O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), conseguiu derrubar, na Justiça, a entrevista de sua ex-mulher, Julyenne Lins Rocha, que o acusa de violência doméstica e sexual, ao site Congresso em Foco. Uma decisão liminar do juiz Jayder Ramos de Araújo, da 10ª Vara Cível de Brasília, determinou que a matéria, publicada no último dia 25, fosse retirada do ar.
O parlamentar cobra indenização de R$ 100 mil por danos morais do UOL, provedor do portal, e de Julyenne. Antes da publicação, foi procurado, mas preferiu não se manifestar. Ele afirma que as alegações da ex-mulher já foram consideradas inverídicas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Lira também tentou tirar do ar uma reportagem feita pela Agência Pública em que ela faz as acusações, mas teve a liminar negada pelo juiz Luiz Carlos de Miranda, da 14ª Vara Cível de Brasília. (AE)
Manifestação da Agência Pública
Em material publicado no seu portal de notícias sobre o caso, a Agência Pública assim se manifesta sobre o processo de Lira:
“A Agência Pública de Jornalismo Investigativo é alvo de uma ação judicial por danos morais movida pelo deputado federal e presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Em nosso entendimento, trata-se de um grave ataque à liberdade de expressão e de imprensa no Brasil. O processo corre na 14ª Vara Cível de Brasília contra a Pública e a ex-esposa, Jullyene Lins.
Lira requereu que fosse determinado às plataformas de redes sociais que derrubassem, sob pena de multa, o conteúdo da reportagem “Ex-mulher Arthur Lira o acusa de violência sexual”, publicada em 21 de junho deste ano, além de pedir que a Pública fosse impedida de veicular outras publicações com o mesmo teor, também sob pena de multa. Por fim, requereu a condenação da Agência Pública ao pagamento de indenização no valor de R$100 mil reais, além de custas e honorários advocatícios.
O pedido de “tutela de urgência” apresentado por Lira na ação foi indeferido pelo juiz Luiz Carlos de Miranda, que entendeu que a reportagem atende ao interesse público e visava informar os leitores. Na matéria, a Pública trouxe com exclusividade uma entrevista com Jullyene Lins, que disse pela primeira vez que Lira a teria violentado sexualmente. Ela contou ainda ter sofrido violência física e psicológica do ex-marido.
A Pública se debruçou sobre o processo judicial baseado na lei Maria da Penha, procurou as principais testemunhas citadas e teve acesso ao laudo do corpo de delito, que originou o processo sobre a suposta violência física. O caso, iniciado em 2007, foi concluído nove anos depois, com a absolvição de Arthur Lira pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A Agência Pública considera que Arthur Lira tenta agora censurar o trabalho jornalístico de notável interesse público. “Não é demais lembrar que o autor, por ser figura pública e política de inegável importância no cenário brasileiro, desperta legítimo interesse quanto aos seus atos de governo, mas também quanto à sua vida pessoal”, disse o magistrado em sua decisão.
Além de pedir a retirada da reportagem do ar, Lira solicitou uma indenização de R$ 100 mil e pede que tanto a Pública quanto Jullyene Lins não falem mais sobre este assunto, o que é censura prévia: “Pede como tutela de urgência (…) e às Requeridas, Pública – Agência de Jornalismo Investigativo e Jullyene Cristine Santos Lins que se abstenham de veicular outras publicações com o mesmo teor, sob pena de multa por descumprimento”, diz o pedido de Tutela de Urgência, também negado pelo juiz Luiz Carlos de Miranda. Lira solicitou ainda que o processo corresse em segredo de justiça, o que também foi indeferido pelo juiz da ação.
Em sua decisão, o magistrado destacou o direito constitucional à liberdade de expressão, “um dos meios que garantem ao homem a livre manifestação de opiniões, ideias e pensamentos sem que com isso sofra retaliações ou censuras por parte de governos ou autoridades públicas”, destacou. “Alisando detidamente a matéria veiculada no portal eletrônico, observo que a Agência Pública não se descurou de seu dever de informar, ao contrário citou textualmente a decisão do STF, e indicou que houve a sua absolvição. Apresentou o relato da ex-esposa na noite em que ocorreram os fatos apurados pelo STF, e indicou quem estava na casa naquele momento”, acrescentou.
Ainda segundo Miranda “é evidente que a matéria não se mostrou, em nenhum momento, dirigida apenas contra o autor, posto que deu espaço à investigação que fez sobre os fatos de quase 2 décadas atrás, como também apresentou ao leitor dados sobre a decisão do STF e também sobre as pessoas envolvidas no que ocorreu naquela fatídica noite”. “Em resumo, a matéria permite ao leitor de inteligência média chegar à sua própria conclusão, seja por acreditar no que relatou Jullyene, seja por não acreditar, inclusive sobre a inovação contida na reportagem, que envolve a alegação de estupro”, concluiu Miranda na decisão”.