O ano de 2022 começou muito ruim para a deputada federal Elcione Barbalho (MDB), mãe do governador Helder: ela está na corda bamba para perder o mandato no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e só não foi cassada ontem, durante sessão do pleno daquela corte, porque o polêmico ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos.
Elcione é acusada de usar a cota para as mulheres do partido, dividindo-a com 10 candidatos homens que disputavam o cargo de deputado estadual, a título de “doação financeira”. Na votação iniciada ontem, os ministros Edson Fachin e Luiz Roberto Barroso votaram pela cassação do mandato. Barroso, aliás, antecipou o voto, pois está de saída do TSE.
A deputada doou a 10 candidatos homens o valor de R$ 1,170 milhão. Ou seja, mais da metade do montante total da campanha eleitoral dela para se reeleger em 2018. Essa verba era destinada exclusivamente ao financiamento feminino de candidatas que haviam entrado na política, filiando-se ao partido. E com um detalhe: apenas R$ 30 mil foram usados por Elcione na campanha dela, sendo quase todo o restante utilizado nas campanhas masculinas de candidatos a ela vinculados em nome na chapa para a Câmara Federal e Assembleia Legislativa.
No Tribunal Regional Eleitoral (TRE) o julgamento foi amplamente favorável à Elcione, sendo a representação do Ministério Público Eleitoral (MPE) julgada improcedente por unanimidade. Votaram com o relator os desembargadores Roberto Gonçalves de Moura e Luzia Nadja Guimarães Nascimento, o juiz federal Sérgio Wolney de Oliveira Batista Guedes e os juízes Álvaro José Norat de Vasconcelos, José Alexandre Buchacra Araújo e Luzimara Costa Moura. O julgamento foi presidido por Roberto Moura.
Segundo o acórdão do julgamento no TRE, a definição dos critérios de distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) aos candidatos de cada agremiação “é matéria interna corporis, em decorrência da autonomia que lhe é conferida pela Constituição Federal e pela Lei dos Partidos Políticos. Dessa maneira, a distribuição, pela então candidata a deputada federal Elcione Barbalho, de verbas do FEFC – cota feminina de 30% – para candidatos do sexo masculino “não pode ser considerada ilícita, tendo em vista que, conforme dispõe a norma pertinente à matéria, não houve emprego exclusivo de recursos do FEFC nas candidaturas masculinas”.
Ainda de acordo com a avaliação dos juízes eleitorais do Pará, “consta nos autos o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino e o benefício a candidatura feminina foi alcançado, conforme dispõe o § § 5º e 6º do artigo 19 da Resolução TSE 23.553/2017. 5”. Existem nos autos vários documentos e imagens que evidenciam a “parceria entre a representada e os candidatos do sexo masculinos, ou seja, o conjunto probatório demonstra que houve campanhas casadas”
” A candidata dona do recurso tem o direito de escolher e definir de acordo com a dinâmica da política qual a parceria mais vantajosa, ou seja, a discricionariedade de decidir com quais correligionários quer atuar conjuntamente na busca da vitória nas urnas”, resume a decisão do TRE, acrescentando que “além de casadinhas da representada com os candidatos do sexo masculino, existiam parcerias destes com outras candidatas do sexo feminino”. O MPE recorreu ao TSE contra a decisão, sustentando as irregularidades e alegando quea decisão do TRE contrariou as provas dos autos..
Campanha de fachada para burlar recursos, diz Fachin
Para o relator do recurso no TSE, ministro Edson Fachin, “descortina-se um estratagema de financiamento ilícito, na esteira do qual uma candidatura feminina impôs monopolizar as verbas vinculadas, servindo para distribuição de recursos a candidaturas masculinas, armando-se desta forma um esquema de espécie de pirâmide destinado à distribuição de vantagens indevidas”.
Fachin afirma que Elcione “integra grupo familiar que goza de larga predominância no cenário político regional e até mesmo nacional e já cumpria mandato de deputada federal. Desta forma, muito mais crível é que as supostas casadinhas ostentariam a aptidão para alterar a figura em destaque dos candidatos e não o inverso”. Ele também menciona “valores vultosos” na campanha dos 10 candidatos a deputado vinculados ao nome de Elcione.
Além disso, pelo que se extrai do conjunto probatório, a “estratégia eleitoral da recorrida resvalou para o esvaziamento da política pública que é instituída por lei”, lembrando Fachin que outras candidatas do partido “tiveram que se ressentir de verbas para campanha que a elas não foram disponibilizadas”.
Na verdade, resume o ministro, a tática de campanha de Elcione teve por objetivo ” o inegável intento de burlar os valores do fundo partidário das campanhas femininas, formando-se casadinhas de fachada com candidatos do sexo masculino”. Nesse caso, completa, Elcione seria uma “candidata laranja nessa espécie de operação, uma figura que serve o dinheiro para finalidades escusas e dissociadas da legislação”.
Por fim, ele votou pela cassação do mandato da deputada. “Estou convencido de que devemos conter esse tipo de comportamento em benefício das candidaturas femininas”, disparou o ministro Luiz Roberto Barroso, antecipando o voto de condenação de Elcione Barbalho. O ministro Alexandre de Moraes, porém, pediu vista dos autos para melhor análise.
Veja o julgamento e os votos: