O TCM rejeitou por unanimidade as contas do prefeito de Tailândia, no dia 18 de dezembro passado |
O prefeito “Ney da Saúde” plantou a semente da rejeição de suas contas e complicou-se |
A decisão trouxe sérios problemas para o prefeito, mas isso não quer dizer que ele está fora da disputa em 2016 para tentar um novo mandato. É preciso primeiro conhecer um pouco da lei da Ficha Limpa para entender como a coisa funciona. A Lei Complementar n.º 135, de 4 de junho de 2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, criou novas causas de inelegibilidade para “proteger a probidade administrativa” e “a moralidade para exercício de mandato”, considerando a “vida pregressa do candidato”. Com a lei, os gestores públicos que “tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa” tornam-se inelegíveis durante o período de oito anos.
Essa é uma das causas de inelegibilidade mais polêmicas entre as criadas pela Lei da Ficha Limpa, e, certamente, provoca discussão sobre a adequada interpretação da norma em cada caso concreto. Segundo juristas, a criação de consequências eleitorais para a reprovação das contas de gestor público aumentou a relevância jurídica e social dos julgamentos acerca do correto manejo de recursos públicos nos municípios, nos estados e na União.
Cresceu, portanto, o poder dos Tribunais de Contas e dos parlamentos, principalmente em níveis estadual e municipal, pois suas decisões sobre as prestações de contas podem, agora, interferir, de forma mais direta, no futuro político de pretensos candidatos e, até mesmo, alterar o rumo de eleições. No julgamento de contas públicas no plano municipal – e aqui entra em cena o caso das contas do prefeito “Ney da Saúde” – aos Tribunais de Contas incumbe fornecer um parecer prévio, aprovando, com ou sem ressalvas, ou reprovando as contas prestadas pelos gestores a cada ano. Esse parecer só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal, no caso a Câmara de Tailândia.
Para que se configure a inelegibilidade de gestor público cujas contas forem reprovadas, pelo Tribunal de Contas ou pelo Parlamento, dois requisitos são indispensáveis. Primeiro, que a reprovação decorra por “irregularidade insanável”; segundo, que essa derive de “ato doloso de improbidade administrativa”. Sem qualquer dos dois elementos não se verifica a hipótese criada pela Lei da Ficha Limpa.
A “irregularidade insanável” é um conceito que não possui definição jurídica precisa, objetiva e hermética. Não por falha, mas, sim, porque se pretende, com essa norma, alcançar situações impossíveis de se discriminar detalhadamente numa única lei. Por isso mesmo, esse termo abstrato precisa ser interpretado, atribuindo-lhe sentido diante de cada caso concreto. É esse, inclusive, o papel dos membros do Tribunal de Contas e do parlamento e, posteriormente, do Poder Judiciário, o de interprete autêntico da norma.
Perigo – Isso não quer dizer que tais intérpretes possam considerar “irregularidade insanável” qualquer falha ou erro irrelevante, que não violem os princípios da moralidade ou da probidade administrativa. Naturalmente, também não pode ser julgado como “irregularidade insanável” um vício que foi retificado pelo gestor público, com a consequente reparação dos efeitos do ato. Ou seja, a abstração do termo não confere uma carta branca ao julgador das contas, que precisa usar as técnicas e princípios próprios da hermenêutica, inclusive a ponderação e a razoabilidade.
Já em relação à improbidade administrativa, há Lei Federal que disciplina a matéria de forma mais detalhada, enumerando um rol de condutas que a configuram. Trata-se da Lei Federal n.º 8.429, de 2 de junho de 1992, a qual conceitua como atos de improbidade os que importam em enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao Erário, ou atentem contra os princípios da administração pública. Para fins de inelegibilidade, a reprovação das contas deve ser motivada por ato doloso praticado pelo gestor público, que se enquadre em uma das condutas especificadas na referida lei.
O principal problema nas contas do prefeito de Tailândia é que elas foram reprovadas porque ele fez gastos com pessoal acima do permitido por lei e transferiu recursos oriundos da arrecadação de impostos para o setor de saúde abaixo do que prevê a legislação. Foram irregularidades insanáveis que a defesa do prefeito não conseguiu superar ao apresentar seus argumentos ao Ministério Público de Contas dos Municípios. Por isso o parecer do MP de Contas foi pela desaprovação e pagamento de multas.
O relator do processo, conselheiro Antonio José Guimarães, seguiu o parecer do MP e votou pela rejeição das contas, no que foi seguido pelos outros conselheiros. As contas rejeitadas foram encaminhadas para o Ministério Público Estadual (MPPA), onde o prefeito é investigado por supostos crimes de improbidade administrativa.
Isso, somado à rejeição das contas, sem dúvida, torna periclitante a situação do prefeito.
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