Era idos de 2004, periferia de Belém, 10 da manhã. Nunca esquecerei. O céu estava claro, as gargalhadas estavam soltas e a menina que eu gostava – como sempre – não estava olhando pra mim. Um cenário tão normal para um evento tão grandioso. A vida tem mesmo dessas coisas. O locutor foi meu amigo malaco que discutia com outro amigo sobre quem era mais forte, Goku ou Vegeta (personagens do desenho Dragon Ball Z).
Foi no momento de discordância que ele bradou em alto e bom som essa dádiva da filosofia libertadora da malacagem, essa expressão que circunscreve a explosão hormonal do falo, esse portal rumo à maestria em forma de morfossintaxe do brio humano. Disse ele: “Meu ovo!!”
Passaram os dias e aquele dito não saía dos meus pensamentos. Era tão libertador. Você acabava com o argumento do adversário, fazia gol, dava um golpe, bastava dizer: meu ovo. Era um êxtase. Orgasmo.
Só que para dizer esta façanha, não haveria de ser para qualquer hora, teria que ser um momento potencialmente tenso. Nada de falar por falar. É algo sagrado. Portanto, ei de esperar o momento certo.
Mas nunca vinha. Eu nunca conseguia entrar numa polêmica pra poder falar de meu ovo. Eu já andava na rua esperando entrar numa discussão. Poderia ser sobre o RexPa, sobre desenho ou peteca. Mas não rolava. A paz tratou de me cuidar e isso era angustiante.
Já sem esperança, num belo dia de novembro chuvoso, eu era um dos melhores jogadores de futebol dos campos de terra-lama. Minha mãe passa por mim e diz: só vai jogar bola se a chuva passar, tu estavas doente.
Tum tum tum tum (batidas do coração)
Em um momento de desvaneio, de pura erupção de vontades censuradas por semanas, atendendo a instintos da natureza filosofal do ser, escapuliu-me: “Meu ovo”.
Dizem que poucos são os humanos que tiveram experiência de quase morte. Minha alma fugiu e me deixou sozinho. O universo encolheu. Expliquem, ateus, como posso estar aqui para dar este testemunho?
Não fui jogar bola. O coro esquentou. Mas eu aprendi que devemos controlar nossos impulsos. Se você discorda, vos digo: Meu… nada não.
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