É um “presente de grego”, ou melhor, de Natal, capaz de gerar revolta e protestos, o projeto de lei 729, enviado ontem, 16 à Assembleia Legislativa. A ordem é para ser votado a toque de caixa e aprovado imediatamente, ao apagar das luzes de 2024, como manda a vontade soberana do governador Helder Barbalho.
O controvertido projeto, que vem sendo chamado por professores e servidores da educação de “Pacote de Maldades”, traz uma série de mudanças que retiram direitos conquistados há décadas pelos profissionais da educação. Por outro lado, o estado já vive o desmonte de políticas públicas de cultura e educação.
Um dos pontos mais criticados, o artigo 60, apresenta a criação da chamada Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada (VPNI), um mecanismo que, segundo especialistas e sindicatos, pode representar uma perda significativa nos salários e direitos dos profissionais da área.
O artigo estabelece que qualquer redução nominal nos salários dos servidores, provocada pela aplicação da nova lei, será compensada pela VPNI, uma vantagem de caráter temporário e variável. Contudo, essa compensação não servirá como base para cálculo de outras vantagens, como gratificações, férias ou aposentadoria. Além disso, a VPNI será gradualmente absorvida por futuros reajustes salariais, até ser extinta.
A proposta exclui várias gratificações importantes do cálculo da VPNI, como gratificações por magistério na educação especial, por atividades no Sistema de Organização Modular de Ensino (Some), risco de vida e alta complexidade, além do fim da dedicação integral no Programa de Ensino Integral Paraense (PEI).
Essas exclusões impactam diretamente profissionais que atuam em áreas sensíveis, como a educação especial e o ensino modular, considerados pilares no atendimento a populações vulneráveis e em localidades remotas.
Por que isso preocupa os professores?
A VPNI é vista pelos sindicatos como um mecanismo para maquiar a redução salarial, mantendo temporariamente a remuneração atual, mas retirando benefícios importantes e dificultando a valorização futura da carreira. Como essa vantagem será absorvida por reajustes, na prática, muitos professores ficarão anos sem aumento real, além de perderem direitos adquiridos.
Outro ponto crítico é que a proposta revoga conquistas históricas, como a gratificação de titularidade e progressão automática, substituindo-as por mecanismos que dependem de avaliações de desempenho e disponibilidade financeira.
“A VPNI não é um benefício, é uma armadilha. Ela congela nosso salário no tempo, retira direitos consolidados e impede que avancemos na carreira. O governo está desmontando a educação pública e tratando os professores como um problema, não como parte da solução”, afirmou ao Ver-o-Fato uma professora da rede estadual que preferiu não se identificar.
Contexto e impactos mais amplos
O projeto também sinaliza um enfraquecimento de políticas públicas voltadas à educação de qualidade e inclusão social. Por exemplo, o fim das gratificações para o Some e a educação especial poderá desmotivar profissionais a atuarem nessas áreas, já carentes de recursos e atenção.
Além disso, o congelamento e a redução das gratificações para o ensino integral (PEI) e técnico-pedagógicas enfraquecem os programas de melhoria da qualidade educacional no estado. Para os críticos, o governo está priorizando ajustes financeiros que penalizam os servidores e os alunos.
“O pacote de maldades do governador não é apenas contra os professores, é contra os estudantes, especialmente os mais vulneráveis. Ao atacar a educação especial, o ensino modular e integral, Helder está jogando fora décadas de avanços conquistados com muita luta”, destacou um dirigente sindical em coletiva de imprensa.
Mobilização e protestos
A categoria já organiza protestos para pressionar os deputados estaduais a rejeitarem o projeto de lei. Um grande ato está sendo planejado em frente à Alepa para as próximas horas, com a participação de sindicatos e movimentos sociais.
“O governador está tirando o pão da mesa dos professores para pagar o custo de suas campanhas e sua propaganda. Ele vende uma imagem de modernidade e gestão eficiente, mas a realidade é que estamos vendo um desmonte completo da educação pública e um ataque direto aos direitos dos trabalhadores”, afirmou uma liderança sindical.
Especialistas avaliam que as mudanças propostas pelo governo têm como objetivo reduzir a folha de pagamento, aliviando o orçamento estadual. Contudo, a falta de diálogo com os servidores e a retirada de direitos adquiridos levantam questionamentos sobre as prioridades da gestão Helder Barbalho.
“Estamos assistindo a uma estratégia clara de precarização do serviço público. Ao desmontar a educação e a cultura, o governo parece mais interessado em agradar investidores e grandes empresas do que em cumprir seu papel social”, analisou um economista ligado à oposição.
Enquanto o governo defende o projeto como parte de uma reforma necessária para “modernizar” a educação, os servidores enxergam uma ameaça ao futuro da profissão e à qualidade do ensino no estado.
Pará na contramão
Com cortes, ajustes e ataques aos direitos dos servidores, o Pará parece caminhar na contramão do investimento em educação de qualidade e valorização dos profissionais. “Enquanto gasta bilhões para obras no centro da cidade, Helder desmantela escolas, corta direitos e privatiza a cultura. Ele está vendendo o Pará peça por peça e condenando o povo à miséria e à falta de oportunidades”, conclui um professor