As grades das janelas do andar superior da Casa Rosada, no bairro da Cidade Velha, em Belém, exibem as letras M, J, S e C.
Estas letras são as iniciais do nome de seu primeiro proprietário: Mateus José Simões de Carvalho, como descobriu a pesquisadora portuguesa Isabel Mendonça.
A compreensão deste detalhe da Casa Rosada tornou os cidadãos de Belém conscientes da ligação com a cidade de um engenheiro-militar cuja atuação se deu, sobretudo, na Capitania do Rio Negro, em localidades afastadas mais de 3.000 quilômetros da capital do Grão-Pará, numa fase – talvez, por isto, – bastante desconhecida da Engenharia Militar da Amazônia, correspondente ao final dos anos de 1700.
Naquele período, a Engenharia-Militar portuguesa havia, por fim, superado o atraso em que se encontrara, até poucas décadas antes, em relação a outros países europeus.
Um atraso tão grande que, após 1750, obrigou Portugal a contratar engenheiros-militares alemães e italianos para compor a primeira comissão de técnicos – entre os quais Antonio Giuseppe Landi – encarregados de demarcar os limites de suas possessões na Amazônia.
Simões de Carvalho integrou a segunda comissão demarcadora de limites, criada depois de 1777, com uma característica saliente: compunha-se exclusivamente de engenheiros-militares portugueses.
Esta mudança ocorreu como resultado da ação de um eficiente militar alemão, Guilherme de Schaumburg-Lippe, o Conde de Lipe, contratado pelo rei Dom José I para reorganizar o Exército lusitano e criar o seu Real Corpo de Engenheiros.
Simões de Carvalho, em 1780, chegou à Amazônia, com o título de doutor em Matemática. Nos três anos seguintes, ele deu prosseguimento a uma das grandes contribuições da Engenharia-Militar para a Amazônia: a realização do primeiro levantamento cartográfico, amplo e rigoroso, dos seus rios.
Simões elaborou um ‘Plano Geográfico da Capitania de S. José do Rio Negro’ que continha mapas dos rios Uaupés, Apaporis e Japurá, na fronteira com a Colômbia.
Preparou mapas do Rio Negro, com extensão de 1.700 quilômetros, e, do Rio Branco, no atual Estado do Acre. E ainda a “Carta Hidrográfica das Entradas para o Rio Amazonas, no Estado do Grão-Pará”. Simultaneamente, refez a planta do Forte de São Joaquim, no atual Estado de Roraima.
O seu trabalho mais importante, como engenheiro-militar cartógrafo, foi realizado em colaboração com outros profissionais portugueses, o Mapa Geográfico do Império do Brasil, no qual se podiam ver, em grande escala, os pontos controversos dos limites do Grão-Pará com a Colômbia, a Venezuela, e, as Guianas.
Pela dedicação e competência demonstradas no Grão-Pará, Simões foi promovido a capitão de Infantaria, com exercício de engenheiro, em 1785, e, a sargento-mor do Real Corpo de Engenheiros, em 1797.
Dois anos depois, em 1799, faltava apenas um ano para se encerrarem os trabalhos de demarcações. Ele, então, recebeu a missão de organizar e conduzir a passagem do chefe da comissão demarcadora espanhola, dom Francisco Requena pela Amazônia.
Um detalhe da missão a tornava complexa: o espanhol não podia dispor de oportunidades para produzir registros de detalhes topográficos da região, nem para avistar alguma de suas povoações.
Simões tornou-se naturalmente a pessoa indicada para governar a Capitania do Rio Negro por conhecê-la profundamente e por inspirar confiança ao governador do Grão Pará, dom Marcos de Noronha e Brito.
No dia 26 de março de 1804, seu nome foi encaminhado pelo governador ao Ministro dos Negócios Ultramarinos de Portugal, que o nomeou.
Porém, ele não chegou a assumir aquele cargo.
Morreu numa localidade chamada Vila Nova da Rainha, quando viajava para a capitania.
- Oswaldo Coimbra é escritor e jornalista