A Promotoria Militar do Ministério Público do Pará recebeu nesta manhã de segunda-feira, 25, um ofício com informações relatadas pelo advogado Ismael Moraes, defensor da Associação Indígena Tembé no “imbroglio” contra a multinacional Brasil Bio Fuels (BBF), sobre agressões e ameaças, inclusive de morte, contra lideranças dessa etnia, principalmente Paretê Tembé, que teriam partido de policiais militares.
O ofício foi protocolado e será distribuído a um dos dois promotores militares – Armando Brasil ou Gilberto Valente – para que sejam tomadas providências, incluindo a abertura de investigação.
No sábado à noite, Moraes, conforme matéria exclusiva ontem publicada pelo Ver-o-Fato, comunicou o caso diretamente ao governador Helder Barbalho, na página dele no twitter, pedindo providências. Haveria, de acordo com o advogado, um plano para matar Parentê Tembé, que estaria sendo caçado na região do Vale do Acará.
No relatório enviado ao MP militar, Moraes pede a instauração de inquérito para identificar os PMs que estariam atuando na região como milicianos. Ele também quer saber quem são as autoridades que comandaram esses policiais e “concorreram para as praticas delituosas”.
Segundo a representação, no feriado de Tiradentes, 21, a empresa BBF reagiu com “violenta retaliação, aproveitando o clima criado por notícias falsas para fechar todas os caminhos, estradas e ramais do Território Indígena Turé-Mariquita com quase uma dezena de viaturas e cerca de 30 policiais militares da Rotam, supostamente do município de Abaetetuba, fortemente armados”.
” Os milicianos da Rotam fizeram barreiras clandestinas e revistaram todos os carros e todos os indígenas buscando encontrar Paretê, juntamente com outros milicianos empregados da empresa. Também atacaram a indígena Maíra Tembé, e um dos empregados da BBF sugeriu aos milicianos da Rotam para “queimarem-na viva”, enfatiza outro trecho da representação ao MP militar. E acrescenta que até o último sábado, 23, os PMs continuavam na área, “executando o serviço de milícia, em Tomé-Açu”.
O pior de tudo é que a ação militar, destaca ainda o documento, foi realizada “sem mandado judicial e sem a participação de autoridade, como delegados de Polícia Civil) ou agentes da Polícia Judiciária”. E mais: “O que se viu a partir daí, foram atividades de “verdadeiros grupos milicianos, que estavam à caça do líder indígena Paretê Tembé, que personifica a resistência do povo indígena Tembé à ocupação do território dessa etnia pela multinacional”.
Veja, abaixo, a íntegra do documento:
Exmo. Sr. Promotor Militar da Promotoria Militar do MP/PA
Associação Indígena Tembé de Tomé-Açú,
entidade civil, sem fins lucrativos, inscrita no CNPJ sob o nº 01.637.394/0001-20, neste ato representada por seu presidente o Sr. Paretê Tembé, brasileiro, casado, extrativista indígena, inscrito no CPF pelo nº 053.735.658-49, portador da carteira de identidade nº025.068.712-76 2ª Via Polícia Civil/PA, com sede no Ramal Mariquita São João, s/nº, município de Tomé-Açú (PA), através do seu advogado Ismael Antônio Coelho de Moraes, inscrito na OAB/PA sob o nº 6.942, que usa e assina Ismael Moraes e faz parte da sociedade de advogados Ismael Moraes Advocacia e Assessoria Jurídica S/S, inscrita no CNPJ nº 031.449.82/0001-83 e inscrita no livro de Registro de Sociedades de Advogados da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Pará (OAB/PA) sob o nº 835/1999, com sede à Tv. Dom Romualdo Coelho, nº1072, Umarizal, Belém (PA), vem REPRESENTAR aVossa Excelência conforme os fatos delituosos a seguir narrados:
O território indígena Turé-Mariquita, reconhecido pela Funai e pelo INCRA, ocupado pelo povo indígena Tembé, foi invadido pela multinacional Biopalma S/A, que atualmente adota o nome de BBF – Brasil Bio Fuels, empresa do agronegócio com capital estrangeiro, que se utiliza de titulação “plantada” que não corresponde às áreas por ela pretendidas.
O conflito causado pela grilagem da empresa escalou gravemente nos últimos 10 meses a partir da adoção, por ela, de estratégia cada vez mais violenta, ao fazer uso de milícias particulares (ex-policiais militares de outros estados), de “empregados comuns” que são jagunços e, agora, mais recentemente, utilizando da ROTAM da Polícia Militar do Pará (supostamente do município de Abaetetuba, a quase 200 km de território indígena em Tomé-Açu), conforme reiterados relatos fornecidos por membros do referido povo indígena e por terceiros.
Na última quinta-feira, após mais um confronto entre a multinacional e outros povos tradicionais, desta vez quilombolas e ribeirinhos, já no Município de Acará -mais um palco no amplo espaço de usurpação de terras tradicionais e públicas – a empresa reagiu com violenta retaliação, e aproveitou o clima criado por notícias falsas para fechar todas os caminhos, estradas e ramais do Território Indígena Turé-Mariquitacom quase uma dezenas de viaturas e cerca de 30 policiais militares da ROTAM, supostamente do município de Abaetetuba, fortemente armados.
Sem mandado judicial e sem a participação de autoridade (delegados de Polícia Civil) ou agentes (escrivães e investigadores) da Polícia Judiciária (Polícia Civil), o que se viu a partir daí foram atividades de verdadeiros grupos milicianos, que estavam “à caça” do líder indígena Paretê Tembé, que personifica a resistência do povo indígena Tembé à ocupação do território dessa etnia pela multinacional.
Os milicianos da ROTAM fizeram barreiras clandestinas e revistaram todos os carros e todos os indígenas buscando encontrar Paretê, juntamente com outros milicianos empregados da empresa. Atacaram a indígena Maíra Tembé, e um dos empregados da BBF sugeriu aos milicianos da ROTAM para “queimarem-na viva” ao que disseram que “o objetivo é o Paretê”, que “não podemos chamar a atenção pra isso”.
Até sábado, os policiais da ROTAM, executando o serviço de milícia, ainda se encontravam em Tomé-Açú.
Destarte, a entidade indígena requer de Vossa Excelência a instauração de Procedimento Investigatório Criminal no sentido de identificar os policiais participantes do serviço de milícia assim como as autoridades policiais (comandantes que possam estar concorrendo para as praticas delituosas) a fim de subsidiar as ações penais que Vossa Excelência entender cabíveis.
As vítimas ficam à disposição de Vossa Excelência para prestar as declarações necessárias, podendo ser comunicadas através do advogado signatário. Requer-se enfim seja oficiado para a SEGUP a fim de serem tomadas medidas de garantias de vida do líder povo indígena Paretê Tembé. Envia-se anexos a este email os documentos de legitimação, e fotografias que talvez possam contribuir para o início das investigações.
Pede deferimento.
Belém, 24/04/2022.
Ismael Moraes
Advogado OAB PA 6.942