É muito honroso fazer ciência. Descobrir as coisas através de métodos, experimentos, tentativas-erros, estimativas, hipóteses, teorias, conceitos, normas, enfim, é tarefa árdua mas prazerosa para quem gosta. Entramos na universidade com sede de mudar o mundo, fazer ciência e crescer na vida. Mas aos poucos a realidade vai nos tolhendo, o que por um lado é bom, mas por outro é péssimo.
Primeiros semestres, artigo valendo avaliação. Há uma disciplina específica que te ensina o método científico, ou pelo menos deveria dar bases para tal. Na prática, consiste em como usar as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Então você constrói o trabalho com desenvoltura, com tardes e madrugadas filosofando sobre conceitos e temas que logo são materializados no papel. O professor pede 5 páginas, você faz 12. Tudo lindo.
Chega o dia de apresentar. Você está contente com o que fez, mas certamente espera correções e debates sobre a ideia central do texto. Ilusão. Apenas orientações quanto ao uso correto das normas da ABNT, pouquíssimo sobre suas ideias em si. Mas é compreensível, já que é algo que sempre vai acompanhar o universitário.
Então começa a semana de apresentação de TCC’s dos alunos veteranos. São esperados grandes temas, debates, inovação, ciência. Horas antes comentam sobre a banca, que seria muito rígida e que os alunos temem cair com esses avaliadores. Começa a avaliação. Em tom rígido, o orientador mais rígido começa a falar sobre o tema, sobre os livros que a formanda deveria ler, mas ele foca sua fúria nas normas. Acaba com a menina porque ao referenciar alguém, se usa tudo em caixa alta no sobrenome. Um show de terror. Saímos da sala nos perguntando se estamos prontos para humilhação.
Mas a graduação segue e cada vez mais nos especializamos nas normas, na forma, deixando de lado a ideia inovadora, o conteúdo. Porque parece importar mais o respeito às regras do que a apresentação de algo relevante. E aí se dá o ciclo de morte das produtores que dão lugar aos reprodutores de ideias (alguns casos, até copiadores). O aluno aprende assim, que depois se torna professor e ensina outros alunos a fazerem o mesmo.
Uma vez certa professora, doutora, nos deu uma dica curiosa: copiar o que um autor de renome escreveu e depois ir substituindo as palavras e parafraseando tudo. Ou seja, um “Crtl+v – Crtl c”, copia e cola, rebuscado. Um plágio com aroma de café. Tudo se torna mais fácil assim. Quantitativamente falando.
Você vai ler um artigo, uma tese ou monografia, pensa na chatice. A cada duas linhas parece haver a necessidade de referência. Se o aluno escreve “O céu é azul”, alguns orientadores perguntarão: “segundo quem?” Ele dirá: “eu vi ao amanhecer”. No que o professor retruca: “mas você já publicou quantos artigos na SciELO (revista científica)?” Enfim, isso tem muito do porquê os trabalhos não são acessíveis para maioria da população. Seja pelo modo de escrita, seja pela maneira que são escolhidos os temas, há algo que engessa a criatividade, a curiosidade e a liberdade.
Certa vez já houve polêmica porque um aluno usou uma referência de um livro escrito neste século. A professora disse não ser recomendável, já que seria muito recente. Na realidade…ela apenas não tinha lido. É que a ciência gira em torno dela! E quem disse isso? MESMO, eu (2020, p. pós corona).
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