O recente anúncio do governador do Pará Helder Barbalho de vender R$ 1 bilhão em créditos de carbono, com a promessa de proteger as florestas da Amazônia paraense, trouxe à tona preocupações graves sobre transparência e inclusão das comunidades tradicionais na formulação de políticas ambientais.
A proposta, apresentada durante um encontro com investidores estrangeiros, sugere que parte dos recursos será destinada às comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas e caboclas — aqueles que, de fato, preservam a floresta. No entanto, a falta de consulta prévia e o planejamento realizado a portas fechadas despertaram críticas e uma resposta contundente do Ministério Público.
Parece tudo um jogo de cena de Barbalho, conhecido por não ouvir ninguém, a não ser a voz do próprio umbigo, levando todos à reboque de suas ideias e vontades.
O papel ignorado das comunidades
Um dos pontos mais controversos desse até agora nebuloso projeto de Barbalho é a ausência de diálogo com os verdadeiros guardiões da Amazônia. Pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o governo tem a obrigação de realizar a Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) antes de implementar qualquer projeto que afete territórios ocupados por povos indígenas e comunidades tradicionais.
Apesar disso, ele decidiu levar adiante as negociações, ignorando a importância dessas populações e evidenciando uma postura que muitos consideram autoritária e centralizadora.
As comunidades locais, que há gerações vivem e protegem essas terras, não foram envolvidas nas discussões iniciais do projeto, que foram restritas a poucas organizações selecionadas. Esse cenário revela uma tentativa de impor decisões de cima para baixo, sem respeitar a autonomia e o conhecimento das populações que convivem diretamente com a floresta.
A intervenção oportuna dos MPs
Diante dessa situação, o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) emitiram uma recomendação formal ao governo do estado. A requisição, encaminhada nesta sexta-feira, 18, à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), exige uma série de ações imediatas para assegurar que as leis sejam respeitadas e que a transparência prevaleça. Entre as medidas solicitadas, destacam-se:
Divulgação pública de documentos: A Semas deve tornar acessíveis todas as informações relevantes sobre o projeto, facilitando o acesso aos dados por meio de canais de informação ambiental, como websites, bibliotecas e outros meios de comunicação.
Realização de audiências e consultas públicas: O MPF e o MPPA exigem a promoção de audiências públicas em diferentes regiões do estado, para que a sociedade civil tenha a oportunidade de debater e questionar os termos do projeto, garantindo uma participação ampla e democrática.
Cumprimento da CPLI: É imprescindível que a Semas realize a Consulta Livre, Prévia e Informada, respeitando os protocolos e processos de tomada de decisão das comunidades afetadas, conforme estabelecido na Convenção 169 da OIT. Isso asseguraria que os interesses dessas populações fossem levados em consideração antes de qualquer decisão final.
Clarificação das áreas envolvidas: Existe uma preocupação com a legitimidade dos créditos de carbono, uma vez que parte deles poderia envolver territórios que não estão sob a dominialidade do estado, como terras indígenas e unidades de conservação federais, além de áreas griladas e com processos judiciais em andamento. O governo precisa esclarecer como pretende lidar com essas áreas e quais serão as implicações jurídicas para cada uma delas.
Dúvidas e riscos ao Pará
A falta de clareza e diálogo levanta questionamentos importantes sobre a viabilidade e a ética do projeto. Se o governo do Pará não resolver as dúvidas levantadas pelo MPF e MPPA, corre o risco de minar a credibilidade da proposta de venda de créditos de carbono, afastando investidores sérios e prejudicando o meio ambiente e as comunidades que dependem diretamente dele.
Para que a iniciativa tenha sucesso e cumpra seu objetivo de preservar a Amazônia, é essencial que seja construída de forma transparente e inclusiva, respeitando os direitos e as tradições das populações locais. O desrespeito a esses princípios, além de ser ilegal, ameaça a sustentabilidade do próprio projeto, que deveria, acima de tudo, ser um modelo de governança ambiental justa e responsável.
Em tempos de crise climática, as soluções para a preservação da floresta não podem ser desenhadas em escritórios fechados, isoladas das vozes de quem há séculos protege a biodiversidade da Amazônia. Se Helder Barbalho quer realmente proteger a floresta e conquistar a confiança da comunidade internacional, precisa começar ouvindo aqueles que melhor conhecem o território e que, de fato, têm interesse na sua preservação.
O resto não passa de pirotecnia midiática e preparação de um cenário fantasioso e perturbador para a COP 30, em novembro de 2025, na cidade de Belém.
Evento que, aliás, o Ver-o-Fato torce para que não seja um circo ambiental.
Íntegra da requisição