Robespierre foi um dos revolucionários incentivadores da pena de morte na guilhotina ao rei Luis XVI. Em 1794, o próprio revolucionário acabou sendo guilhotinado. Essa passagem da revolução francesa deveria alertar os carrascos das redes sociais, pois a cada dia que passa um cancelador está sendo cancelado. As redes punem.
Ana é canceladora profissional, daquelas de puxar postagens de 2008 para provar que um coleguinha, nos auge dos seus 13 anos, era homofóbico. Ela não é exatamente de esquerda ou de direita, mas sim de cima, de onde observa a todos nós, meros mortais. É atenta, guardiã e certeira na sua vigilância diária por um deslize de alguém. Sabe quem você curte, tem dossiês de potenciais cancelados, lista dos cancelamentos mais aguardados, coisa de Emicida, Caetano ou Ivete. Padrão Fifa.
Ver suas postagens é ter certeza que o cancelamento é uma forma de arte, pois quem consegue, por exemplo, cancelar o RE x PA (por monopolizar o futebol e excluir a Tuna) ou um colega que disse preferir os ônibus de Belém que tem a cor amarela (o que denota, segundo seu textão, preconceito com os de cores azuis de Ananindeua), quem? Só um artista! É no mínimo criativo. Fora que é super produtivo, pois na alta safra se colhem até 10 cancelamentos por semana.
Mas um dia a tragédia aconteceu. As vezes é preciso se reciclar para não ficar para trás, parado no tempo e sem estímulos para se alinhar ao que há de novo no mundo…do cancelamento.
Os cancelados reagem de diversas formas. Existe aquele que esnoba, aquele que fica desesperado e fica incrédulo, o que se rende e pede logo desculpas (mesmo que ele nem saiba o porquê). Tem o que se esconde, deletando tudo; outro, que tenta dar o contra golpe e cancelar seus canceladores. Mas o pior, no sentido de que se dá mais mal, é o que tenta dar explicações. Esse é prato cheio, é jantado e merendado. Porque a explicação alimenta ainda mais as oportunidades para mais camadas de cancelamentos, que envolve mais fuzuê, lacração e tribunal da inquisição. Nossa amiga fez isso. De canceladora à cancelada, é uma viagem sem volta. Triste fim.
Ah, qual foi seu crime? Diz a sentença: postou foto com o pai, no dia dos pais. Milhares de pessoas não tem pai no Brasil e a foto poderia deixar essas pessoas tristes e depressivas. Viram como a arte está em constante aperfeiçoamento? Ela não esperava por essa nova modalidade de cancelamento. Foi vítima da sua própria revolução. Triste fim.
Talvez ensine que, assim como a pena de morte, uma hora o feitiço pode se virar contra o feiticeiro, muitas das vezes injustamente. A espiral do silêncio acontece e toda uma avalanche irracional toma conta da multidão. É perigoso. Mas o cancelador sendo cancelado, é até bom de se ver.
Me cancelo por isso. Triste fim.
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