Em um caso que escancara o abismo da crueldade humana, uma mulher foi resgatada na última sexta-feira (14) em Itaperuçu, na Região Metropolitana de Curitiba, após passar oito anos em cárcere privado, mantida como prisioneira pelo próprio marido. O resgate, conduzido pela Polícia Militar (PM), veio depois de um grito desesperado por ajuda enviado por e-mail à Casa da Mulher Brasileira, um último recurso de uma vítima que já havia tentado, em vão, clamar por socorro antes.
Um bilhete deixado em um posto de combustíveis — “Me ajude. Sofro muita violência em casa” — foi o primeiro sinal de seu tormento, mas, na época, a PM fez buscas na região indicada e não a encontrou, nem ao monstro que a mantinha cativa. Oito anos de silêncio, dor e humilhação se passaram até que, finalmente, a luz da justiça alcançasse essa mulher.
Ao chegar à residência na área rural, os policiais se depararam com uma cena que mistura medo e manipulação. Inicialmente, a vítima negou estar sofrendo violência — um reflexo do terror psicológico imposto pelo agressor. Mas, ao ser confrontada com o e-mail que ela própria enviara, desabou em lágrimas e confessou o inferno que vivia.
O marido, uma figura desprezível que a controlava como um carrasco, foi preso em flagrante. Ela, por fim, foi encaminhada para acolhimento, um primeiro passo para tentar reconstruir uma vida roubada por quase uma década.
Nível de sadismo
O que torna essa história ainda mais revoltante é o nível de sadismo e vigilância a que essa mulher foi submetida. Segundo seu relato à polícia, o marido instalou uma câmera de segurança apontada para a porta da casa, garantindo que ela jamais escapasse de seu olhar doentio. Sem celular próprio, ela só tinha acesso a um aparelho compartilhado, sempre sob os olhos dele.
Isolada do mundo, foi proibida de contatar qualquer pessoa sem sua presença. E as agressões? Brutais e constantes: ela contou que foi amarrada e asfixiada em várias ocasiões, atos que revelam não só a violência física, mas uma tentativa covarde de apagar sua humanidade.
E como se não bastasse o horror perpetrado pelo marido, a vítima revelou algo que corrói qualquer resquício de fé na empatia humana: familiares sabiam de tudo e nada fizeram. Coniventes, escolheram o silêncio, acobertando o agressor enquanto essa mulher era destruída dia após dia.
Aberração humana
Que tipo de gente assiste a tamanha barbárie e vira o rosto? Que sociedade permite que uma mulher seja reduzida a um objeto, trancada e torturada, enquanto os que deveriam protegê-la se tornam cúmplices por omissão?
Esse caso é uma aberração humana em todos os sentidos — uma denúncia não só contra o marido desgraçado que a escravizou, mas contra uma rede de indiferença que deixou o sofrimento prosperar por oito anos. Cala quem acha que a violência contra a mulher é um “exagero” ou um “problema doméstico”. Aqui não há domesticidade, há crime, há perversão, há um sistema falho que só ouviu o grito dela quando o desespero já havia consumido quase uma década de sua vida.
Que o resgate dessa mulher seja o começo de sua libertação e que a justiça esmague, sem piedade, esse verme e todos que fecharam os olhos para sua dor. Porque, se há algo mais aberrante que o cárcere, é a cumplicidade de quem poderia ter aberto a porta e escolheu deixá-la trancada.