Não surpreende, mas é motivo de pesar, a postura da coluna Repórter 70, tradicional espaço opinativo do jornal O Liberal. Em quatro notas carregadas de raiva e ironia involuntária, na última sexta-feira, 6, o periódico agora defende, de maneira quase caricata, a procrastinação e a impunidade de poderosos acusados de graves crimes eleitorais no Pará. E faz isso atacando o presidente do TRE, desembargador Leonam Cruz, cuja reputação e seriedade no exercício do cargo é amplamente reconhecida pela população.
Leonam Cruz tem feito no TRE aquilo que os paraenses tanto cobram: celeridade processual na tramitação e julgamento de casos, sejam estes polêmicos ou não, principalmente de figuras contra as quais pesam denúncias de suspeita de compra de votos e abuso de poder econômico e político — práticas que corroem a já combalida confiança da população nas instituições.
Essa fúria de falso moralismo do jornal, própria de sepulcros caiados, teve origem, nesta semana em uma reportagem produzida pelo Ver-o-Fato, mostrando como o processo do senador Beto Fato se arrasta vergonhosamente há dois anos pelas gavetas do Tribunal Eleitoral do Pará, revelando quem contribui para a morosidade da justiça. O nome do presidente do TRE foi citado apenas uma vez na matéria deste portal, mas serviu de gancho para o incomodado Repórter 70 entregar a valiosa encomenda.
O mais intrigante, porém, não são as palavras afiadas do Repórter 70, mas a mudança de rumo do jornalismo que a coluna outrora representava. O Liberal, hoje um veículo em decadência, parece ter trocado os princípios editoriais por conveniências financeiras. É difícil ignorar que o caixa do Grupo Liberal, dono do jornal, conta com um generoso adubo dos cofres públicos na forma de farta publicidade em todos os veículos. E o padrinho dessa dádiva é o governo estadual, liderado por Helder Barbalho.
Trégua, amor e negócios
Aliás, a relação entre os Barbalho e os Maiorana — clãs que por décadas protagonizaram uma guerra midiática recheada de ofensas, acusações de crimes e ameaças, além de manchetes capazes de corar um frade de pedra — agora toma ares de uma inesperada trégua, troca de amores e negócios, muitos negócios. A aproximação soa mais como uma aliança pragmática do que qualquer reconciliação genuína.
Afinal, até bem pouco tempo atrás, eram comuns os ataques mútuos e as denúncias inflamadas, cada uma mais escandalosa que a outra. Hoje, porém, o jornal da família Maiorana empenha-se na defesa de figuras como o senador Beto Faro (PT), eleito com o apoio dos Barbalho e atualmente alvo de um pedido de cassação pelo Ministério Público Eleitoral, sob acusações de compra de votos.
Em sua coluna, Repórter 70 desqualifica os questionamentos à lisura do processo e mira naqueles que cobram celeridade judicial, enquanto tenta em vão exibir uma relevância que há muito escapou de suas páginas. A realidade é que o poder outrora incontestável do jornal escoa no ralo da falta de credibilidade e da indiferença dos leitores, cada vez mais escassos.
Lamentável, ainda mais para quem já foi visto como referência no jornalismo regional. Hoje, o que resta é um eco da influência passada, amparado por alianças de ocasião e por interesses comerciais que pouco ou nada têm a ver com o compromisso com a verdade.
É ladeira abaixo.
Veja o “Repórter 70” em ação
A resposta do TRE
Neste sábado, 7, o TRE enviou resposta à coluna Repórter 70. Leia a nota que foi publicada pelo jornal:
“O Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE do Pará) informa que na gestão do atual presidente do Tribunal, desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior (jan./2023 – jan./2025), foi avocado somente um processo, de Concórdia do Pará, modificando, assim, a relatoria do mesmo. E, neste caso, o processo estava concluso há um ano e o pedido para avocar foi solicitado pelo Ministério Público Federal.
O TRE do Pará informa, também, que o seu Regimento Interno prevê a possibilidade de avocar os autos do processo somente nos casos de estarem prontos para julgamento e já conclusos, como foi o caso de Concórdia. Já o caso citado pela nota, do senador Beto Faro, não está concluso para julgamento, razão pela qual não se aplica o dispositivo regimental.
Por fim, o Tribunal reforça que é imprescindível combater a morosidade nos julgamentos, sempre levando em conta o princípio constitucional da duração razoável do processo, direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso 78, da Constituição Federal. Este princípio garante que os processos, tanto na esfera judicial quanto administrativa, tenham uma tramitação razoável e que sejam assegurados os meios para garantir resultados mais rápidos”.