De todos os momentos de um processo judicial, a fase de execução sempre foi o maior gargalo. Nela reside – há muitos anos – a distância entre o direito reconhecido pela Justiça e sua implementação efetiva no mundo dos fatos.
Ao longo do tempo, muitas ferramentas foram implementadas e desenvolvidas, como bacenjud, atual sisbajud, infojud, Renajud, COAF, Serasajud, Infoseg, Simba, e muitas outras siglas.
A Justiça do Trabalho, como regra, foi a pioneira na implementação e sobretudo execução eficiente dessas pesquisas, de modo essas ferramentas geraram efeito concreto na agilização dos processos de execução. Na Justiça Comum, como regra, a utilização de tais recursos ainda é modesta e ineficiente, mas este cenário também está mudando.
Está em execução o Programa Justiça 4.0, o qual busca impulsionar a transformação digital do Poder Judiciário, mediante a intensificação do uso dessas novas tecnologias. O nosso Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por exemplo, bravamente já digitalizou 98,80% de todo o acervo processual, o que significa praticamente 600.000 (seiscentas mil) ações judiciais tramitando virtualmente.
Segundo o relatório do Justiça em números 2021 o tempo médio de tramitação dos processos pendentes na fase de execução 1º grau é de 7anos e 1mês. Apenas execução, sem contar os períodos de tramitação na fase de conhecimento. E o nosso TJE ficou em penúltimo lugar dentre os Tribunais de porte médio.
É evidente o prejuízo dessa demora para a atividade empresarial, impossibilitada de cobrar (e receber) seus créditos, de exigir o cumprimento de obrigações contratuais, dentre várias outras questões relevantes e que podem fazer a diferença entre a saúde financeira e a bancarrota.
O grande avanço pretendido pelo Justiça 4.0 é – mediante a otimização das ferramentas tecnológicas e o melhor aproveitamento dos recursos humanos disponíveis – entregar uma prestação judicial mais rápida e efetiva. Isso é fundamental, sobretudo para a Justiça Comum Estadual, na qual são processadas e julgadas as demandas de conteúdo empresarial.
Nesse cenário, a mais recente ferramenta à disposição do Judiciário é o SNIPER, nome que por si só assusta. É a sigla para Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos.
O SNIPER cruza referências de diversos bancos de dados, destacando até vínculos sigilosos entre pessoas físicas e jurídicas na busca de ativos. Ele consolida, em uma apresentação visual e gráfica, todas as conexões Societárias, Patrimoniais e Financeiras entre determinadas pessoas físicas e jurídicas.
O objetivo do SNIPER é ampliar a efetividade das ações de execução, cobrança e equivalentes, nas quais muitas vezes a empresa vê-se frustrada por não conseguir receber seu crédito, no famoso jargão “Ganhou, mas não levou.”
Por outro lado, essas novas ferramentas impõem às empresas a necessidade de adotar critérios rígidos de gestão empresarial, precedidas de diligências jurídicas capazes de demonstrar sua atuação cautelosa e arrimada na boa-fé.Atos como a mera escolha e atuação como procurador, administrador ou equivalente devem ser realizados de forma abalizada, a fim de evitar a compreensão equivocada, por exemplo, da existência de grupo econômico onde haja apenas relação comercial.
Há casos em que a busca patrimonial atingiu e tornou indisponível, por exemplo, patrimônio de pessoas que atuavam como gerentes da empresa, mediante outorga de amplos mandatos, mas que na prática eram empregados sob regime celetista e que não exerciam metade daqueles atos constantes de uma “procuração padrão”.
Muitas vezes vi empresas outorgarem, por exemplo, procuração sobre direitos de cotas sociais sem que houvesse sociedade, mas apenas para garantia de uma operação financeira. Mas o cruzamento dessas informações, em um sistema como o Sniper, poderá ser interpretado como uma relação societária, formação de grupo econômico, enfim, atrair responsabilidade ao outorgante ou outorgado sem que essa fosse a intenção e o objeto daquele negócio.
A atividade empresarial demandará cada vez mais cautela e previdência jurídica, desde a outorga de procuração a um determinado representante localizado em distante cidade, passando pela escolha de um sócio investidor para um negócio específico em que a empresa não possua disponibilidade financeira.
Cada vez mais é necessária a correta formatação jurídica dos mais diversos negócios inerentes ao dia a dia empresarial, para que sejam corretamente estruturados e, sobretudo, corretamente interpretados pela Justiça.Em especial para que, assim agindo, as empresas possam usufruir dos benefícios e vantagens dessas ferramentas tecnológicas à disposição da Justiça.