O Movimento Popular Unificado de Belém (MPUB) entrou na Justiça para fosse suspenso o decreto assinado pelo prefeito Zenaldo Coutinho, proibindo festas de Natal e final de ano na cidade, além do funcionamento de bares, restaurantes, boates e similares. Citou a Constituição Federal e, em particular, princípios como o da razoabilidade e proporcionalidade previstos no artigo 2ºda Lei Federal nº 9.784/99, mas não teve jeito.
O juiz da 5ª Vara da Fazenda Pública e Tutelas Coletivas, Raimundo Santana, porém, não entrou nessa bola dividida contra o Município de Belém e indeferiu o pedido do MPUB, impetrado pelo advogado Mário Paiva. “Ocorre que, o pedido de concessão de tutela antecipada, nos moldes como formulado, resvala em interferência na esfera discricionária da Administração Pública, já que se trata de matéria de conveniência e oportunidade, próprias da discricionariedade do poder público, não se oferecendo à interferência judicial como “substituinte”, alega o juiz na decisão, obtida com exclusividade pelo Ver-o-Fato.
Segundo Raimundo Santana, ” requer o autor que o Poder Judiciário substitua o Poder Executivo, a quem cabe decidir, em meios aos desafios da pandemia e os problemas sociais, econômicos, etc, inerentes à situação vivenciada, as possibilidades administrativas, que melhor atendem o bem comum”. Ademais, nestes assuntos, a presença do Poder Judiciário, sustenta o juiz, “deve ser minimalista, se restringindo a atuar tão somente quando os indícios de ilegalidade forem patentes, o que não se verifica no caso em questão”.
Por fim, o magistrado diz que “não é possível determinar a suspensão do decreto guerreado, vez que é incabível cogitar a suspensão/nulidade relacionada a oportunidade e/ou conveniência de atos sobre as quais a Administração Pública pode deliberar livremente, desde que dentro dos parâmetros de legalidade”.
“Coerente com os fundamentos precedentes, indefiro a tutela de urgência reclamada. Cite-se, e no mesmo ato, intime-se o Município de Belém para tomar conhecimento da presente decisão e, querendo, apresentar defesa no prazo legal. Juntada a peça de defesa, dê-se vistas ao autor para replicar, no prazo legal”, resume Santana..
VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO
” Trata-se de ação civil pública com pedido de tutela antecipada, ajuizada pelo Movimento Popular Unificado de Belém – MPUB, o qual deduziu pretensão em face
do Município de Belém. Alegou o autor, em síntese, no dia 15.12.2020 o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, publicou o Decreto Municipal no 98.087/2020, que passou a prever:
Art. 3º – A partir das 18h dos dias 24 e 31 de dezembro de 2020, até às 11h do dia seguinte, ficam proibidas:
I – as atividades de bares, restaurantes, lanchonetes, barracas, casas noturnas, boates e similares;
II – a realização das festas de Natal, Réveillon e confraternizações de qualquer natureza em clubes, condomínios, espaços públicos, hotéis, além de shows musicais e pirotécnicos, em ambientes abertos ou fechados, com ou sem cobrança de ingresso;
III – o consumo de alimentos e bebidas em estabelecimentos comerciais autoriza dos a funcionar ininterruptamente.
Segundo o autor, a nova legislação deve ser suspenso “…pois contraria comandos constitucionais, legais, Código de Defesa do Consumidor bem como de princípios de direito como da razoabilidade e proporcionalidade…” (sic, fl. 04).
Em seguida, argumentou que o “referido Decreto fere frontalmente a Constituição Federal bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, trazendo grandes prejuízos a empresários que investiram consideravelmente nestes dias que representam o maior faturamento do ano e a comunidade como um todo que
será privada de seus direitos básicos e elementares…” (sic, fl. 06).
Ademais, sustentou que a nova normativa, ao determinar a suspensão das atividades nos dias de festa, viola os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, probidade, eficiência, supremacia, indisponibilidade do interesse público e razoabilidade, os quais são limites para a atuação discricionária da administração pública.
Pelo argumentado, requereu a concessão da tutela liminar com o fim de determinar ao Município de Belém, na pessoa de seu representante legal, a imediata
suspensão dos efeitos o artigo 3o incisos I, II e III do Decreto no 98.087/2020 de 15/12/2020 que altera o Decreto no 96.340, de 25 de maio de 2020. No mérito, pugnou pela confirmação da medida liminar. Com a petição inicial, juntou documentos.
É o relato necessário. Decido sobre a tutela de urgência.
É sempre válido destacar que as medidas processuais de urgência assumem funções que tanto podem ser instrumentais quanto substanciais. Em qualquer
hipótese, tais medidas tendem a evitar o perecimento de um direito cuja aparência seja razoavelmente aferida desde logo – ainda que apenas em sua feição instrumental.
Em linhas gerais, a ideia antecedente está contida nos artigos 300 e seguintes do CPC, os quais dispõem que as tutelas de urgência e emergência poderão ser
deferidas quando estiverem presentes a probabilidade do direito e, também, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Esse regramento, vale dizer, poderá ter aplicabilidade em qualquer tipo de processo, já que, do contrário, seria quase impossível reverter ou minorar tempestivamente algum tipo de ato lesivo.
Será desimportante, por agora, tecer considerações delongadas acerca do “estado de perplexidade” que decorre da Covid19. Sem dúvida, subiste um espectro
de insegurança em muitas áreas, destacadamente no âmbito das ações estatais, já que, por conta de suas atribuições, compete aos gestores públicos, a tarefa de dar um norte à sociedade, conduzindo-a de maneira a enfrentar os desafios do momento com o mínimo de danos.
No caso presente, o demandante apresentou postulações que possuem dimensão essencialmente material, ou seja, o pedido de tutela de urgência está
diretamente relacionado ao cerne do debate proposto, assumindo, pois, as feições de uma tutela antecipatória e, até mesmo, satisfativa.
É que, o principal pedido do autor diz respeito à suspensão do artigo 3o incisos I, II e III do Decreto no 98.087/2020 de 15/12/2020, o qual determina a suspensão das festas e funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes, barracas, casas noturnas, boates, nos dias 24 e 31 de dezembro a partir das 18h até às 11h do dia seguinte.
Ocorre que, o pedido de concessão de tutela antecipada, nos moldes como formulado, resvala em interferência na esfera discricionária da Administração Pública, já que se trata de matéria de conveniência e oportunidade, próprias da discricionariedade do poder público, não se oferecendo à interferência judicial como
“substituinte”.
Assim, o que requer o autor é o Poder Judiciário substitua o Poder Executivo, a quem cabe decidir, em meios aos desafios da pandemia e os problemas sociais,
econômicos, etc, inerentes à situação vivenciada, as possibilidades administrativas, que melhor atendem o bem comum.
Ademais, nestes assuntos, a presença do Poder Judiciário deve ser minimalista, se restringindo a atuar tão somente quando os indícios de ilegalidade forem patentes, o que não se verifica no caso em questão. Desta forma, para a demanda trazida, não é possível determinar a suspensão do decreto guerreado, vez que é incabível cogitar a suspensão/nulidade relacionada a oportunidade e/ou conveniência de atos sobre as quais a Administração Pública pode deliberar livremente, desde que dentro dos parâmetros de legalidade.
Coerente com os fundamentos precedentes, indefiro a tutela de urgência reclamada. Cite-se, e no mesmo ato, intime-se o Município de Belém para tomar conhecimento da presente decisão e, querendo, apresentar defesa no prazo legal. Juntada a peça de defesa, dê-se vistas ao autor para replicar, no prazo legal.
Publicar e intimar.
Belém, 16 de dezembro de 2020.
RAIMUNDO RODRIGUES SANTANA – Juiz de Direito da 5a Vara da Fazenda Pública e Tutelas Coletivas “
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