Carlos Mendes
A cretinice está solta e ninguém segura. Há tempos, ela faz sua própria rebelião. Como já previra o anjo pornográfico Nelson Rodrigues, essa rebelião consiste em deturpar o óbvio ululante. Mas não é só isso: também pretende construir sua própria moral, que é a moral do bordel.
Se não fizeram o que podiam ter feito, quando tiveram as rédeas nas mãos, então que ninguém o faça, porque não será permitido. No Brasil de hoje, transbordando problemas econômicos e sociais – 13 milhões de desempregados, saúde caótica, educação da pior qualidade, criminalidade aterradora –, o que faz o cretino? Resposta: alimenta-se da distopia e aposta no quanto pior melhor. É sua zona de conforto.
Só um cretino – ou cretina, tanto faz – passa o dia inteiro nas redes sociais, imbuído daquela castidade depravada, para conspirar contra o próprio país, torcendo para que ele dê errado. É a fórmula que encontra de se manter vivo e transformar a medíocre existência em algo produtivo, se é que isso é possível.
O cretino, reconheçamos, é um estoico, mas esse estoicismo não serve para nada. O esforço que faz para distorcer a obviedade, com tamanha convicção, causa-lhe dor e sofrimento. É uma revolta oriunda do fracasso de ter perdido a chance de fazer algo em seu próprio benefício e de seu país.
Só um idiota perfeito e acabado para negar a verdade óbvia de que a corrupção – jamais combatida pelo cretino, até quando seus líderes roubavam o país e ele fingia que não sabia de nada ou que isso não era importante – é o câncer que precisa ser extirpado para que o organismo nacional volte a gozar de boa saúde.
Só um cretino – ou cretina, volto a repetir – para entender que a corrupção de um Flávio Bolsonaro disfarçada de movimentação financeira atípica, é mais grave do que os bilhões que o PT e seus aliados roubaram do país, inclusive desviando recursos para financiar notórias ditaduras.
Que o filho do presidente da República pague pelo que fez, como fizeram e fazem alguns hipócritas, inclusive de esquerda, que ficam com parte do salário de seus assessores parlamentares. Não foi com o discurso de combate à corrupção que Jair Bolsonaro se elegeu?
Então, não tem sentido nenhum que áulicos em torno do presidente queiram minimizar o problema de Flávio. A cretinice, nesse caso, está nos dois lados. Aliás, a diferença entre a cretinice de esquerda e a de direita está apenas na topografia. Ambas se igualam na estupidez, como na mais recente disputa entre azul e rosa.
Só mesmo um cretino para negar que o país quebrado voltará a crescer sem as reformas da Previdência e tributária. São reformas urgentes e inadiáveis, que deveriam ter sido feitas há 30 anos, após o advento da nova Constituição. Mas o que se vê, agora, é gente que nada lê ou sabe sobre dívida pública dando palpite e gritando palavras de ordem de que não aceitará a reforma da Previdência. E qual a solução? Não sabem, para variar.
O cretino fundamental – se Nelson Rodrigues estivesse vivo diria que seu personagem é facilmente reconhecido no Facebook, Instagram, Twitter, nos gabinetes do poder e das casas legislativas, nas ruas e bares – está no caminho certo para fazer sua revolução, ou contrarrevolução. Ele está pronto para a guerra e já oprime o não-cretino. Porque o cretino fundamental não precisa de metralhadora ou bomba para fazer a rebelião.
“Ponha um cretino fundamental em cima da mesa e você manda ele falar, ele dá um berro e imediatamente, milhares de outros cretinos se organizam, se arregimentam e se aglutinam”, dizia o gênio nacional do teatro, cinema e jornalismo. Nelson captou a alma brasileira como nenhum outro. Qualquer semelhança com o que está ocorrendo hoje no país não é mera coincidência.
O não-cretino saberá reagir? Eis a questão.
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