso, destacando que o tratamento é acessível apenas para uma parcela privilegiada da sociedade.
Diante dessas dificuldades, fica evidente a necessidade de políticas públicas mais eficazes e um maior engajamento dos órgãos competentes para garantir que todas as crianças tenham acesso igualitário a tratamentos adequados para suas necessidades específicas. Enquanto isso, famílias como a de Fernanda, Daiane e Suellen continuam sua luta incansável por um futuro melhor para seus filhos autistas.
“As pessoas que olham de foram atribuem toda a demanda excessiva que a família de uma criança com deficiência tem à criança, mas a maior parte dos nossos problemas reais, as coisas que tiram a nossa energia são burocráticas e externas, como você ter que se desgastar por algo que você tem direito e que é negado. Eu tenho pedidos de reembolso de cirurgias e anestesias de emergência que totalizam R$ 8 mil… É crueldade! Dá raiva, cansa, revolta. A Malu teve múltiplas sequelas e diagnósticos, então a qualidade de vida dela depende totalmente das terapias que ela faz. Caso ela fique sem, ela já para de evoluir e isso limita o futuro e as possibilidades de autonomia que ela tem”, destaca.
O tormento no SUS
Se conseguir as terapias especializadas pelo plano de saúde está cada vez mais difícil, para quem depende do SUS, o Sistema Único de Saúde, a situação é ainda mais difícil. Faby Almeida, moradora de Irajá, na Zona Norte do Rio, é mãe de Theo, de 5 anos, autista nível 2, e não tem conseguido atendimento para o menino.
“Hoje, o Theo está sem terapia e tem regredido desde então. Ele fazia pelo SUS, na ABBR, mas infelizmente perdeu o direito de continuar o tratamento lá. Com a renovação do contrato da prefeitura com a clínica, eles tiraram o autismo da listagem de atendimento. Nos deram encaminhamento para o Centro Municipal de Referência da Pessoa com Deficiência Irajá, mas infelizmente eles não têm vaga”, afirma ela, que tem mais de 22 mil seguidores.
Uma coisa em comum entre todas essas mães, além da iniciativa em conscientizar outras pessoas sobre as crianças atípicas, é o fato de que, por causa dos cuidados paliativos que os filhos necessitam, elas precisaram parar de trabalhar. A questão foi tema do Profissão Repórter, que mostrou como muitas brasileiras estão tendo que abrir mão da vida profissional e pessoal para serem cuidadoras.
Em março, um estudo da FGV já havia feito um retrato preocupante da situação da chamada “geração sanduíche”: cada vez mais cidadãos estão tendo que abraçar o desafio de tomar conta dos pais e ainda criar os filhos na mesma casa.
Faby é um exemplo, já que, além de Theo, agora ela está tendo que se dedicar aos cuidados da mãe, que está desenvolvendo Alzheimer. Para conseguir dinheiro, ela tem vivido de bicos. Os posts na rede social, que ela tem há cerca de 3 anos, ela encara como uma “missão”:
“Como meu filho recebeu o diagnóstico ‘precoce’, com 1 ano e 11 meses, decidi criar o perfil para dar a oportunidade para outras mães identificarem cedo também. Assim eu poderia ajudar essas crianças a terem as mesmas oportunidades de desenvolvimento que meu filho iria ter.” Para Daiane, as redes também são importantes para mostrar a realidade das famílias e desconstruir alguns clichês:
“Ainda acho que nos veem com supermães, porém não temos nada de especial. Quero que mais pessoas compreendam a nossa realidade, que sejam mais empáticas com a nossa luta. Tudo na maternidade atípica tem um peso grande.” Sobre a dificuldade crescente das famílias atípicas de acesso aos tratamentos especializados, Renata ressalta a importância deles, não só para os pacientes, mas para as famílias: “A falta de terapia impacta tanto a criança quanto a família, porque tira a esperança, a perspectiva de ver a criança com qualidade de vida melhor”.
Desafios a cada dia
Esses exemplos não são isolados. Milhares de famílias em todo o Brasil enfrentam as mesmas batalhas todos os dias. Elas enfrentam longas filas, esperas intermináveis, adiamentos de exames e a incerteza sobre o futuro de seus filhos. No entanto, sua determinação em garantir o melhor para suas crianças é inabalável.
Essas mães e pais não apenas lutam pela saúde e bem-estar de seus filhos, mas também levantam suas vozes em busca de mudanças sistêmicas. Elas clamam por políticas públicas mais eficazes, por um sistema de saúde que atenda às necessidades de todos e por uma sociedade mais inclusiva e empática com as pessoas no espectro do autismo.
Nessa jornada, o apoio mútuo entre as famílias é fundamental. Elas compartilham suas experiências, trocam informações e se unem em busca de soluções. E, mesmo diante das adversidades, encontram força e inspiração umas nas outras para continuar lutando por um futuro mais justo e igualitário para seus filhos autistas.
Enquanto a luta persiste, essas famílias brasileiras nos lembram da importância de empatia, solidariedade e perseverança diante dos desafios. E, acima de tudo, nos mostram o poder do amor incondicional que os pais têm por seus filhos, motivando-os a superar qualquer obstáculo em busca de um futuro melhor. (Do Ver-o-Fato, com informações do G1)
Entenda as reclamações
- Suspensão de tratamentos: “Meu filho está com tratamento suspenso desde dia 1º. As terapias multidisciplinares já vinham sendo interrompidas desde dezembro e, agora, a terapia ABA, que ele vem fazendo há mais de 2 anos na mesma clínica, e o plano não está efetuando o pagamento”.
- Cancelamentos de contratos: “Planos de saúde que estão cancelados, reativem! Não deixem as mães desesperadas”.
- Falta de pagamentos para profissionais e clínicas: “Crianças portadoras de deficiência estão sem os tratamentos porque o plano de saúde não está repassando o pagamento para as clínicas”.
- Dificuldade para obter reembolso: “Agora, o plano não está arcando com os pagamentos, está fazendo por reembolso. Eu tenho que conseguir o dinheiro para pagar a clínica, pedir o reembolso e depois devolver para quem me emprestou, porque é um custo altíssimo”.
- Oferecimento de terapias sem especialização ou com carga menor que a determinada em laudo médico: “O plano acaba querendo disponibilizar clínicas credenciadas, que não dão um tratamento assertivo e efetivo para crianças com nível de necessidade mais elevada. A gente fica à mercê”.
- Profissionais pouco qualificados para atender as demandas específicas da criança: “A Malu teve múltiplas sequelas e diagnósticos, então a qualidade de vida dela depende totalmente das terapias que ela faz. Caso ela fique sem, ela já para de evoluir e isso limita o futuro e as possibilidades de autonomia que ela tem”.
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