Victor Augusto Ramos Missiato – doutor em História*
A Revolução Francesa de 1789 provocou uma das maiores transformações da História. A modernidade não nasceu naquele ano, mas 1789 acertou o coração de uma tradição. Expandia-se, naquele acontecimento, diversos conceitos talhados a posteriori. Iluminismo, Modernidade, Revolução, Contemporaneidade, entre outros. Ao final daquele processo, uma expansão napoleônica varreu o mundo europeu e americano.
O conceito de América Latina, os nacionalismos mundo afora e o Estado Nação foram desenhados por meio do expansionismo revolucionário napoleônico. Nascia ali o espírito dialético hegeliano e a própria dimensão de um novo espaço/tempo.
Com a queda de Napoleão Bonaparte, a Restauração conservadora na Europa estabeleceu uma Santa Aliança. Restaurar para conservar. Restaurar para preservar. Restaurar para também avançar. Embora as forças liberais, socialistas e anarquistas impuseram diversas pressões aos reestabelecidos Impérios Absolutistas, foi o nacionalismo quem empreendeu a queda decisiva do Antigo Regime, com o tiro fatal da Primeira Guerra Mundial.
Tal movimento dialético da modernidade viria se constituir ao longo dos séculos vindouros. Maio de 1968, impulsor de diversas correntes libertárias, das religiões às pautas identitárias, contribuiu como aporte cultural ao neoliberalismo dos anos 1970-1980. Não é contraditório, portanto, que é na ideia de mercado, e não em países socialistas, que as pautas identitárias vem ganhando relevo e estatura.
Após a Crise de 2008, desiludidos foram aqueles que, como Marx na França, em 1848, aguardavam uma nova redenção a partir das ruas brasileiras (Vem pra rua, em 2013), chilenas (Movimento Estudantil de 2011), estadunidenses (Occupy), tunisianas, egípcias e sírias (Primavera Árabe), honconguesas (Revolução dos Guarda-chuvas), espanholas (Movimento 15M) e francesas (Coletes-Amarelos).
Apesar do espírito libertador desses movimentos, a redenção não adveio com a revolução. Os redentores, novamente, vieram da Restauração. Make America Great Again, Xi Jinping e o comunismo defensor do livre mercado, o neoczarismo russo de Putin, a autonomia inglesa perante a Europa no Brexit, o Brasil acima de tudo com Deus acima de todos, a manutenção das forças tradicionais nos países árabes.
O caldo revolucionário, novamente, foi temperado, cozido e servido pelos conservadores. Isso não quer dizer que os ecos revolucionários desapareceram. As lutas pelas igualdades, liberdades e fraternidades permanecem em constante movimento. Mas que fique claro mais uma vez: após toda explosão caótica do espírito revolucionário, um sistema, um reordenamento social impôs-se sob a forma de restauração e conservação. O nome para tal processo não é reação, mas sim, reforma.
*Victor Augusto Ramos Missiato é doutor em História, professor de História do Instituto Presbiteriano Mackenzie, membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Psicossociais sobre o desenvolvimento humano (Mackenzie/Brasília) e Intelectuais e Política nas Américas (Unesp/Franca).
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